20 de março de 2012

NIZAN GUANAES: Kony 2012



O filme foi projetado para aproveitar ao máximo as ferramentas, a linguagem e o espírito do mundo digital
ESTE É um momento disruptivo da humanidade e dos negócios como poucos o foram. A comunicação é o principal vetor dessas mudanças, e é fácil de entender o motivo. Basta olhar para o celular na sua mão, o tablet na sua bolsa, o laptop no seu colo, o PC na sua mesa, a smart TV na sua sala.
Todos estamos na mira e somos usuários dessas armas de comunicação em massa 24/7.
Como ficaria a arquitetura se todos virassem arquitetos? Como ficaria a medicina se todos virassem médicos? Foi o que aconteceu com a comunicação: todos nós viramos comunicadores. E a comunicação ganhou força e velocidade com isso.
Mas se não temos dúvida de que vivemos uma nova era na comunicação, temos muitas dúvidas quando tentamos imaginar o seu futuro.
Mundos completamente diferentes estão se encontrando pela tecnologia. Um celular pode competir com um banco. Não existem mais divisas. O que antes levava décadas, hoje leva dias, minutos.
É preciso mais do que nunca estar aberto às novidades, aprender com os erros e os acertos dos outros. Só um burro não copia, é um idiota original.
Se o comercial de 30 segundos foi durante décadas o rei incontestável das campanhas de comunicação, hoje não há mais reinos nem reis, só um mundo ao mesmo tempo plano e complexo, onde as relações em rede, laterais, são cada vez mais centrais.
Para entender essa comunicação 2012 é preciso entender Kony 2012.
Como você provavelmente já viu, Kony 2012 é um filme de quase 30 minutos feito para a web por uma ONG americana com um desafio à audiência global: prender até o final de 2012, pela ação dos internautas que o estão assistindo, o ugandense Joseph Kony. É a justiça do clique, em escala global.
Kony encabeça a lista de procurados do Tribunal Penal Internacional. Ele é responsável pelo sequestro e morte de milhares de crianças que formam sua milícia e que há décadas aterroriza Uganda e países vizinhos. O filme diz que Kony só não está preso porque quase ninguém no mundo sabe quem ele é e o mal que ele faz. A missão do filme é justamente apresentá-lo ao mundo.
Missão cumprida.
Kony 2012 tornou-se o vídeo mais viral na (curtíssima) história das mídias sociais. Em seis dias, sua mensagem foi vista por mais de 100 milhões de pessoas ao redor do mundo, o que levaria meses e milhões de dólares numa campanha tradicional de marketing.
Como todo sucesso na web, Kony 2012 tornou-se instantaneamente alvo de controvérsia e crítica. O autor do filme foi inclusive preso andando nu e gritando pelas ruas de San Diego no final de semana passado. Mas se há quem discorde do filme e de seus realizadores, seu sucesso como produto de comunicação e ativismo social é inegável, um marco nas duas áreas nessa transição do mundo off-line para o mundo on-line.
Kony 2012 foi projetado para aproveitar ao máximo a linguagem, as ferramentas e o espírito do mundo digital. O filme exorta repetidas vezes o novo poder do público e inteligentemente exorta esse público a pressionar uma lista estratégica de grandes estrelas que têm milhões de seguidores em seus canais pessoais no Twitter, no Facebook, no Tumblr etc.
Em poucos dias, nomes como Justin Bieber e Oprah Winfrey receberam uma enxurrada de mensagens pedindo que falassem de Kony 2012. E falaram, transmitiram o vírus a seus milhões de seguidores, que retransmitiram a outros milhões, e assim segue até agora.
Campanhas muito bem-sucedidas de marcas, de produtos e suas causas nunca chegaram perto do que Kony 2012 alcançou tão rapidamente. E os muito lentos que me perdoem, mas velocidade hoje é fundamental. É preciso errar rápido para acertar rápido.
A Kodak, por exemplo, demorou a perceber que seu negócio não era fazer filmes, mas registrar momentos. Essa demora destruiu a empresa justamente no momento em que a fotografia explodiu no mundo pela via digital.
A propaganda correrá o mesmo risco se demorar a aprender os segredos dessa nova comunicação. Kony 2012 é uma grande lição. Já estamos aprendendo.
NIZAN GUANAES, publicitário e presidente do Grupo ABC, escreve às terças-feiras, a cada 14 dias, nesta coluna.

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