13 de setembro de 2011

Exame expõe contrastes em Brasilia:ENEM 2010



Desempenho dos alunos das escolas públicas e particulares revela a manutenção do abismo entre os dois sistemas de ensino


HELENA MADER
JÚLIA BORBA
ANA POMPEU
A divulgação das notas do Exame Nacional do Ensino Médio confirma o abismo que existe entre as escolas públicas e as particulares do Distrito Federal. Dos 77 colégios mantidos pelo governo local que participaram da prova, apenas dois obtiveram nota acima da média geral do Distrito Federal, que foi de 612,10 pontos. Sem considerar o Colégio Militar e o Dom Pedro II - mantidos respectivamente pelo Ministério da Defesa e pelo Corpo de Bombeiros - a escola pública mais bem colocada no ranking geral de instituições é o Setor Oeste, com nota 591,55, que aparece na 54ª posição.
O Centro Educacional Várzeas, localizado no Núcleo Rural Tabatinga, zona rural de Planaltina, está entre as cinco piores do Enem 2010. Lá, 51% dos estudantes matriculados participaram do exame e conseguiram, no total, média de 521,5 pontos. Um dos motivos do péssimo resultado é a falta de pessoal especializado para cuidar, por exemplo, do setor de informática e da biblioteca. Hoje, é impossível atender a demanda de livros para o preparo do PAS e do Enem. A estrutura também deixa muito a desejar. O colégio não tem, por exemplo, telefone fixo. "Me sinto envergonhado do resultado", afirma o diretor Adelmo Altoé. " Tudo que conseguimos na escola é por nossa iniciativa ou da comunidade", completa. Mas o Centro Educacional Várzeas nem sempre foi assim. No Enem realizado em 2007, a escola conquistou o quinto lugar entre as melhores do DF. Em 2008, o resultado do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica do colégio foi o melhor de Planaltina. "Testemunhei o céu e, agora, o inferno", lamenta Adelmo.
O Colégio Militar de Brasília, a mais bem classificada escola pública do DF, ocupa a 1.278 posição no ranking nacional. Entre as escolas mantidas pelo GDF, o Setor Oeste é a que conseguiu maior nota no Enem. Mas, ainda assim, está muito longe dos primeiros colocados do ensino brasileiro: ocupa a 3.676 posição no ranking das melhores do país.
Para o diretor de Ensino Médio da Secretaria de Educação do DF, Gilmar Ribeiro, a nota do Enem não pode ser usada como parâmetro para avaliar as escolas da rede pública. Ele lembra que a participação no exame é voluntária. "É uma decisão do aluno, não da escola. Nos colégios particulares, quem faz a proposta curricular é o dono da escola e eles focam no vestibular e no Enem, fazem turmas específicas para essas provas e simulados quinzenais", justifica Gilmar Ribeiro.
Ele explica que a rede pública precisa seguir as diretrizes curriculares nacionais. "Em geral, as escolas públicas têm vocação para o ensino integral e muitos estudantes precisam fazer estágio para complementar a renda familiar, por exemplo. Além disso, as instituições públicas não têm como projeto maior a preparação para o vestibular e Enem. A nota desse exame, portanto, não avalia qualidade, embora possa ser usada pelos gestores para eventuais ações", completa Gilmar Ribeiro.
Das 15 melhores escolas públicas do DF, pelo menos oito tiveram notas piores no Enem de 2010 em relação aos resultados do ano anterior. Na comparação entre as notas de um mesmo colégio, Gilmar Ribeiro concorda que há um indicativo de queda na qualidade. "Isso deve ser consequência dos desvios de verba que ocorreram na saúde e na educação nos últimos governos, o que fez com que os investimentos não fossem realizados nas escolas", justifica o diretor da Secretaria de Educação. Para resolver essas falhas, os técnicos defendem a reestruturação dos currículos, a reabertura de laboratórios e a capacitação dos servidores.
O professor do Departamento de Métodos e Técnicas da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e consultor da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) Célio da Cunha critica a elaboração de rankings e até mesmo a comparação realizada entre as médias das instituições públicas e das particulares. "O ideal seria pegar a nota de uma escola e comparar com o desempenho que ela mesma teve no ano anterior. Não dá para comparar a realidade dessas instituições, até porque o número de escolas particulares é muito menor."
Para o especialista em ensino médio e professor da Universidade de Brasília Carlos Augusto de Medeiros, a melhoria do ensino exige atenção especial de três aspectos. "A qualidade envolve um tripé, que é a formação inicial e continuada de professores, os processos de avaliação com sistemas padronizados e o financiamento", comenta. Para ele, a grande diferença das notas de escolas públicas e particulares dificilmente será reduzida a curto prazo por conta das dificuldades em superar os problemas que existem nessas três áreas. "O que se espera com esse debate é uma nova análise da identidade do ensino médio", finaliza o especialista.
Valorização
O Centro de Ensino Fundamental Ipê Riacho Fundo, que fica no Combinado Agrourbano 1 de Brasília, ficou entre os mais bem colocados no resultado do Enem de 2010 na categoria das escolas que tiveram participação de mais de 75% dos estudantes. Conquistou a 13ª posição, com média de 536,69, nota superior ao índice nacional do teste objetivo, que foi de 511,21.
Um dos segredos para o sucesso, de acordo com a diretora Sheila Pereira da Silva Mello, é valorizar o aluno e procurar incentivá-lo. "Sempre conversamos e ouvimos os estudantes para trazê-los para perto de nós", observa. Do 970 alunos, 90 estão no ensino médio, que funciona apenas no turno matutino e conta com três turmas, uma por série. "Conhecemos eles pelo nome e não pelo número da matrícula", afirma. Os que cursam o 3º ano já se preparam para o próximo Enem, com textos e questões voltados especificamente para a prova. Alguns ex-estudantes do centro de ensino viraram exemplo. Juler Abrantes Melo Júnior, 19 anos, e Viviane da Silva Afonso Arevaldo, 20, conseguiram bolsas de estudo em faculdades privadas. "Os alunos precisam valorizar essa prova porque ajuda demais", conta Juler.
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