ENTREVISTA Marco Antonio Raupp Ministro da Ciência e TecnologiaHá 50 anos longe do Rio Grande do Sul, o novo ministro da Ciência e Tecnologia, Marco Antonio Raupp, ainda cultiva as tradições gaúchas. Nascido em Cachoeira do Sul, o doutor em matemática pela Universidade de Chicago gosta de vestir bombacha nos finais de semana para assar churrasco e sorver mate com os oito filhos no sítio da família, em Minas Gerais.
Aos 73 anos e com longa trajetória em pesquisas, o ex-presidente da Agência Espacial Brasileira desembarca no primeiro escalão do governo Dilma Rousseff com o respaldo do meio científico. Sétimo ministro gaúcho ou com vínculos com o Estado, defende um mutirão para qualificar mão de obra. A síntese da entrevista: Zero Hora A presidente Dilma o incumbiu de alguma missão específica à frente do ministério?
Marco Antonio Raupp Como integrei a equipe anterior como presidente da Agência Espacial Brasileira, minha gestão será de continuidade. A presidente me pediu para dar prosseguimento aos projetos da pasta e também para tentar não mexer muito na estrutura atual. Não pretendo fazer nenhuma reestruturação. Minha missão é fazer a roda girar mais rápido.
ZH Qual será sua prioridade?
Raupp Pretendo estabelecer dois pilares. Um deles é fortalecer a base científica e de pesquisa no país. Elas são matrizes de todas as atividades produtivas. É crucial ampliar e qualificar o número de profissionais, a infraestrutura dos laboratórios, os equipamentos, além de aumentar a capacidade de produção de conhecimento. Também é imprescindível melhorar o ensino técnico e universitário do país. O meu segundo pilar será levar a ciência para os parques industriais e apoiar a modernização do serviço público. Enfim, temos de valorizar e qualificar cada vez mais a infraestrutura da ciência e colaborar para o desenvolvimento das atividades produtivas.
ZH Como conciliar desenvolvimento tecnológico e sustentabilidade?
Raupp Temos o desafio de levar a ciência a todo o país, com sustentabilidade. Por exemplo, a ocupação da região amazônica tem de ser feita com conhecimento científico, para não corrermos o risco de dilapidar nosso patrimônio da biodiversidade. A ciência serve para equilibrar a utilização dos recursos naturais, explorar sem destruir. É uma preocupação que vale também para a exploração dos recursos do pré-sal em mares profundos.
ZH Qual é o setor brasileiro mais defasado tecnologicamente?
Raupp A área de tecnologia industrial é um desafio que temos de atacar, juntamente com o setor produtivo. A Confederação Nacional da Indústria tem se envolvido com o governo para tentar solucionar esse gargalo. Por outro lado, há setores industriais com um bom nível de desenvolvimento tecnológico, como o petrolífero e de aviação. O agronegócio também é um setor moderno e competitivo. Alcançamos nesse mercado o nível tecnológico de países desenvolvidos.
ZH A recente parceria entre Embraer e Telebrás para gerenciar o Satélite Geoestacionário Brasileiro será replicada em outros projetos do governo?
Raupp Sem dúvida. O setor produtivo tem de participar e investir mais no desenvolvimento tecnológico. As próprias empresas irão se beneficiar, capacitando-se para a competição global. Essas parcerias são fundamentais para a iniciativa privada. Estamos vivendo um bom momento do país e temos de aumentar o investimento privado na ciência nacional.
ZH Como o senhor pretende contornar a falta de mão de obra especializada no país?
Raupp Pretendo trabalhar afinado com o Ministério da Educação, abrindo novos cursos técnicos e investindo na formação de engenheiros e cientistas. Contudo, não é algo que será resolvido em três anos, afinal, é um problema histórico. Precisamos implementar uma política que ultrapasse vários governos. A ação tem de ser de longo prazo, com muito investimento na educação básica. Não existe desenvolvimento cientifico sem educação de qualidade. Por isso, a presidente celebrou durante a minha posse o casamento da Ciência e Tecnologia com a Educação. Segundo ela, as duas pastas têm de atuar em conjunto.
ZH O déficit de profissionais especializados, especialmente na área de engenharia, compromete de alguma forma nosso desenvolvimento tecnológico?
Raupp Não digo que comprometa, mas atrapalha muito. Estamos fazendo um grande esforço para recuperar terreno. Não é à toa o grande investimento do governo em educação nos últimos anos.
ZH Mas mesmo com o aumento dos investimentos, ainda há um abismo entre os gastos do Brasil e de outros países emergentes, como China e Coreia do Sul. Quanto tempo levará para alcançarmos um nível semelhante?
Raupp Faz cinco décadas que a China faz um esforço massivo em educação. Queremos alcançar esse grau de investimento, mas não é tão fácil fazer um mutirão em um país com uma diversidade tão grande como a nossa. Não é só questão de dinheiro, é mobilização das mentes. O governo tem que atender muitas demandas, e as crises econômicas que ocorrem ocasionalmente acabam afetando as políticas públicas.
ZH Criado há 11 anos, o Ceitec produziu seus primeiros chips em volume comercial em 2011. Na sua gestão, qual vai ser o foco da estatal?
Raupp Estou me atualizando agora sobre a situação do Ceitec. Até então, não acompanhava o desenvolvimento da planta de chips gaúcha. Na minha avaliação, o Ceitec tem de ser uma fonte de pesquisa para a indústria, inclusive, desenvolvendo produtos. Porém, industrialização massiva é função do setor privado.
FABIANO COSTA | Brasília
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