27 de novembro de 2010

Cristovam Buarque

De Brasília para Dilma
 



Cristovam Buarque
  Professor da UnB e senador pelo PDT-DF
Brasília, senhora presidente, é vista como a cidade que exemplifica o potencial do povo brasileiro, capaz de construir do nada uma das grandes metrópoles do país, em menos de 50 anos. A partir de janeiro, será sua cidade. A capital de onde a senhora vai governar quase 200 milhões de pessoas, que hoje torcem fortemente pelo seu êxito, que será o de todos.
É como habitante de Brasília que me atrevo a lhe escrever. Tenho impressão de que seu governo será o último deste ciclo de democracia política com avanços sociais, ou irá além, como o primeiro de um novo ciclo de reorientação de nosso modelo social, econômico, ambiental e político. Poderemos continuar com as sucessivas eleições democráticas ou, além disso, fazer a reforma política que o país precisa.
Podemos continuar a crescer, com estabilidade monetária ou, além disso, iniciar uma economia baseada no conhecimento, produzindo os novos bens de alta tecnologia. Continuar reduzindo a taxa de desmatamento ou criarmos as bases de um modelo de desenvolvimento em equilíbrio com a natureza. Também podemos ficar apenas na busca incessante de aumentar o PIB, ou encontrar novos indicadores do bem-estar de nossa população. Poderemos continuar com o avanço no atendimento social dos últimos 25 anos, ou darmos um salto para uma sociedade em que esses atendimentos assistenciais deixem de ser necessários.
Esse último salto, no social, é o que mais esperamos da nossa nova presidente, e ele só poderá vir por uma revolução na educação de base. A educação exige um conjunto maior de medidas, mas, neste pequeno espaço, gostaria de sugerir-lhe apenas algumas que ajudariam no esforço de decolar a revolução que fará com que o Brasil tenha uma das melhores educações do mundo e cada criança nossa tenha acesso à educação com a mesma qualidade, com o filho do trabalhador na mesma escola do filho do patrão.
A primeira sugestão é a criação de um ministério que cuide diretamente da educação de base.
Enquanto o MEC tiver de cuidar do ensino superior, a educação de base continuará entregue aos municípios e estados, que são pobres e desiguais. Só um Ministério da Educação de Base vai permitir que o governo federal tenha interesse, vocação e cobrança para agir na educação de base. Se disserem que é mais um ministério, a senhora pode simplesmente reunir o ensino superior com a ciência e a tecnologia em um só ministério.
A minha segunda sugestão é a de que seja instituída uma carreira nacional do magistério da educação de base. Sem exigências federais para seleção e contratação, salários dignos e dedicação exclusiva, as carreiras dos professores municipais e estaduais continuarão insuficientes e desiguais.
O professor só será respeitado, valorizado e cobrado quando tratarmos todos eles como profissionais federais. A um ritmo de 100 mil novos professores federais por ano, nessa nova carreira, será possível atender 250 cidades de porte médio, 10 mil escolas, 3 milhões de crianças. Em 20 anos cobriremos todo o país.
Terceiro, para que essa carreira dê resultado, é preciso um programa federal de qualidade escolar que absorva esses novos professores federais em cidades com suas escolas reconstruídas, equipadas e em horário integral.
Quarto, para apoiar a educação, sugiro a organização de uma agência para a proteção da criança e do adolescente. Por incrível que pareça, senhora presidente, no Brasil de hoje criança não dispõe de uma estrutura do governo federal, não há um órgão responsável por elas, ninguém cuida da atenção a elas.
A Polícia Rodoviária Federal identificou, nesta semana, 1.830 pontos de prostituição infantil, só nas margens das estradas federais, e a Presidência não tem um responsável para dar solução a esse grave e vergonhoso problema.
Quinto, com o carisma de presidente e com os recursos que o governo dispõe, será possível acabar com a vergonha de um país que tem mais de 14 milhões de analfabetos. Uma vergonha e uma estupidez nacional ao deixar esse potencial desaproveitado por causa do analfabetismo. Com um esforço concentrado, liderado por seu governo, será possível dizer aos turistas que virão para a Copa do Mundo que estarão entrando em território livre do analfabetismo. E a senhora escreverá, em definitivo, o seu nome na história deste país.
Ao lado do PAC, a REB (Revolução Educacional Brasileira) vai exigir muitas outras ações, mas esses são pilares necessários para podermos dizer que seu governo fez uma inflexão, não apenas melhorou, revolucionou o país por meio da educação.

Correio Brasiliense



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