29 de outubro de 2012

Universidades debatem o futuro do ensino


 
Conferência Internacional "Reinventando o Ensino Superior" reuniu, na Espanha, reitores, gestores de associações de ensino e especialistas de diversos países.

Em um mundo onde o acesso a informação está cada vez mais democratizado e o conhecimento se multiplica em uma velocidade nunca antes vista, ensinar se tornou um grande desafio. Os professores não são mais os únicos donos da verdade. Os currículos precisam ser flexíveis e construídos de acordo com as novas necessidades do mercado.

As universidades, portanto, não podem mais abrigar apenas uma elite que dita as regras e que está distante do que acontece no mundo real. Embora muito se fale sobre essas transformações, que envolvem também a construção de um novo modelo de negócio mais sustentável, a maior parte das instituições de ensino superior ainda funciona da mesma forma há um século - e pode estar caminhando para a obsolescência.

Essas foram algumas conclusões da 3ª Conferência Internacional "Reinventando o Ensino Superior", cujo tema deste ano foi "Eduempreendedorismo: Novas Formas e Caminhos Para a Diferenciação no Ensino Superior". O encontro, promovido pela IE University, reuniu na sede da escola espanhola, reitores, gestores de associações de ensino e especialistas de diversos países.

O objetivo foi colocar no mesmo ambiente representantes de diferentes tendências e modelos de escolas, das mais tradicionais como Oxford às mais modernas como Brown, além de instituições como o World Economic Forum e a Wikipedia - todos com o desafio comum de entender esse novo momento no ensino.

"A globalização trouxe um novo tipo de competição e as universidades precisam responder às necessidades atuais do mercado", diz Santiago Iñiguez, presidente da IE Business School. Ele diz que existe uma pressão enorme para que essas instituições sejam mais efetivas em seus modelos de negócios e ensino.

"Há uma explosão da demanda por ensino superior, especialmente em países emergentes como Brasil, China e Índia. É preciso, no entanto, pensar em qualidade", diz Arnould de Meyer, presidente da Universidade de Negócios de Cingapura. Ele trabalhou por 23 anos no Insead, onde foi responsável por montar a operação asiática da escola na região.

De acordo com Meyer, a escassez de professores doutores em todo mundo pode comprometer esse desenvolvimento. "A Indonésia, por exemplo, já sofre com esse problema". Em sua opinião, é necessário formar um novo perfil de professor que seja ao mesmo tempo dedicado à pesquisa, mas que tenha trânsito no mercado. "Os acadêmicos, no geral, são avessos ao networking, mas isso precisa mudar."

Não se trata, contudo, apenas do perfil de quem ensina, mas também do conteúdo oferecido em sala de aula. "É preciso dividir com os estudantes o desenho dos currículos para que eles sejam cada vez mais interativos e customizados", diz Meyer. As pesquisas acadêmicas devem ser interdisciplinares e alinhadas com as necessidades do conhecimento e do mercado.

A inclusão das artes no currículo em todos os cursos da universidade americana Brown, segundo seu diretor de departamento de educação Kenneth Wong, é uma forma de inserir valores que vão além das disciplinas tradicionais. "Acreditamos na formação de um cidadão mais engajado na sociedade, interessado em saber a natureza dos governos e dos mercados, e não apenas as últimas tendências na área de marketing", explica.

Um dos grandes desafios das universidades hoje é formar os estudantes para um mercado de trabalho que ninguém sabe ao certo como será. "Temos que preparar os jovens para empregos que ainda não existem", diz Carlos Enrique Cruz Limón, vice-reitor da universidade mexicana Tecnológico de Monterrey. Para ele, as escolas vão ter que desenvolver novas atitudes e competências dos alunos tendo em vista que as transformações estão cada vez mais rápidas.

O uso de tecnologias e ferramentas modernas que disseminam o conhecimento como o Wikipedia - enciclopédia virtual construída coletivamente por milhares de usuários voluntariamente, que hoje é o quinto site mais popular do mundo e tem textos escritos em mais de 300 idiomas -, é visto como inevitável, mas exige cuidado. "Os alunos precisam buscar informação em mais de um lugar e desenvolver o pensamento crítico. As escolas devem estimular isso", diz Meyer.

A diretora do programa de educação da Fundação Wikimedia, Annie Lin, diz que o objetivo do Wikipedia é democratizar a informação. "Ele vai conduzir o aluno a outras fontes", diz. O uso do site, segundo ela, ajuda a treinar algumas habilidades importantes no mercado atual. "Refiro-me à comunicação on-line, ao contato com pessoas de diferentes nacionalidades e backgrounds tentando solucionar problemas e trabalhando juntas" diz. Além disso, o estudante treina sua capacidade de síntese e clareza ao escrever um texto.

O ensino on-line é outro assunto que está sendo muito discutido entre os educadores e que vem crescendo aos poucos em vários países. Para Michele Petochi, diretor da área de educação do Fórum Econômico Mundial, a tecnologia ainda é cara e sua efetividade está sendo testada. O custo de um curso on-line em uma universidade de primeira linha, segundo ele, é três vezes maior do que o pago pelo aluno. "O mundo não sabe ainda de onde as pessoas aprendem de verdade, se é com experiências virtuais e presenciais, se é no trabalho ou em atividades sociais", afirma.

Com o aumento dos cursos a distancia e as parcerias internacionais, algumas escolas questionam se ainda vale investir em infraestrutura. "Estamos olhando cada vez mais para fora", diz o vice-reitor de Monterrey. Para a diretora do programa Education UK do British Council, Pat Killingley, são os próprios estudantes que pedem esse movimento internacional. "Eles dão as cartas e os negócios se organizam a partir dessa demanda."

Para se manterem sustentáveis e ampliarem o número de parceiros e escritórios ao redor do mundo, como fazem as escolas de negócios, as universidades terão que olhar para um público que está acima da faixa entre 18 e 28 anos de idade. "O conhecimento do mundo dobra de tamanho a cada sete anos. Isso significa que as pessoas precisarão pensar em um estudo de longo prazo e as universidades têm que estar preparadas", diz Meyer.
(Valor Econômico), 29/10/2012

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