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As férias poderiam ser uma época de descobertas se as crianças não tivessem tantos afazeres
Muitos pais estão preocupados com o período das férias escolares que se aproxima. "O que fazer com os filhos no mês de julho?": essa é a questão.
A sociedade já se preparou para receber as crianças e os jovens que, nesse tempo, não têm a organização do dia realizada em função do horário escolar nem a responsabilidade com as tarefas que o estudo traz.
Os pais, hoje, contam com várias alternativas para ocupar os filhos nesse período ou, pelo menos, em parte dele: acampamentos de lazer, acampamentos de imersão em língua estrangeira, espaços de entretenimento infantil, viagens monitoradas, atividades esportivas em clubes ou escolas especializadas na área, passeios em shoppings e escolas que mantêm seu espaço aberto para receber os alunos, mas agora em um contexto de diversão e não de estudo.
Todo esse aparato costuma ter uma boa justificativa para sua existência: há pais que não podem estar presentes em casa com os filhos porque precisam continuar a trabalhar. Será essa a razão?
Reconheço que, em muitos casos, existe mesmo essa impossibilidade. Mas ela será tão determinante assim que impeça a criança ou o jovem de ficar em casa nesse mês sem ter de comparecer a um programa com dias e horários agendados?
Permita, caro leitor, que eu duvide dessa boa razão. E tenho motivos para isso: diversas escolas que recebem alunos com uma programação de lazer nas férias já me contaram que muitas mães que por lá deixam seus filhos confessam que não trabalham. Sabe por que levam seus filhos para a escola nas férias? Porque não sabem o que fazer com as crianças em casa.
Temos aqui uma boa oportunidade para refletirmos a respeito do relacionamento entre pais e filhos nos tempos atuais.
Uma coisa é certa: nunca antes os pais estiveram tão próximos dos filhos quanto agora. Em geral, os pais são grandes companheiros dos filhos em quase tudo o que estes fazem: acompanham os estudos, as lições que devem ser feitas em casa, levam para as festas que frequentam, conhecem os colegas mais próximos e os amigos, fazem programas juntos.
E a proximidade entre eles não para aí: compartilham segredos e intimidades e se falam o dia todo, mesmo quando os pais estão em horário de trabalho e os filhos em horário de aula.
Quando os pais querem sair para um programa com os amigos adultos, não se constrangem em levar o filho, mesmo que o passeio vare a madrugada. Em resumo: os pais sabem de tudo da vida dos filhos e vice-versa.
Mas a quantas anda o relacionamento desses pais com seus rebentos?
Parece que, sem alguma mediação, eles não sabem o que fazer quando estão juntos, por isso as férias escolares se transformaram em um problema a ser resolvido.
Ficar em casa, ter tempo livre e, ao mesmo tempo, estar com os filhos parece ter se tornado uma equação difícil de ser resolvida por muitos pais. O que segura uma convivência em tal situação é o relacionamento: o interesse verdadeiro dos pais pelos filhos.
O que eles pensam? O que acham da vida que levam, dos acontecimentos do mundo que o afetam? O que já exploraram do mundo e quais aprendizagens tiveram real sentido para eles?
O que poderiam gostar de fazer, de descobrir? Como percebem o vínculo que têm com seus pais? O que pensam e o que gostariam de fazer quando não têm nada para fazer? Como convivem consigo mesmos, com seus pensamentos e sentimentos?
As férias, para crianças e jovens, poderiam ser um tempo de descobertas e solidificação de aprendizagens se nesse tempo eles não fossem levados a ter novos compromissos, mesmo que sejam compromissos com o lazer.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha)
Folha de S.Paulo
26/06/2012
26/06/2012
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