20 de janeiro de 2011

Insensata educação





Para matar as saudades, recorri ao Dicionário da Língua Portuguesa, do filólogo Antenor Nascentes, para obter o registro preciso do adjetivo insensato. É tudo que é contrário à razão ou ao bom senso. A novela "Insensato coração", de Gilberto Braga e Ricardo Linhares, começa a fazer sucesso e, por uma inexplicável associação de ideias, ocorreu-me aplicar o título à precária situação da educação brasileira.
Tem muita coisa que se custa a entender, apesar dos reiterados diagnósticos que são feitos no setor. Assim como se discute o valor do salário mínimo, há diversas versões para o percentual do PIB a ser destinado à educação, com uma certeza absoluta: os atuais 5,2% são rigorosamente insuficientes. Na campanha presidencial, falou-se em 7% e agora, de forma aparentemente irresponsável, existem os que defendem 10%, sem esclarecer de onde sairiam os recursos.
É certo que quanto mais, melhor, mas não é aí que reside o nó da questão. Convém lembrar o sábio pensamento do embaixador Roberto Campos: "Não se gasta absurdamente pouco em educação, mas absurdamente mal." Isso dito há mais de dez anos parecia uma provocação, mas ainda está bem perto da realidade.
Outra insensatez é a incompetência para enfrentar o drama do magistério. Os professores são malformados e pessimamente remunerados. Como pretender, assim, uma educação de qualidade? Os cursos de formação de professores padecem de um abissal anacronismo. Colocar um computador na mão de quem não sabe manejá-lo significa muito pouco. Pensando bem: desde que essas máquinas terríveis entraram no cotidiano das escolas, qual foi o aperfeiçoamento dos conteúdos? O resultado pode ser encontrado nos mapas de classificação do exame internacional chamado Pisa.
Ultimamente, são raras as novas escolas construídas. Parece que houve um certo cansaço das autoridades em relação ao assunto. É possível lembrar que, no Estado do Rio de Janeiro, no período de 1979 a 1983, foram inauguradas 88 escolas. Era o melhor caminho para alcançar outra conquista necessária: o desejado tempo integral, que é uma característica básica de todo e qualquer país desenvolvido. Quando se sabe que, entre nós, no ensino médio, cheio de furos, as aulas diárias não passam de quatro horas, já se vê o tamanho do fosso. E tem mais um óbice: cursos médios oficiais estão sendo ministrados em escolas municipais, por empréstimo, o que dá bem a dimensão da sua ausência de prioridade.
Nossas escolas públicas têm bibliotecas? Não. Têm laboratórios equipados? Não. A distorção idade-série está sob controle? Não. Reduzimos os fenômenos da evasão e da repetência? Não. Há iniciação científica nas escolas? Não. Os índices de leitura estão crescendo? Não. Os livros didáticos distribuídos gratuitamente são bem escolhidos e bem distribuídos? Não... E muito mais poderia ser lembrado. No fundo, o que se sabe mesmo é que a educação não tem sido prestigiada por uma consistente vontade política.
ARNALDO NISKIER é membro da Academia Brasileira de Letras.

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