11 de fevereiro de 2012

PAUL KRUGMAN Dinheiro e moral


Os valores tradicionais não são tão importantes quanto os conservadores gostariam que nós acreditássemos
A desigualdade se tornou assunto de debate nacional. Entre os países ricos, os Estados Unidos se destacam como aquele no qual o status social e econômico tem maior probabilidade de ser transferido de geração a geração.
E isso tornou inevitável o que aconteceu a seguir: os conservadores subitamente começaram a nos dizer que a questão real não é de dinheiro, mas sim de ordem estritamente moral.
Mas será que a questão é realmente moral? Não: ela gira principalmente em torno de dinheiro.
É justo ressaltar que "Coming Apart: The Status of White America, 1960-2010", o livro de Charles Murray que embasa o ataque conservador, ilumina algumas tendências notáveis.
Entre os norte-americanos brancos com nível educacional de segundo grau ou inferior, o número de casamentos e a participação masculina na força de trabalho estão em queda, enquanto o número de crianças nascidas fora do casamento está crescendo.
Fica claro que a classe operária branca mudou para um comportamento que não parece bom. Mas a primeira pergunta a ser feita deveria ser: as coisas vão realmente tão mal no que tange aos valores?
Murray jamais menciona a queda no número de gestações na adolescência entre todos os grupos raciais, desde 1990, ou a queda de 60% no número de crimes violentos, da metade dos anos 90 até os dias de hoje.
No entanto, para os homens com nível educacional mais baixo, tudo vem sendo negativo. Ajustado pela inflação, o salário inicial de um homem com educação de segundo grau caiu em 23%, de 1973 para cá. Enquanto isso, os benefícios dos trabalhadores despencaram.
Em 1980, 65% dos formandos recentes no segundo grau empregados pelo setor privado contavam com planos de saúde oferecidos pelos empregadores; em 2009, essa proporção havia se reduzido a somente 29%.
Assim, nos tornamos uma sociedade na qual os homens com menor nível de educação encontram grande dificuldade em encontrar empregos com salários decentes e bons benefícios.
Mas ainda assim devemos nos surpreender por esses homens se inclinarem menos a entrar na força de trabalho ou se casarem, e concluir que a causa só pode ser algum misterioso colapso moral causado por progressistas entojados.
E Murray também nos informa que os casamentos na classe trabalhadora, quando acontecem, se tornaram menos felizes. Estranho? É preciso considerar que problemas de dinheiro em geral têm essa consequência.
Assim, deveríamos rejeitar os esforços para desviar o diálogo nacional da desigualdade cada vez mais alta para as supostas deficiências morais dos norte-americanos que estão sendo deixados para trás.
Os valores tradicionais não são tão importantes quanto os conservadores gostariam que acreditássemos -e, de qualquer forma, as mudanças sociais em curso na classe trabalhadora norte-americana são fundamentalmente consequência de uma alta acentuada na desigualdade, e não sua causa.
Tradução de PAULO MIGLIACCI

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