18 de novembro de 2012

Evasão ainda desafia a UnB

Correio Brasiliense, 18/11/2012

Embora tenha caído de 42% para 11% de 2002 a 2010, taxa de alunos que abandonam o curso na Universidade de Brasília continua alta, na avaliação do Decanato de Ensino de Graduação. Com a nova Lei das Cotas Sociais e Raciais, a instituição teme novo aumento do índice
» MANOELA ALCÂNTARA

Em oito anos, a taxa de evasão na Universidade de Brasília (UnB) caiu de 42% para 11%. Dados levantados pelo Decanato de Ensino de Graduação com peculiaridades de cada curso possibilitaram ações para alcançar o patamar menor. Porém, ainda é preciso lutar contra as oscilações constantes nos números (veja quadro) a fim de garantir que o percentual se mantenha. Com a Lei das Cotas Sociais e Raciais, aprovada em agosto pelo Congresso Nacional, a conquista pode regredir caso não haja, por exemplo, investimento suficiente para manter os alunos de baixa renda nas universidades. A promessa do Ministério da Educação é analisar as demandas de cada instituição federal de ensino superior e aumentar os recursos de incentivo para esse público.
Ao longo do período analisado, a UnB acumulou uma média de evasão de 25%. As maiores vilãs são a demora para concluir a graduação, a mudança de cursos, a falta de condições financeiras para os estudantes se manterem na universidade e a reprovação. O MEC não tem um índice preciso, por aluno, para medir a evasão, mas o último Censo da Educação Superior mostrou que, entre 2010 e 2011, praticamente 1 milhão de estudantes não renovou a matrícula nas universidades de todo o país. Isso representa 18% de um total de 5.398.637 graduandos no período. Embora as comparações não utilizem o mesmo critério, os dois percentuais apresentam sinal de alerta para estudos mais aprofundados e ações efetivas a fim de melhorar os patamares.
A queda de 27% para 11% entre 2009 e 2010, na federal brasiliense, deve-se a ações efetivas após realização de pesquisa. "Verificamos um índice alto de reprovação em matérias como química, matemática e física. Adotamos um trabalho de tutoria para os alunos com dificuldade e os números melhoraram consideravelmente", afirmou o decano de Ensino de Graduação da UnB, José Américo Soares. Além disso, graduandos que haviam passado do tempo de se formar conseguiram o diploma de nível superior em 2010. "Eles estavam há sete ou oito anos na instituição e completaram a graduação. Isso também ajudou na redução dos números", disse.
Apesar dos 11% em 2010, Américo ainda considera que a média de 25% em oito anos tem que cair. "Não é um assunto rápido de ser solucionado. Em março deste ano, apresentamos dados específicos de cada curso para os colegiados. Eles devem analisar as principais deficiências em cada área para as ações se tornarem mais direcionadas", analisou o decano. Uma das maiores preocupações de Américo é como continuar a redução com as novas necessidades a serem geradas pela Lei Federal nº 12.711. "O maior motivo de evasão é o abandono, normalmente causado por dificuldades financeiras. Temos que ter condições de manter os alunos no ensino superior com qualidade", enfatiza.
Troca-troca
Outro gerador de evasão é o alto índice de mudança de cursos. São alunos que, por algum motivo, desistem de certa especialidade para cursar outra. As razões são as mais diversas: imaturidade ao sair do ensino médio, adequação à vida profissional, entre outros. A bancária Karolini Sá, 25 anos, chegou a trocar de especialidade duas vezes na UnB até se adequar àquela na qual se formou em 2011. "Entrei na UnB no 2º semestre de 2005, aos 18 anos, no curso de química. No primeiro semestre de 2006, passei para farmácia e, em 2009, iniciei o curso de ciências contábeis", conta.
No primeiro vestibular, fez a prova para química porque não se sentia preparada para passar em farmácia, profissão que, durante anos, idealizou seguir. Ao conseguir a aprovação, Karolini acreditou estar no caminho certo, até conhecer as possibilidades que a contabilidade poderia gerar no mercado de trabalho. "Passei em um concurso em que não havia possibilidade de crescimento, dentro da empresa, na área farmacêutica. A partir do 4º semestre, peguei algumas matérias de outras áreas para ver se me decidia. Quando cursei introdução à contabilidade, vi o que queria", relatou.
Ela sentiu falta de uma instrução maior no ensino médio acerca da escolha profissional. Quando se formou, optou por química porque gostava da matéria na escola. Mas nem sequer pensava em contabilidade. "Não me passava pela cabeça. Se eu tivesse um contato no ensino médio com matérias de administração, contabilidade, economia, quem sabe não teria feito o curso desde o começo?", questionou. Situação que pode se repetir por anos se uma política de conscientização para o mercado de trabalho não ocorrer antes da conclusão do ensino básico.
Orientação
O ex-assessor especial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), professor da UnB e da Universidade Católica de Brasília (UCB) Célio da Cunha acredita que a orientação profissional pode evitar escolhas erradas. "As mudanças de curso são muito comuns. Um trabalho sério sobre as futuras profissões poderia evitar isso", disse. O especialista ressalta ainda que, em alguns países, os alunos ingressam no ensino superior para cursar um ciclo básico comum de estudos e só depois optam pela carreira a seguir. "A universidade tem que estar constantemente preocupada em encontrar caminhos para reduzir a evasão."
Cunha analisa, ainda, que o percentual de 11% é aceitável, mas precisa ser reduzido. "Uma vaga pública em uma universidade é muito cara. É dinheiro jogado fora, quando ela é desperdiçada. O ideal é em torno de 5%, como ocorre em outros países", disse o especialista. Apesar da redução nos últimos anos na UnB, uma média de 25% de evasão preocupa o professor. "É algo a ser examinado. É preciso encontrar as melhores opções para mudar esse número. Seria uma tarefa do Inep pesquisar isso, mas a universidade também pode fazer o trabalho necessário para obter resultados internos", completou.
Até o fim de 2012, as diretorias de curso dentro da UnB saberão quais são os gargalos da evasão de cada graduação e como podem alterar a situação. Uma das possibilidades estudadas pela instituição é ampliar o número de moradias para os estudantes de baixa renda. A Casa do Estudante Universitário (CEU), hoje com capacidade para 600 pessoas, deve ganhar novos prédios e ampliar o atendimento para 2 mil alunos. Além disso, o especialista em educação sugere que uma espécie de professor orientador faça parte da rotina da universidade. "Ele seria responsável por oito ou 10 estudantes. Os ajudaria academicamente e até em problemas externos que pudessem provocar a desistência", exemplificou Cunha.
Aumento As cotas sociais estão previstas na Lei Federal nº 12.711. O documento prevê a reserva de 50% das vagas em instituições federais de ensino para estudantes oriundos de escolas públicas, pretos, pardos, indígenas e de baixa renda em quatro anos. A aplicação é imediata e vale para as próximas seleções, que darão acesso à universidade em 2013. Neste primeiro ano, o percentual mínimo a ser adotado é de 12,5%. Do total de vagas destinadas aos alunos de escolas públicas, metade será reservada aos candidatos oriundos de famílias com renda per capita inferior ou igual a 1,5 salário mínimo.

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