24 de outubro de 2011 Educação e Ciências | Diário do Comércio - SP - Online | Opinião | SP
O movimento Ocupar Wall Street está ressaltando um ponto importante de um dos desafios centrais dos Estados Unidos: a desigualdade que deixa o 1% dos norte-americanos mais ricos com um patrimônio líquido maior do que o dos 90% que estão na base. A maioria dos remédios propostos envolve mudanças na tributação e na regulamentação, e elas de fato ajudariam. Mas a medida que mais reduziria a desigualdade não tem nada a ver com finanças. Trata-se da expansão da educação infantil inicial. Isso vai parecer ingênuo e bizarro para muitos que se irritam com as desigualdades e que acham que o primeiro passo é botar alguns banqueiros na cadeia. Embora parte do problema seja os bilionários tributados com impostos extremamente baixos, uma fonte maior de desigualdade estrutural é que muitos jovens nunca vão ter as habilidades necessárias para competir. Simplesmente eles são deixados para trás. "É aí onde começa a desigualdade", disse Kathleen McCartney, a deã da Harvard Graduate School of Education, enquanto me exibia um gráfico demonstrando que mesmo antes do jardim da infância há diferenças de desempenho entre estudantes ricos e pobres. Essas diferenças vão se ampliar depois, na escola. "O motivo pelo qual a educação inicial é importante é que ela é a base para o sucesso escolar", afirmou ela. "E sucesso alimenta sucesso." Um traço comum, esteja eu fazendo reportagem sobre a pobreza na cidade de Nova York ou em Serra Leoa, é que uma boa educação tende a ser a escada rolante mais confiável para sair da pobreza. Outra característica comum: seja nos Estados Unidos ou na África, garotos desfavorecidos geralmente não têm a chance de subir nessa escada. Talvez pareça absurdo propor a expansão da educação infantil inicial numa época na qual os orçamentos estão sendo reduzidos. Contudo, James Heckman, um economista da Universidade de Chicago, ganhador do Prêmio Nobel, tem mostrado que os investimentos na educação infantil inicial se pagam por eles mesmos. Aliás, Heckman afirma que eles geram retorno de 7% ou mais - melhor do que muitos investimentos em Wall Street. "A escolaridade após o segundo grau só desempenha um pequeno papel em criar ou reduzir diferenças", afirmou Heckman em um artigo publicado neste ano na American Educator. "É imperativo mudar a forma com que olhamos para a educação. Temos de investir nos fundamentos da disposição à educação, do nascimento aos cinco anos." Uma das iniciativas mais estudadas nessa área foi o Programa de Pré-Escola Perry, que trabalhou com crianças negras desamparadas em Michigan nos anos 1960. Em comparação a um grupo de controle, as crianças que passaram pelo Programa Perry tiveram 22% mais chance de terminar o ensino médio e foram detidas por delitos menos da metade das vezes. Tinham 50% a menos de possibilidade de receber ajuda pública e três vezes mais chance de ter casa própria. Não queremos ficar animados demais com essas estatísticas, ou com as igualmente analisadas do Projeto Abecedário na Carolina do Norte. O programa era minúsculo e sabemos que muitas iniciativas antipobreza funcionam maravilhosamente quando são experiências, mas fracassam ao ser ampliadas. Mas uma nova pesquisa sugere que a educação infantil inicial pode funcionar até em escala no mundo real. Observem a Head Start, que atende mais de 900 mil crianças de baixa renda por ano. Existem falhas na Head Start e pesquisadores descobriram que enquanto ela melhorava os resultados dos testes, esses ganhos desapareciam logo. Como resultado, a Head Start parecia não entregar qualquer benefício duradouro, e tem sido amplamente qualificada como um fracasso. Não tão rápido. Um dos pesquisadores de Harvard que entrevistei, David Deming, comparou os resultados de crianças que estiveram na Head Start com seus irmãos que não participaram. Ele descobriu que as críticas eram corretas: as vantagens dos que tinham participado na Head Start nos resultados dos testes desapareciam rapidamente. Mas em outras áreas, talvez as mais importantes, a Head Start teve um impacto expressivo a longo prazo: os ex-participantes eram significativamente menos propensos do que seus irmãos a repetir anos, ser diagnosticado com deficiência de aprendizado ou sofrer o tipo de saúde frágil relacionada à pobreza. Os ex-alunos da Head Start tiveram mais chance do que seus irmãos de terminar o ensino médio e entrar na universidade. Deming descobriu que nesses resultados de vida, a Head Start conseguiu 80% do impacto do Programa Perry - uma conquista esplêndida. Algo parecido ocorreu no programa de larga escala para o pré-jardim da infância em Boston. Hirokazu Yoshikawa e Christina Weiland, ambos de Harvard, descobriram que ele acabou com as diferenças entre latinos e brancos nos testes do jardim da infância e reduziu drasticamente as diferenças entre negros e brancos. O presidente Barack Obama, em sua campanha, falou várias vezes sobre a educação infantil inicial e provavelmente concorda com o que eu disse. Mas essa questão caiu fora da agenda. Isso é triste porque a questão não é se podemos nos dar ao luxo de uma educação infantil inicial, mas se podemos nos dar ao luxo de não fornecê-la. Podemos pagar por prisões ou podemos pagar por uma educação infantil que ajude a construir uma nação mais justa e honesta. Nicholas D. Kristof é colunista do jornal The New York Times. Tradução: Rodrigo Garcia |
25 de outubro de 2011
Ocupar Wall Street? Saída: ocupar a sala de aula
Postado por
jorge werthein
às
09:18
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