26 de junho de 2011

Nas escolas, falta preparo para discutir drogas


26 de junho de 2011
Educação no Brasil | O Globo | O País | BR




ALVOS PRECOCES
Programa de prevenção do governo federal treina apenas 2% de professores da rede pública de todo o país

Demétrio Weber demetrio@bsb.oglobo.com.br

BRASÍLIA. Preocupação nas escolas, o consumo de drogas por estudantes é um desafio para educadores em todo o país. Especialistas recomendam abertura para o diálogo em vez de punição ou posturas moralistas. Mas admitem que é difícil lidar com o problema e que as redes de ensino não estão preparadas para isso.
O programa de prevenção dos ministérios da Educação e da Saúde, em parceria com a Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) e a Universidade de Brasília (UnB), está presente em apenas 1.255 municípios - 22% do total. Uma das principais ações é oferecer formação específica a professores de escolas públicas.
A preparação é feita por meio de cursos a distância, com duração de 120 horas. A estratégia, porém, só atingiu 30,7 mil docentes, o que corresponde a 2% do total de profissionais de ensino fundamental e médio na rede pública do país.
Especialista diz que saída é o diálogo
A coordenadora do Programa Saúde na Escola por parte do MEC, Marta Klumb, diz que o diálogo é a chave para abordar o tema. E que os professores devem criar um vínculo de confiança com os jovens. Marta é contra a suspensão de estudantes flagrados usando drogas:
- O aluno que faz uso de drogas não deve ser expulso da escola; deve ser acolhido.
A coordenadora enfatiza a importância de que os profissionais da educação sejam preparados para enfrentar o assunto sem tabus. Para isso, segundo ela, é necessária uma boa dose de conhecimentos científicos: desde o prazer que as drogas proporcionam até as consequências danosas à saúde e ao projeto de vida de cada jovem.
- Nossa orientação é para que o tema conste no currículo e no projeto político-pedagógico das escolas. Não queremos que seja abordado só na aula de biologia ou de educação física. O porteiro, a merendeira têm que saber discutir e dialogar.
Em Brasília, a professora da UnB Margô Karnikowski coordenou uma pesquisa em escola pública com o objetivo de descobrir como educadores e profissionais da saúde devem enfrentar a questão das drogas nos colégios. Ela ficou surpresa com o alto grau de informação dos alunos acerca dos efeitos das substâncias e mesmo de questões legais, como a quantidade de maconha ou cocaína que diferencia porte para consumo próprio e tráfico.
- É pouco efetivo querer ensinar coisas que eles sabem melhor do que a gente. O que se tem que fazer é discutir alternativas. Mas não é um problema de solução fácil, do tipo faz isso ou aquilo. Precisamos manter as crianças na escola a partir do esporte, da realização de cursos técnicos. Dar oportunidades, criar nichos saudáveis de lazer, onde todos possam se divertir - diz Margô.
Ela acha, no entanto, que a atuação dos professores tem limites e que o problema das drogas envolve outras esferas do poder público - além, é claro, das famílias e da própria comunidade. A atuação de traficantes nas imediações das escolas é caso de polícia. Margô cita também a ausência de pais e familiares no cotidiano dos filhos. O que acaba levando para as escolas questões que poderiam ser discutidas dentro de casa.
No Rio, a Polícia Militar implantou o Programa Educacional de Resistência às Drogas (Proerd) em todo o estado. Policiais vão às escolas prevenir o consumo de drogas e a violência contra crianças e adolescentes.
Marta Klumb diz que o programa de prevenção do governo federal mais do que dobrará sua cobertura este ano, atingindo 2.755 cidades, embora não haja garantia de que todas as escolas dessas cidades venham a ser beneficiadas. O alvo são municípios com baixo e médio Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).
Valério José Arantes, professor de Psicologia do Desenvolvimento da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), conta que a instituição oferece apoio psicológico a seus estudantes. Para ele, a medida faz muita falta na rede de educação básica:
- Na maior parte das escolas, não há nem orientador educacional.
Para Valério, as escolas deveriam criar espaços onde os jovens pudessem conversar com especialistas sobre seus anseios e inseguranças. Com formação em psicodrama, ele diz que melhor ainda seria desenvolver esse tipo de atividade: uma forma de levar os alunos a encenar, com técnicas de teatro, questões como overdoses e sequelas deixadas pelas drogas.
- É preciso lidar com a situação sem criminalizá-la. Um adolescente que está vendendo droga é caso de polícia. Já a criminalização de um jovem que usa só para fazer parte do grupo é bastante perigosa. E pode marcá-lo para o resto da vida. Esse jovem tem que ser orientado e, em casos mais graves, ser levado a uma clínica.
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"Não queremos que o tema seja abordado só na aula de biologia ou de educação física. O porteiro, a merendeira têm que saber dialogar"
Marta Klumb, coordenadora do Programa Saúde na Escola

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