Folha de S.Paulo,30/10/2012
Enquanto a vida escolar da criança for questão vital para os pais, ela não assumirá sua responsabilidade
Muitos pais, com filhos de todas as idades, perguntam como fazer a criança ou o adolescente assumir suas responsabilidades. Os exemplos são os mais diferentes e a lição de casa -seja a cotidiana, seja o chamado trabalho- é a grande campeã.
A mãe de uma criança de cinco anos conta que já está desesperada porque a filha não quer saber de fazer sua lição de casa nem com ajuda. Ela já colocou a filha de castigo, já a premiou, já conversou, já fez tudo o que sabia, mas não conseguiu resultados. Vários outros pais contam situações semelhantes.
A grande pergunta de todos eles é: "O que eu posso fazer para resolver isso de vez?". Lição de casa nessa idade?! Creio não haver mesmo solução.
Outros exemplos muito citados são as pequenas tarefas domésticas que os filhos deveriam fazer, mas não fazem. Colocar a roupa suja no local adequado, arrumar a cama, guardar as roupas e os calçados que tiram e espalham pela casa, ajudar a arrumar a mesa para o jantar etc. A criançada não quer saber de trabalho. Muito menos de tarefas.
Uma mãe, muito bem-humorada, disse que ela proibiu o filho de dizer a frase "Já vou, mãe". É que sempre que ela cobrava o filho para que fizesse o combinado ela ouvia a tal frase, agora vetada.
Por fim, a escola e o resultado das avaliações. Todos os pais que me escreveram disseram que os filhos não gostam de estudar, que não se preocupam com as notas baixas, tampouco com o risco de retenção ou de mudança de escola. Nem as ameaças funcionam, contam os pais. Nem mesmo prêmio em dinheiro, que os mais novos gostam tanto de ter, dá resultado.
Vamos encarar o assunto começando pela responsabilidade escolar. Hoje, existem dois fatores que conspiram contra a possibilidade de crianças e adolescentes assumirem a vida escolar como uma batalha pessoal e intransferível: os pais e a própria escola.
Os pais decidiram que os filhos precisam, de qualquer maneira, ter uma vida escolar exitosa. Para tanto, procuram a melhor escola, contratam professores particulares, buscam profissionais para ajudar o filho a enfrentar as dificuldades que encontram, estão em contato constante com dirigentes da escola etc.
Já afirmei aqui e repito: parece que a vida escolar do filho se tornou uma espécie de avaliação de seus pais. Bons pais produzem alunos dedicados aos estudos e com bons resultados em qualquer tipo de avaliação. Essa parece ser a máxima em vigor.
Ocorre que, enquanto a vida escolar for uma questão vital para os pais, os filhos não a assumirão como sua.
A escola, por sua vez, continua a atuar como fazia séculos atrás: espera que os alunos deem conta das tarefas sem que sejam ensinados.
Tomemos a lição de casa como exemplo. Se o aluno não aprender que fazer a lição tem seus frutos e não fazer também, não terá motivo algum para assumir sua lição.
O que acontece com o aluno que não entrega a lição? Essa é uma boa pergunta que os pais deveriam fazer para a escola. Aí, quem sabe, poderiam ficar tranquilos deixando a lição de casa, feita ou não, com o filho.
Quanto às pequenas responsabilidades com os afazeres domésticos é preciso, em primeiro lugar, que a criança sinta que pertence àquele grupo familiar e que isso acarreta ônus e bônus.
Até os seis anos, mais ou menos, a criança aprende sempre que os pais lhe pedem para ajudar. Depois disso e até a adolescência, a criança aprende fazendo com a ajuda dos pais. Na adolescência, o filho precisará ser sempre lembrado de suas responsabilidades. Mas não vale fazer por ele, mesmo que isso custe não ter roupa limpa na hora que ele precisar.
Ensinar aos filhos que eles devem assumir suas próprias responsabilidades dá trabalho, exige paciência e persistência, porque é uma tarefa que dura mais ou menos uns 18 anos. Com sorte.
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