12 de outubro de 2011

Equívocos em projeto fazem escola no Amapá 'ferver'



Caros e mal formulados, planos criam escola onde aula é mais curta porque o calor no verão passa dos 40 graus

11 de outubro de 2011 

Bruno Paes Manso / ENVIADO ESPECIAL / MACAPÁ - O Estado de S.Paulo
Depois de dez anos sem fazer uma escola nova, o governo do Amapá decidiu construir quatro novos prédios de uma vez em 2008. Um deles, no bairro Marco Zero, local cruzado pela linha do equador e atração turística da cidade, ajudaria a diminuir a falta de vagas nos bairros alagados e pobres do entorno. Os prédios começaram em setembro daquele ano. Hoje, apenas um deles está pronto, a um custo de R$ 4,5 milhões, duas vezes mais que uma escola em São Paulo.
Além da alta temperatura, faltam livros, cadeiras e elevadores nas escolas estaduais - Tiago Queiroz / AE
Tiago Queiroz / AE
Além da alta temperatura, faltam livros, cadeiras e elevadores nas escolas estaduais
Mas esse preço salgado não foi o maior problema. O defeito principal estava no projeto da Escola Estadual Nanci Nina Costa, que não levou em conta as altas temperaturas de Macapá, que fazem as salas de aulas ferverem. Alunos e professores convivem em classes onde a sensação térmica vai de 43 a 45 graus. O erro de projeto só foi descoberto quando os 2.200 alunos passaram a se amontoar e a passar mal com o calor.
“Quem fez o projeto foi a Secretaria de Infraestrutura e nós só executamos. Era preciso haver janelas cruzadas, que permitissem ao vento circular entre as classes. Também seria necessários equipamentos para climatização das salas, que não foram instalados. O pior é que as outras três escolas ainda não concluídas foram feitas com projetos iguais”, resume o construtor Ubiracildo Macedo, dono da Elos Engenharia, responsável pela obra.
Aulas mais curtas. A solução encontrada pelo diretor da escola, Kleber Martins, foi reduzir o tempo das aulas de 50 para 35 minutos, para diminuir o sofrimento com o calor. Os professores também dão aula nos pátios e corredores, o que resulta em imensa desordem. “O Paulo Freire já dizia que o professor pode dar aulas embaixo da sombra de uma árvore e é o que estamos tentando fazer. Mas fica difícil. Falta quadro-negro, mesa para professor, móveis para refeitório e biblioteca, elevador para cadeirantes, o que transforma a tarefa de ensinar e aprender muito complicada”, acrescenta.
O poço do elevador, projetado para atender os alunos com problema de locomoção, viraram depósitos. Quatro estudantes cadeirantes, ali matriculados, precisam ser carregados até as salas no piso superior. Não há estantes para os livros da biblioteca, nem mesas para o refeitório. Este ano, os alunos da escola não vão sequer participar dos testes nacionais de avaliação porque não houve tempo e condições de ensinar direito as matérias.
No inquérito da Operação Mãos Limpas, a pasta da Educação é apontada como um dos alvos preferenciais do esquema de desvio de recursos públicos. Gravações mostram negociações para supostos arranjos em licitação, feitas no próprio gabinete do ex-secretário da pasta, Adauto Bitencourt, preso em setembro do ano passado e depois libertado.
Nos rankings nacionais, o desperdício dos recursos públicos havia sido apontado como um dos problemas mais sérios do Amapá. Estudo comparativo das despesas públicas dos Estados, feito para o Tesouro, mostrou que o Amapá, o quarto Estado que mais investe proporcionalmente em áreas sociais, é o terceiro com pior desempenho no Brasil. “A corrupção é um câncer no Estado. E o dinheiro desviado afeta diretamente quem precisa desses serviços”, diz Aroldo Rabelo da Silva Filho, presidente do Sindicato dos Servidores em Educação do Amapá.

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