4 de outubro de 2010

Violencia no Brasil e em Pernambuco











De política, a balconista de padaria Magali Damiana dos Santos, recifense de 45 anos, entende pouco. Quase nada. De sonhos, do esforço diário para dar uma vida digna aos filhos, longe do universo das drogas e da violência urbana, tem muito o que contar - entre um relato e outro interrompido por rasgos de uma timidez. Os problemas da segurança pública que afligem direta ou indiretamente cidadãos pernambucanos e brasileiros bateram à porta dessa trabalhadora há sete anos. Foi quando viu o filho Jeferson, hoje com 23 anos, ferido com três tiros após ele ter feito um assalto. Hoje, ela lamenta ter de tirá-lo do galinheiro do vizinho, moribundo após consumir drogas, e ter de lutar pela liberdade de Jamerson, outro filho, de 21 anos, preso há 10 meses no Aníbal Bruno sob a acusação de transportar 90 pedras de crack.

Os desafios de Magali para os próximos anos serão os mesmos dos candidatos consagrados na eleição deste domingo e que devem governar o estado de Pernambuco e o Brasil nos próximos quatro anos. Todos, autoridade e gente anônima, precisam enfrentar o uso das drogas, que influencia as estatísticas de homicídios, roubos e agressões corporais. A violência envolvendo jovens, a mesma que atingiu a família de Magali e rouba a noite de sono da avó Neide e de tios de Jeferson e Jamerson, destaca-se como principal problema da segurança pública aqui e nos demais estados.

A interiorização da violência, a estrutura precária das polícias e a falta de transparência de informações criminais, assim como de diagnósticos consolidados se somam à questão dos jovens. Mas o fenômeno da juventude é o que mais preocupa especialistas da segurança pública e a sociedade. Os números locais e nacionais dão razão a eles (veja quadros). A relação entre os brasileiros com idade inferior a 30 anos, a droga e a violência tem reconfigurado o perfil de todas as estatísticas.

"Em Pernambuco, se não houver um equacionamento de políticas públicas para a juventude, não vai ter solução definitiva", diz o sociólogo Júlio Jacobo Waiselfisz, diretorde pesquisa do Instituto Sangari (ONG de São Paulo, que publica todos os anos o Mapa da Violência no Brasil). "Vários estados são campeões não só de violência, mas da violência explicada pelos homicídios de sua juventude", considera ele, residente no Recife.

Segundo o Mapa da Violência 2010, Pernambuco está no topo do ranking dos estados mais violentos quando se trata de jovens. A taxa de homicídios por 100 mil habitantes chega a 111 pessoas. A média do Brasil é de 50 por 100 mil. De todos os estados brasileiros, só perde em ocorrências para Alagoas (125/100 mil) nessa faixa etária. No estudo comandado pelo sociólogo, esses números no Brasil são tratados como um "fenômeno" que ainda precisa ser explicado, pelos fatores sociais e culturais.

"Quero desviar esses meninos do caminho errado. Só não sei mais como tentar. Tenho fé que vou conseguir", disse, num dos momentos de confiança, referindo-se ao envolvimento deles com crack e violência. Com frases mais eruditas, os eleitos devem guardar desejos semelhantesquanto a milhares de outros "meninos". Magali, moradora do bairro da Mangabeira (Zona Norte do Recife), tem dois filhos, mas a preocupação não se estanca com eles. Magali tem medo de andar sozinha e se tornar vítima de outros jovens violentos. Também se preocupa ao olhar para o futuro: "Fico pensando nesse daqui (aponta para Riquelme). Que vida ele terá?", questiona-se, falando com os olhos lacrimejando sobre o neto, de 11 meses, filho de Jamerson.

Por certo, Magali e a família do Recife que, segundo a balconista de padaria, nunca antes havia visto envolvimentos com drogas e com tráfico, estão ávidos por caminhos mais sólidos e integrados que deem um basta na violência. Para que ela não volte a bater na porta e não arraste novas gerações, a exemplo do pequeno Riquelme.

Raio X da criminalidade

49 a cada 100 mil pessoas morrem em Pernambuco anualmente. Em 2006, proporção era de 56 por 100 mil

20% dos crimes violentos acontecem na região Agreste

3.668 foi o número de vítimas de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI) no estado nos sete primeiros meses de 2010. Em 2006, foram 4.658 vítimas

1.963 pessoas foram assassinadas nesse período (janeiro a julho de 2010). A maioria tinha entre 18 e 35 anos. Governo informou que houve redução das vítimas nessa faixa, a partir de 2006, mas não apresentou números.

37 equipes de policiais civis atuam nas chamadas áreas integradas de segurança.

22 equipes estão no interior

15 equipes estão na Região Metropolitana. O Recife é atendido pelo Departamento de Homicídios

237 câmeras monitoram os bairros de São José, Santo Antônio, Boa Vista e Boa Viagem.

8.875 mil novos policiais e técnicos entraram para a Polícia Civil, Militar, Científica e no Corpo de Bombeiros nos últimos três anos

500 pessoas acusadas de envolvimento com grupos de extermínio foram presas desde 2006

Fontes: Governo de Pernambuco/ Ministério da Justiça/ Mapa da Violência 2010 - Instituto Sangari/ Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública-2009

Prioridades

Interiorização da segurança

Enfrentar a interiorização da violência no estado e incentivar a participação dos municípios como atores efetivos no combate à violência. A valorização do status municipal seria justificada pela captação de recursos financeiros e a instalação de atrativos de investimento econômico de alguns municípios. As obras têm aumentado a população circulante e, por consequência, induzido o aumento da criminalidade

Foco na juventude

Reverter as altas taxas de violência na juventude. A redução das taxas de violência no estado repercutirá diretamente nas taxas totais de criminalidade. Pernambuco fica no topo do ranking do Mapa da Violência 2010, do Institito Sangari. Os dados do Governo mais recentes, de setembro de 2009, confirmam que na faixa de 18 a 35 anos está concentrado o maior número de vítimas por crimes violentos

Informação

Melhorar o sistema de divulgação de informações sobre violência pública. Houve avanço, em Pernambuco e no Brasil, quanto à compilação e divulgação de alguns dadosimportantes sobre a criminalidade. Mas ainda há muito o que fazer para que possibilitar, inclusive, diagnósticos mais atualizados. Muitos dados são inconsistentes ou antigos, com três ou quatro anos de atraso

Fonte: Mapa da Violência 2010 - Instituto Sangari (SP)/ Sociólogo Júlio Jacobo Waiselfisz, especialista em segurança pública

Diario de Pernambuco

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