6 de junho de 2015

Na sala de aula, mas sem aprender

Por EDUARDO PORTER

Há 25 anos, quase a metade das crianças em idade escolar primária na África subsaariana estava matriculada em escolas. Em 2012, eram 78%. No sul da Ásia, as matrículas na escola primária saltaram de 75% para 94% no mesmo período.
Políticos de todo o mundo entenderam a importância do aprendizado para o desenvolvimento humano.
A educação primária universal foi um dos principais Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, que mobilizaram uma grande quantia em ajuda financeira na primeira década do século para os países pobres expandirem o acesso à educação.
Apesar desse avanço, um rápido olhar além das estatísticas principais sugere que a maior parte do mundo pouco avançou.
"Fizemos um progresso substancial em todo o mundo ao enviar pessoas para a escola", disse Eric Hanushek, especialista em economia da educação na Universidade Stanford, na Califórnia. "Mas um grande número de pessoas que foi à escola não aprendeu nada."
O mundo pode fazer melhor?
Especialistas e diplomatas vêm trabalhando há dois anos para criar um conjunto de metas de desenvolvimento sustentável que garantam o sucesso das metas do milênio anteriores, ao conduzir a estratégia de desenvolvimento e orientar a ajuda internacional nos próximos 15 anos. As metas deverão ser adotadas pela ONU em setembro.
Uma população educada é uma precondição crítica para a prosperidade amplamente compartilhada -um instrumento essencial para os países que buscam ter um papel nas cadeias de produção globais que conduzem o crescimento econômico em todo o mundo. Mas simplesmente buscar a "educação universal" não nos levará até lá.
Um relatório publicado recentemente pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (OCDE), que dirige os testes padronizados Pisa, feitos a intervalos de alguns anos por uma amostra de jovens de 15 anos em cerca de 75 países, oferece uma visão perturbadora da situação do aprendizado no mundo.
Mesmo entre países relativamente ricos, muitos estudantes deixam de dominar as técnicas mais básicas.
Um exemplo é o México, uma economia de renda média cuja educação primária é quase universal e onde 70% dos jovens estão matriculados na escola secundária. No teste Pisa de 2012, 54% dos estudantes mexicanos deixaram de atingir o nível de aptidão mais básico, que a OCDE considera "necessário para participar produtivamente de economias modernas".
Alcançar o nível um do Pisa exige apenas uma espécie de literalidade funcional. Entre os jovens de 15 anos, 89% dos ganenses deixaram de atingir esse nível, assim como 74% dos indonésios, 64% dos brasileiros e 24% dos americanos.
Não causa surpresa que o mundo tenha definido metas sobre a quantidade da educação, mas vacilado na qualidade.
"A educação universal é uma agenda sem oposição. Ela oferece serviços grátis e aumenta o emprego público", disse Justin Sandefur, do Centro para o Desenvolvimento Global. "A qualidade é politicamente um pouco mais polêmica."
As políticas destinadas a promover as matrículas, como subsídios ou transferências de dinheiro incondicionais oferecidas aos pais que mandam seus filhos à escola, como no México ou no Brasil, acrescentaram estudantes ao sistema sem melhorar sua capacidade.
"Os sistemas ficaram superlotados com o influxo de crianças", disse Chandrika Bahadur, diretor de iniciativas educacionais na Rede de Soluções de Desenvolvimento Sustentável da ONU, "e muito rapidamente tornou-se um problema garantir que elas estavam aprendendo bem."
Não estavam. Ainda há pouca informação sobre como as crianças estão se saindo na escola em muitos países. Porém, uma iniciativa recente do Banco Mundial para medir a qualidade dos sistemas educacionais em alguns países africanos pintou um quadro desanimador.
Em Uganda, apenas um em cada cinco professores da escola elementar cumpre o padrão mínimo de proficiência em matemática, língua e pedagogia. Em visitas de surpresa a escolas públicas, os pesquisadores descobriram que 27% dos professores estavam ausentes. Dos presentes, 56% não estavam na sala durante as horas de aula.
O relatório da OCDE propõe oferecer educação secundária universal até 2030 para garantir que todos os estudantes alcancem o nível básico de técnicas conforme medido pelo Pisa. Os ganhos econômicos mais que compensariam o esforço, afirma o documento.
Os objetivos discutidos não enfocam a qualidade. O esboço do documento da ONU promete difusamente educação secundária universal "equitativa e eficaz", com resultados de aprendizado "relevantes e eficazes". Porém, não define os termos.
Alcançar a qualidade será difícil. Mas sem uma melhora não apenas nos insumos da educação (como o número de professores e o tempo dedicado à instrução), mas também em desempenho dos estudantes, grande parte do esforço pode ser desperdiçado.
"Equidade ao preço de resultados gerais pobres não vai servir para ninguém", disse Andreas Schleicher, chefe do Pisa na OCDE

Yhe New York Times, 6/5/2015

Nenhum comentário:

Postar um comentário