Folha de S.Paulo, 3/10/2012
SÃO PAULO - Sou um ardoroso defensor da laicidade do Estado, mas receio que ela não possa ser estendida para eleições, como parece querer boa parte dos intelectuais e políticos mais à esquerda.
Não me entendam mal. Também eu gostaria que questões de fé, como a filiação religiosa dos candidatos e suas posições em relação a aborto, eutanásia etc. (que não são assuntos da alçada do Executivo ou de prefeituras), não influíssem no pleito, mas, para fazê-lo, precisaríamos eliminar o povo do processo de escolha, o que provavelmente é uma má ideia.
Ao contrário de juízes e outros servidores públicos, que precisam justificar racionalmente suas decisões, o eleitor deve satisfações apenas à própria consciência. Se, para ele, o fato de o postulante ter vínculos com esta ou aquela igreja faz diferença, não há como objetar a que leve isso em consideração na hora de votar.
O que se pode fazer para preservar a laicidade do Estado é exigir que, uma vez eleito, o administrador se paute pelos princípios constitucionais que asseguram a neutralidade do poder público em matéria religiosa. Eles incluem a proibição de subvencionar igrejas, a necessidade de atuar de forma impessoal e a proteção a direitos de minorias.
Os crentes deveriam ser a parte mais interessada na manutenção do Estado laico, que é essencialmente uma garantia de liberdade religiosa. E, se há algo que realmente une todas as fés, do catolicismo ao islamismo, é clamar por liberdade religiosa nos países em que são minoritárias.
Voltando à democracia, precisamos abandonar a noção de que ela funciona porque cidadãos se debruçam sobre os problemas e, após cuidadosa análise, escolhem as melhores propostas. Esse modelo existiu apenas na cabeça de alguns filósofos do século 18 e do TSE. Democracias dão certo principalmente porque canalizam para formas menos violentas os conflitos existentes em qualquer sociedade.
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