Inclusão digital em
favelas brasileiras
ainda é desafio
Repórter relata o uso da internet pelos moradores da favela Babilônia, no Rio de Janeiro.
A internet criou novas oportunidades para muitas pessoas enriquecerem ao redor do mundo. Mas será que os benefícios gerados pelo acesso à rede estão chegando aos mais pobres? Uma favela brasileira é um bom lugar para descobrir.
Babilônia é uma favela no Rio de Janeiro com cerca de 80 mil moradores, a maioria muito pobre. A comunidade fica próxima da famosa praia de Copacabana e até recentemente era um lugar perigoso para se viver.
Até alguns meses atrás, antes de a polícia ocupar a área e retomar o controle do local, a favela era comandada por traficantes.
No entanto, apesar do ambiente incerto, alguns moradores da favela usam a internet de maneira bastante sofisticada.
Usuários da rede, ao contrário do que acontece em outras comunidades pobres ao redor do mundo, não encontram dificuldades técnicas para acessar a internet na favela da Babilônia, localizada próxima do coração do Rio de Janeiro, onde a rede de comunicação é boa.
Poucas pessoas, no entanto, têm um computador conectado à rede em casa. O acesso é feito em internet cafés, também conhecidos como "lan houses".
O primeiro lugar que visitei foi uma creche administrada por uma instituição de caridade. Os funcionários do local cuidam das crianças da comunidade enquanto os pais estão no trabalho.
E a continuação do funcionamento da creche só é possível pela arrecadação de fundos feita graças à internet, que tem papel crucial para manter o local aberto.
"Nós levantamos 60% dos nossos fundos mandando apelos através de e-mails", explica a administradora da creche, Antonia Nascimento.
Nascimento conta que depende das doações de pessoas que moram fora da favela e de patrocinadores corporativos para pagar os funcionários e manter o prédio que abriga a creche.
"Se você for ligar para um diretor de uma grande companhia, você não vai conseguir chegar até ele através do telefone, então você lhe manda um e-mail e, quando ele tiver tempo, ele pode ver o seu pedido", afirma ela.
"Talvez poderíamos manter a creche sem a internet, mas seria muito difícil", disse.
Além do papel importante na manutenção da creche, a internet também é usada para manter contato com os pais das crianças.
Em um bar da favela, conheço um homem de aparência dura que administra um negócio para conserto de motocicletas. Morelio, de 28 anos, afirma que pretende anunciar seu serviço na internet para conquistar mais clientes.
"Há muita competição. A internet pode realmente aumentar a percepção dos meus serviços", diz Morelio.
Ele alega que seu negócio depende muito de recomendações boca a boca de clientes satisfeitos.
"Se eu pudesse anunciar estas recomendações na internet realmente iria me ajudar a conseguir mais clientes", afirma.
A mensagem que estes dois pequenos exemplos transmite é que, quando dada a oportunidade, pessoas em comunidades pobres usam a internet para ganhar vantagens econômicas de maneira bem parecida à praticada por qualquer outra pessoa.
Babilônia é uma das muitas favelas no Brasil que recebe ajuda do Centro de Inclusão Digital (CDI), instituição que trabalha com comunidades carentes para aumentar o acesso à tecnologia.
"Traficantes representam modelos porque eles têm poder, mulheres e dinheiro. O que precisamos fazer é criar alternativas", afirma o diretor do CDI, Rodrigo Baggio.
Ele sustenta que, de maneira geral, as crianças nas favelas veem a internet e a tecnologia como algo "legal" e um passaporte para uma vida melhor, oferecendo chances de conseguir um melhor emprego.
No entanto, Kathi Kitner, que trabalha como antropóloga para a fabricante de chips Intel, ressalta que não é suficiente simplesmente fornecer a tecnologia.
Segundo ela, projetos de inclusão digital de sucesso devem ser acompanhados de medidas que apóiem os esforços das pessoas de criar renda a partir do uso da rede.
De acordo com Kitner, é necessário haver uma noção de "sensibilidade cultural".
Ela cita, por exemplo, que na Índia, o sistema de castas rurais ainda é muito forte, então é importante saber onde colocar os computadores conectados, pois há lugares é proibida a entrada de pessoas de castas mais baixas.
"Há uma tendência de que pessoas de classe média sejam as primeiras a usar a internet, porque elas têm mais conhecimento de como usar um computador. Isso não é algo ruim, mas é normalmente errado assumir que este conhecimento irá chegar aos mais pobres", afirma Kathi Kitner.
Potencialmente, a internet é uma ferramenta poderosa para que pessoas na base da pirâmide social melhorem de vida, mas fazer com que isso funcione ainda não é fácil.
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