16 de dezembro de 2011

Migração da violência é tragédia nacional


O Globo

Executivo tem papel-chave na transferência de técnicas de segurança para o Nordeste


EDITORIAL
Publicado:
Comparar estatísticas de violência no Brasil com o número de vítimas em guerras e conflitos armados em outros pontos do mundo é artifício recorrente quando se quer chamar a atenção para a barbárie nossa de cada dia. Mas não é possível evitar essas comparações toda vez que surgem novos levantamentos sobre a séria crise de segurança pública por que passa o país pelo menos desde o início da década de 80.
Como sempre, os dados impressionam: nos últimos 30 anos, aproximadamente 1,1 milhão de pessoas foram assassinadas, algo como toda a população de São Gonçalo, ou dez vezes as vítimas nos mais de oito anos da Guerra do Iraque, e tanto quanto os mortos no meio século de conflitos no Oriente Médio entre Israel e palestinos. No ano passado, 137 foram mortos por dia, pouco mais que a lotação de um Boeing da Ponte Aérea. As informações, contidas no Mapa da Violência, elaborado pelo Instituto Sagari, são o atestado da derrota do Estado brasileiro, em todas as suas instâncias, diante desta selvageria. No período de três décadas, a população total cresceu 60%, enquanto os assassinatos, 258%. Num limite estatístico extremo, os brasileiros serão exterminados por eles próprios.
Não há apenas más notícias no levantamento — embora elas sejam abundantes. O mapa identifica avanços substanciais no Rio de Janeiro e São Paulo — no passado, sinônimos de violência sem controle, principalmente o estado fluminense, com a Grande São Paulo não ficando muito atrás.
Políticas de segurança adequadas, inclusive inspiradas em projetos bem-sucedidos aplicados no exterior, conseguiram o que parecia impossível: na última década, a taxa de homicídios no Rio de Janeiro chegou a 51 por grupo de 100 mil habitantes — dez é o índice máximo aceitável pela Organização Mundial da Saúde —, o segundo mais elevado do país, mas retrocedeu para 26,2, o 17º maior, nível da média nacional; e a taxa de São Paulo caiu para 13,9 depois de ter chegado aos 42,2. Era o quarto estado mais violento, passou para vigésimo quinto. UPPs no Rio e trabalho integrado entre polícias, ações sociais no ABCD, construção (e ocupação) de presídios, entre outras ações, têm sido essenciais em São Paulo.
A violência, porém, migra para o Nordeste. O despreparo dos aparatos de segurança pública na região torna o problema ainda mais sério. E não é só a previsível migração de criminosos de onde a repressão se tornou eficiente que preocupa. Também a chegada do crack com mais força em todo o país potencializa a crise de segurança nas cidades fora do Sul-Sudeste. Alagoas, com 66,8 mortes por 100 mil habitantes, lidera o ranking. Mas na Bahia, hoje sétimo estado mais violento, os assassinatos parecem aumentar sem controle, assim como em Pernambuco, quarto estado com mais homicídios.
A urgente tarefa do poder público é conter esta migração. É preciso replicar nos estados mais atingidos pela violência, com as devidas adaptações, as políticas seguidas com sucesso no Rio de Janeiro e São Paulo. Mais do que no passado, a participação ativa da União no combate à criminalidade é imprescindível. O papel do Executivo federal tem sido chave na pacificação do Rio, por exemplo. Falta, no mínimo, uma ação efetiva de coordenação desse Poder na transferência de técnicas para os setores de segurança do Nordeste. Senão, as comparações com guerras de fato se tornarão cada vez mais dramáticas.


 assunto em http://oglobo.globo.com/opiniao/migracao-da-violencia-tragedia-nacional-3456684#ixzz1ggbSPUDJ
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