O criador e as criaturas: \"Apenas 8% da carteira de um investidor americano vai para países emergentes. Até 2020, o percentual será de 40%\\\\\\\", diz Agtmael
O holandês Antoine van Agtmael, criador da expressão "mercados emergentes", continua a acreditar no potencial do Brasil. Mas se diz preocupado com o câmbio e com "uma sutil" intervenção do governo em algumas áreas
Felipe Carneiro
QUANDO TRABALHAVA PARA o IFC, BRAÇO FINANCEIRO DO BANCO MUNDIAL, NOS ANOS 80, o holandês Antoine van Agtmael achava que a expressão Terceiro Mundo tinha uma carga pejorativa. Para evitá-la, criou o conceito de "mercados emergentes"ao lançar um fundo de investimento voltado para países considerados de alto potencial de crescimento fora do mundo rico. Um dos visionários que enxergaram a ascensão de economias dinâmicas, como China, Índia e Brasil, hoje Agtmael está à frente da gestora de recursos Emerging Markets Management, com mais de 10 bilhões de dólares sob gestão. A seguir, os principais trechos de sua entrevista a EXAME.
Ainda vale a pena investir em ações de empresas brasileiras?
O Brasil ainda é um dos quatro maiores países em nosso portfólio, mas colocamos o pé no freio. O câmbio está valorizado, talvez demais, e o país não é uma ilha. A economia está indo muito bem, mas é preciso levar em conta que ela será afetada pela desaceleração de China e Europa. Além disso, receio um sutil crescimento na intervenção do governo em algumas áreas.
Em quais áreas? Após as eleições?
Principalmente na Petrobras, que é estatal, e na Vale, que, mesmo privatizada, sofre pressões do governo para comprar empresas e fazer investimentos. Os dois principais candidatos à Presidência, Dilma Rousseff e José Serra, têm um bom projeto para o país. Mas Dilma é mais intervencionista, e isso é um risco. O governo do qual ela faz parte tem feito investimentos e gastos que fazem mais sentido político do que econômico.
Quais são as ações mais atraentes da bolsa brasileira?
Não vou citar empresas, mas setores. O bancário é muito bom, assim como o de companhias de consumo, voltadas para o mercado interno. São dois segmentos que se beneficiam do crescimento da economia. Mas o que mais tem chamado a minha atenção hoje são as empresas com papéis pouco negociados e de baixo valor de mercado, conhecidas como small e mid caps. Cerca de 80% de todos os investimentos estrangeiros nos mercados emergentes ficam em. no máximo. 200 ações. Isso num universo de 29000 ações. Para mim. é ai que está a mina de ouro, especialmente nas áreas de energia. saúde, educação, software, imóveis e nas companhias de telefonia que operam com smartphones. O problema desses papéis é o fato de eles serem pouco negociados. Você não consegue vender grandes quantidades de uma hora para a outra, então não deve colocar todo o seu dinheiro neles.
A crise mundial atraiu mais investidores de países ricos para os mercados emergentes?
O investidor americano tipico tem entre 3% e 8% de suas ações nos mercados emergentes. Já foi menos, mas ainda é pouco. Os mercados emergentes representam 32% da economia mundial e 28% do total das ações do mundo. Quem investe apenas 8% está descolado da realidade. Esse percentual será de, no mínimo, 40% até o fim da década, pois os emergentes crescem mais rápido. É uma estupidez ignorar as bolsas desses países.
O mundo - principalmente os emergentes - está muito dependente da China. Isso é um problema? Não. Em vez de termos uma superpotência mundial, agora teremos de nos acostumar a várias superpotências. E a primeira a dar as caras é a China. Dez anos atrás, os mercados emergentes - levados em conta como um grupo eram pequenos na economia global. Agora são grandes. Em 20 anos, representarão mais da metade do PIB do planeta. Os mercados emergentes estão crescendo mais rápido que os desenvolvidos, e prefiro um mundo assim ao que existia antes da crise, quando todos dependiam de um pequeno clube de países ricos, com os Estados Unidos à frente.
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