16 de outubro de 2010

País precisa investir na educação para crianças até 4 anos



Aloísio Araújo, economista, professor e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV), defende a inclusão, na agenda do próximo governo, de investimento público para sustentar programas de educação infantil para crianças nos primeiros anos de vida

A proposta do professor é da criação de programas de educação precoce pelo governo nas suas mais diversas esferas - federal, estadual e municipal - capazes de propiciar às crianças mais pobres um acompanhamento de qualidade, reduzindo o fosso que separa os estudantes brasileiros ao ingressarem no ensino básico. "Isso vai garantir maior retorno para o crescimento econômico sustentado, com maior distribuição de renda, nos próximos 20 anos", disse Araújo ao Valor.

O tema "Educação e Desenvolvimento Econômico" foi o escolhido por Araújo para palestra que fará na abertura do seminário que comemorará os 80 anos da Faculdade de Economia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), na segunda-feira.

Ele adiantou que ampliar a faixa da educação no Brasil é um desafio, pois a maior parte das crianças brasileiras é de famílias com renda inferior a cinco mínimos, geralmente as que têm maior número de filhos. "Já tivemos uma vitória com a aprovação pelo Congresso, no ano passado, da obrigatoriedade do ensino para crianças dos quatro anos até os 17 anos. Temos agora, de imediato, que garantir um acompanhamento para a faixa de zero a três anos".

Segundo seus cálculos, os gastos para tocar um investimento deste tipo não são muito grandes. Hoje, o país conta com uma população de crianças de zero a quatro anos de 13,4 milhões (10,6 milhões de zero a três anos), segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) 2009. Para atingir pelo menos 20% deste contingente infantil seria necessário aos cofres públicos gastar o equivalente a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), estimado por ele em R$ 4 trilhões para 2011, o que daria cerca de R$ 20 bilhões.

Araújo propõe a criação de creches especializadas, principalmente nos maiores bolsões de pobreza assistidos pelo Bolsa Família para desenvolver o trabalho em convênio com universidades, pois a educação, como destaca, está muito associada à renda. As creches devem ser diferentes de muitas das atuais que existem apenas para "guardar" as crianças para mães que trabalham. "É preciso creche de qualidade, com pouca criança por adulto e que incentive o relacionamento com as mães, pois o lado psicológico, emocional da criança deve ser preservado."

Nesse quesito, Araújo sugere ainda que sejam incentivados programas em associação com o Ministério da Saúde para garantir assistência pré-natal às mães nos bolsões de pobreza e assistência de médicos de família no acompanhamento de crianças até um ano.

Os estudos do professor da FGV foram inspirados nos trabalhos do prêmio Nobel de economia de 2000, James Heckman, um dos primeiros a se debruçar sobre o tema da educação infantil nos primeiros anos da criança.

Heckman implantou o ensino precoce nos Estados Unidos, na época do presidente Lyndon Johnson, nos anos 60, quando foi implantado um programa para combate à pobreza. As crianças que participaram dos programas especiais de pré-escola não só tiveram indicadores de comportamento social melhores, como menores índices de gravidez na adolescência e de encarceramento, além de melhores salários.

Ele citou ainda Cuba, como país cujo programa de educação precoce foi bem sucedido. O investimento em educação infantil em Cuba é o maior da América Latina. A performance de Cuba em testes internacionais é do nível da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Aloísio Araújo atribui a redução da disparidade de renda no Brasil em boa parte a um nível menor de desigualdade educacional dos adolescentes de 18 anos. Se a este avanço for garantido acompanhamento educacional até os quatro anos, o aproveitamento será melhor ainda para o futuro do país.

(Vera Saavedra Durão)

(Valor Econômico, 15/10)

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