28 de novembro de 2011 Educação e Ciências | O Estado de S. Paulo | Economia | BR Inovação nem sempre é bom. Há inovações ruins, como a recente "tomada elétrica brasileira" de três pinos, uma "jabuticaba" que só existe no Brasil, é muito mais cara que as outras, não é compatível com nada, não tem vantagem técnica nenhuma e foi boa apenas para o lobby dos fabricantes locais de tomadas (e adaptadores!). Em termos de setores industriais, podemos identificar quatro cenários possíveis num país: Cenário1: o produto é simplesmente importado e vendido no mercado local; Cenário 2: o produto é fabricado e vendido no país, com projeto e tecnologia vindos de fora, eventualmente com pequenas adaptações às condições locais. Ocorre a geração de empregos, porém de baixa qualificação e baixa remuneração. Neste cenário não ocorre desenvolvimento tecnológico nem inovação - podem vir "novidades" de fora, mas isso não é inovação. Esse é o cenário industrial típico no Brasil; Cenário3: a concepção e o projeto do produto são desenvolvidos no país, com tecnologias vindas de fora. Exige pessoal mais qualificado e tem melhor remuneração. A rigor, também ainda não ocorre inovação, pois são realizados projetos de engenharia normais de produtos, empregando tecnologias comuns já existentes; Cenário4: há pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias, que serão utilizadas nos futuros projetos de produtos. Aqui, sim, ocorre a inovação, criando tecnologias e produtos que não existiam antes. Há criação de empregos de alta qualificação e remuneração, nos níveis de mestrado e doutorado. Há alguns poucos exemplos no Brasil de empresas que atuam no cenário 4. É o caso da Embraer, da Petrobrás, da Embrapa e,mais recentemente,da Vale do Rio Doce. Elas se destacam pela inovação e são fortes competidoras mundiais em suas respectivas áreas de atuação. Desenvolvem pesquisa científica e tecnológica aqui, interagindo fortemente com universidades e centros de pesquisa brasileiros, por meio de convênios e contratos de dezenas e até centenas de milhões de dólares. Note-se que todas elas são empresas brasileiras. Um exemplo diferente é dado pelo setor automotivo no Brasil, que está claramente no cenário 2. É um dos mais importantes setores industriais brasileiros, com 26 montadoras e cerca de 500 fornecedores de autopeças. Contribui com 22,5% do Produto Interno Bruto (PIB) industrial e 5,2% do PIB total do País. E emprega 1,5 milhão de pessoas. Apesar disso tudo, com raras exceções, os projetos dos carros vêm de fora e são apenas adaptados e fabricados aqui. Praticamente não há atividade de pesquisa e desenvolvimento locais, muito menos inovação. Cabe observar que, entre os dez países maiores produtores de veículos no mundo, o Brasil ocupa o 6.º lugar e é o único que não tem uma montadora nacional própria. Entre os fornecedores de autopeças, todos os maiores também são empresas estrangeiras. O setor automotivo não é exceção. O Brasil, com a "política de substituição de importações" adotada por sucessivos governos desde a década de 1950,está parado no cenário 2 na grande maioria dos seus setores produtivos. Fechar o mercado e taxar importações como pretexto de" proteger a indústria brasileira" (curiosamente incluindo nisso as multinacionais instaladas aqui) só leva à estagnação do desenvolvimento local. Não há ambiente nem razão para fazer inovação aqui - as multinacionais o fazem no seu país de origem, e as empresas nacionais locais apenas trazem as "novidades" de fora. Já países como o Japão, a Coreia e, agora, a China (ver The New York Times em http://nyti.ms/dL2zp3), em vez de meramente substituir importações, adotaram uma política de produção industrial voltada para a exportação, o que expôs suas indústrias à competição internacional eforçouseudesenvolvimentode forma fantástica. Alguns fatos que devem ser considerados: - inovar é caro e arriscado, e a empresas o mente vai investirem inovação se precisar disso para sobreviver; - a inovação só ocorre num ambiente de livre competição global. Na antiga União Soviética, por exemplo, os mesmos modelos de automóveis foram produzidos por mais de 30 anos sem inovação alguma; - apesar de cara e arriscada, a inovação é estratégica para a empresa, e normalmente esta vai fazer isso no seu país de origem; - a necessidade de inovação é que gera a demanda por mestres e doutores. Não adianta inverter isso e investir na formação de mestres e doutores - se a demanda não existir previamente, vai haver apenas formação de desempregados; - e o cenário 4 corresponde a uma situação de autossuficiência tecnológica, independência e liderança no respectivo setor produtivo global. É nesse cenário que ocorre a inovação. Assim, se desejarmos chegar ao cenário 4 e desfrutar da respectiva "inovação",não há outro jeito, precisamos ter empresas nacionais (privadas), apoiadas e incentivadas, suficientemente preparadas para competir com (e ganhar das) empresas estrangeiras na arena global. Ou pelo menos termos multinacionais que instalem a quinhentos de pesquisa e tecnologia e façam parcerias de valores substanciais com universidades e centros de pesquisa locais. Se não for assim, melhor deixar a inovação para lá e nos contentarmos com as "novidades". * ENGENHEIRO NAVAL, DOUTOR EM ENGENHARIA, É PROFESSOR TITULAR DA ESCOLA POLITÉCNICA DA USP |
28 de novembro de 2011
Inovação ou Novidade , RONALDO DE BREYNE SALVAGNI
Postado por
jorge werthein
às
07:33
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