5 de abril de 2010


Apartheid social na internet

Adauto Cruz/CB/D.A Press

Matheus diniz, 15 anos, não tem computador em casa. o estudante gasta uma Grana alta para pesquisar e imprimir seus deveres de casa
Rafael Ohana/CB/D.A Press

Na TurboNet, de ceilândia, muitos jovens se encontram pra conversar ou jogar fliperama
Quem não tem computador em casa pode acessar a internet em lan houses e telecentros. Mas será que isso é o que todo mundo chama de inclusão digital?

E-mail, bate-papo online, Orkut, Facebook, Twitter, Wikipedia, jogos online As ferramentas da internet há muito tempo deixaram de ser coisa de nerd ou de gente que mexe com computador para fazer parte do dia a dia de um número cada vez maior de brasileiros. Se antes a grande distração do jovem era a televisão, agora as quatro horas diárias antigamente dedicadas à TV estão sendo transferidas para outra telinha a do computador. Ainda assim, dados do IBGE de 2008 informam que 56 milhões de brasileiros acima de 10 anos de idade são usuários da internet (34% da população) e estima-se que apenas a metade desse contingente acessa a rede via banda larga. Muitos se conectam em lan houses ou telecentros. Saiba como essa galera se vira sem computador em casa.

Inclusão digital?

O professor de informática na educação e arte digital da Universidade de Brasília Lúcio Teles explica essa mudança da TV para o computador com a redução da pobreza no país. Cerca de 20 milhões de brasileiros subiram para a classe C, em seis anos. Isso significa mais poder aquisitivo, mais gente capaz de comprar computadores. Ainda mais com os planos de financiamento, os pacotes.

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Acesso 54 milhões de usuários de Internet (34% da população brasileira).

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50% dos usuários que acessam a rede o fazem por meio da banda larga 60% da população brasileira nunca usaram a internet 6º maior usuário de Internet é o Brasil, à frente de países como Reino Unido, França e Itália

Conectado ao mundo por três reais

Mesmo com os computadores com um precinho mais camarada, muita gente ainda não tem grana para ter uma máquina em casa, e tem que se virar nas lan houses e telecentros. É o caso de Matheus Diniz, 15 anos. O garoto mora e estuda no Guará e às vezes faz um ou outro trabalho na biblioteca, mas normalmente precisa usar a lan house para pesquisar coisas online ou imprimir o material. Ele frequenta a Connect.com, na QE 26.

Os amigos de Matheus reclamam do preço alto. Têm que pagar R$ 3 para usar o computador por uma hora e R$ 1 para cada impressão. O proprietário da loja, Gustavo Moreira, de 28 anos, garante que sempre faz fiado quando os meninos precisam e justifica o preço. Aqui o cliente tem um tratamento diferenciado. Tenho uma preocupação muito grande com a segurança deles. Cadastramos todos os usuários, para saber exatamente quem usa qual computador e quando. Já tivemos caso de estelionato, em que ajudamos na solução do crime, por exemplo.

Em outras cidades do Distrito Federal, onde a renda das famílias é menor, os preços costumam ser mais baixos. Na lan house da Quadra 206 de Santa Maria, por exemplo, os usuários pagam R$ 1 para usar o computador por uma hora.

Conectividade ao vivo também

Como uma das escolhas mais populares entre as raras opções de lazer da cidade, as lan houses também acabam virando ponto de encontro da galera. Todo dia passo aqui, mas não é sempre que acesso a internet. Às vezes, fico só conversando com o pessoal, conta Matheus Diniz. À tarde, a lan house da Quadra 206 está sempre lotada de adolescentes. A maioria fica só na entrada com os amigos, curtindo as fases de algum game irado ou batendo papo. Muitas vezes, a lan house também é uma opção mais legal para quem tem que esperar os pais ou não quer ficar com a mãe na fila do banco, por exemplo. Alguns pais chegam a deixar seus filhos na lan enquanto pagam uma conta ou vão ao supermercado, conta Gustavo Moreira, proprietário da Connect.com.

Quer pagar quanto?

Às vezes, a lan house vale mais a pena mesmo para quem tem computador em casa. É o caso do estudante do 2º ano do ensino médio Wanderson de Souza, 18 anos. Todo dia ele fica cerca de três horas online, conversando com amigos do grupo do MSN. Wanderson passa tanto tempo na lan house que descolou um computador praticamente exclusivo, onde já até salvou uma pasta para armazenar seus documentos. Às vezes, manda por e-mail os arquivos e pede para algum amigo guardar. Wanderson já tem um computador em casa e até pensou em colocar internet, com os cerca de R$ 60 que gasta na lan todo mês. Mas sairia caro e na minha casa também não chega o sinal , lamenta.

Para alguns, o acesso à internet sai ainda mais caro. O estudante da 7ª série, Jadiel Neves, 13 anos, não tem computador em casa. Mas venho aqui só para jogar mesmo, acho melhor fazer trabalho na casa de um colega meu, é mais tranquilo , explica o garoto durante uma partida de fliperama na loja BlackOut da QNN 18 de Ceilândia.

Jogos do bem

Apesar de muitos criticarem os jogos online e temerem a invasão de privacidade dos sites de relacionamento, o professor Lúcio Teles defende que essas ferramentas podem ajudar o pessoal a se sentir mais à vontade com o computador e a internet. Jogos também podem contribuir para a inclusão. Existem jogos educativos e mesmo os tradicionais podem ser vistos como uma forma de inclusão, de familiarizar o jovem com o computador. A internet já é culturalmente tão visível quanto a TV. A tendência é que ela também se torne tão comum quanto. Para superar a barreira financeira do acesso à internet, Teles defende convênios entre secretarias de Educação e pontos de acesso. Além de promover a inclusão digital, isso poderia incentivar os donos de lan houses, que costumam ser pequenos empresários , argumenta.

Correio Brasiliense

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