17 de janeiro de 2012

BENJAMIN STEINBRUCH ,O desafio do ensino técnico




A deficiência na formação profissional foi percebida por vários setores industriais e de serviços
A questão do ensino técnico foi um tema bastante polêmico durante o regime militar brasileiro, de 1964 a 1985. Os governos da época sempre tentaram estimular a educação profissionalizante no nível médio.
Os ideólogos do governo sustentavam a tese de que a formação de mão de obra deveria ser direcionada basicamente para aumentar a produtividade da economia.
E argumentavam que a tradição cultural brasileira impunha preferencialmente estruturas curriculares de caráter humanístico, pouco voltadas à formação técnica e científica e nada conectadas às demandas do mercado de trabalho.
Pela perspectiva dos formuladores das políticas públicas naqueles anos, a educação não deveria ser um bem de consumo "supérfluo" voltado para a formação humanística e sim encarado como maté-
ria-prima básica de produção.
Havia nessa formulação um certo desprezo ao que se chamava de "tradição cultural brasileira", considerando-se que a cultura propriamente dita seria um complemento refinado ao lazer, e não um instrumento de trabalho.
Essa formulação fazia parte do contexto da ideologia tecnocrática dos governos militares, que relegava políticos e atividade política ao segundo plano no comando do país. Tudo isso desagradava às forças que se opunham ao regime e, em consequência, a ideia de incentivar o ensino técnico era combatida pelas oposições, porque seria uma forma de promover a alienação política na formação educacional.
Hoje, felizmente, vai longe o tempo em que o debate ideológico interferia nessa questão tão importante para o país, que é a formação dos profissionais para ingresso no mercado de trabalho.
E há boas notícias sobre a expansão do ensino nessa área. Em 2011, segundo estimativa da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação, o número de matrículas nos cursos técnicos já representou de 15% a 18% do total das inscrições no ensino médio, quase o dobro do percentual de cinco anos atrás. Isso significa um contingente de 1,5 milhão de alunos nesses cursos.
O número é relevante, mas muito aquém do verificado em países com educação voltada à formação profissionalizante, em que o ensino técnico costuma representar até 40% das matrículas no ensino médio.
Além da expansão do número de matrículas, o desafio desses cursos é a conexão com a realidade do mercado de trabalho, de forma a atender com oferta de mão de obra qualificada à demanda atual e também às necessidades futuras e estratégicas da política industrial brasileira.
Esse é um desafio enfrentado pelos institutos federais e estaduais de ensino técnico e pelas instituições gerenciadas pelo empresariado do setor industrial, como o Senai, o maior complexo de educação profissional e tecnológico da América Latina, que qualifica por ano 2,3 milhões de pessoas, sendo 150 mil de nível médio. Investir na formação educacional de crianças e jovens é um dos compromissos da indústria paulista e da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), entidade da qual tenho a honra de ser o primeiro vice-presidente.
Iniciativa de valor foi a criação do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), lançado pela presidente Dilma Rousseff em outubro, e cujas primeiras matrículas, de 67 mil jovens, foram feitas no ano passado.
Pelo que se prevê, a maioria das vagas do Pronatec será oferecida pelos institutos federais e por escolas do Sistema S (Senai, Sesi e Senac). As boas novidades do Pronatec são a oferta de cursos de qualificação gratuitos, incluindo alimentação, para pessoas em situação de vulnerabilidade social e a ampliação do financiamento público para cursos em escolas particulares.
A deficiência na formação profissional foi sentida por vários setores industriais e de serviços nos últimos anos, num momento em que o país, a despeito das crises internacionais, vive uma fase de pleno emprego.
A expansão do ensino técnico, para a formação de mão de obra demandada pela economia, portanto, deve ser comemorada. Ela é extremamente necessária, mas sem desprezo pela formação humanística, também fundamental para o desenvolvimento cultural do país.
BENJAMIN STEINBRUCH, 58, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças-feiras, a cada 14 dias, nesta coluna.

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