21 de março de 2012

Progresso e meio ambiente, Pedro Ferreira e Renato Fragelli




 
Pedro Cavalcanti Ferreira e Renato Fragelli Cardoso são professores da pós-graduação da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas (EPGE-FGV). Artigo publicado no Valor Econômico de hoje (21).

Até meados do século XVIII, o padrão de vida da humanidade passou por uma longa estagnação, sendo a ideia de crescimento econômico algo estranho às sociedades da época. Com o advento da Revolução Industrial, começou-se a observar crescimento contínuo e sustentável da produtividade e da renda em vários países. Esse processo foi sempre desigual, mas vive-se muito melhor hoje que no passado.

No último meio século, em particular, analisando-se um grupo de 112 países de que se possuem dados minimamente confiáveis, somente dez não cresceram entre 1960 e 2009, e isto porque estiveram envolvidos em guerras ou revoluções. Em 70 deles a renda per capita mais que dobrou, sendo que em metade ela mais que triplicou.

De forma contínua, parcelas significativas da humanidade vêm sendo resgatadas da pobreza. Os indicadores sociais constatam elevação da expectativa de vida, menor mortalidade infantil, maior escolaridade e melhores condições materiais em geral. Dado o crescimento acelerado de países até pouco tempo miseráveis, como China e Índia, não é difícil imaginar que o progresso, conforto e condições sociais favoráveis alcançarão, em pouco tempo, a maioria da população do planeta.

Mas a incorporação dessas populações a um padrão de consumo e conforto de que estavam alijadas não se dá sem custos ambientais. Essa triste constatação tem levado ambientalistas mais alarmados - sem entendimento dos instrumentos econômicos disponíveis para disciplinar o problema, como uma combinação de tributação e subsídios -, e até alguns economistas recém-convertidos à causa - que parecem ter esquecido como funcionam aqueles instrumentos -, a defenderem a tese de que o planeta teria chegado ao seu limite físico, o que implicaria na necessidade de deter o progresso. "Mantido o ritmo de crescimento atual, quando toda humanidade alcançar um padrão de consumo próximo ao dos ricos países ocidentais, o planeta entrará em colapso", vaticinam histericamente.

Em um vídeo que circula pela internet (www.youtube.com/watch?v=BZoKfap4g4w), o economista Hans Rosling defende apaixonadamente o uso das máquinas de lavar - e máquinas de uso doméstico em geral - que poupam trabalho de mulheres, liberando-as de tarefas, permitindo-lhes se dedicar mais a si mesmas e aos filhos, ou ainda que se insiram no mercado de trabalho. Aquelas máquinas melhoram o bem-estar, a educação, e a produtividade das economias. Tentar bloquear o progresso e impedir o acesso dos pobres a esses bens materiais seria moralmente injustificável - "vão fechar a porta agora que estou quase entrando na festa?" - e fútil, pois a maioria que começa a ter acesso ao progresso não vai votar pelo atraso.

Dentro de 40 anos, o consumo de energia do planeta deve dobrar, pois um bilhão de pessoas se juntarão aos muito ricos que hoje respondem por metade do consumo mundial de energia. Diante da alta probabilidade de mudanças climáticas seríssimas, alguma alternativa à inviável proposta de se frear o crescimento econômico precisa ser encontrada. Caberá aos governos lutar em dois flancos para direcionarem suas economias rumo à preservação ambiental.

O primeiro flanco será estimular, por meio de subsídios e financiamentos, o desenvolvimento e a adoção de tecnologias limpas, pois a atividade de pesquisa é custosa e arriscada. Além disso, será necessário um esforço coordenado para mudar toda uma estrutura de funcionamento das economias baseada em tecnologias poluidoras.

Alguém só usará nova tecnologia não poluidora se muitos também a estiverem usando. Estes dois pontos significam que os governos precisarão não só subsidiar, por exemplo, pesquisas em carros elétricos, mas também incentivar a criação de pontos de abastecimento de energia para esses carros.

O outro flanco será punir quem polui ou usa tecnologias poluidoras. A melhor punição é o velho e bom mecanismo de preço. Há excesso de consumo de bens poluentes simplesmente porque, do ponto de vista da sociedade, o preço desses bens está muito baixo. Os bens poluentes precisarão ser pesadamente tributados, de modo a forçar aqueles que mais poluem a custear os subsídios a serem concedidos àqueles que adotarem práticas não poluidoras.

Não há também como evitar a regulação de algumas práticas e atividades, dada as óbvias falhas e mesmo a inexistência de mercados para disciplinar os poluidores. Muitas dessas medidas são impopulares e de implementação complexa, mas são tecnicamente factíveis. Há também a dificuldade de coordenação internacional, pois os custos da redução de emissões são potencialmente maiores em alguns países que em outros.

Isso tem exigido delicadas negociações internacionais. Entretanto, a alternativa histérica e radical - "o planeta não aguentará, pare o progresso" - é não só socialmente injusta e economicamente ineficiente, como também o caminho mais provável para a inação que levará o planeta na direção que todos querem evitar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário