Em Acapulco, docentes se mobilizam contra gangues que ameaçam a população
02 de outubro de 2011
Uma mensagem foi enviada por telefone à secretaria de uma escola, uma pilha de documentos fotocopiados para outra e uma bandeira içada do lado de fora de uma terceira. A exigência é a mesma: os professores teriam de entregar até o dia 1.º a metade do seu salário. Caso contrário, suas vidas correm perigo.
A extorsão é uma indústria florescente no México e os casos triplicaram desde 2004. Para analistas, é uma consequência inesperada da estratégia adotada pelo governo na guerra às drogas: à medida que os grandes cartéis se desintegram, bandidos experientes em ameaças e violência vêm usando suas habilidade em novos empreendimentos.
Mas a ameaça contra os professores em Acapulco está chegando a um outro nível. Desde que começaram a aparecer, no mês passado, quando os estudantes retornaram às aulas após as férias de verão, centenas de escolas foram fechadas.
"Se você não pagar, morre", disse Alejandro Estrada, professor que participava de um protesto com milhares de educadores em Acapulco. O que as pessoas falam é que todo mundo tem de pagar por proteção. "Eles chegam toda semana e você paga porque nunca sabe", sussurrou uma vendedora de flores num mercado em Emiliano Zapata, uma região da cidade onde lojas com as portas baixadas e escolas fechadas com cadeado são provas do medo.
Sindicato. Mas os professores pertencem a um poderoso sindicato que consegue facilmente reunir um número muito grande de pessoas em protestos. E, durante o mês passado, as greves estenderam-se a escolas que não receberam nenhuma ameaça, mas fecharam por solidariedade ou medo. "Estamos aterrorizados", disse uma professora de desenho chamada Noemi. "Somos os alvos porque temos um salário um pouco mais consistente."
O aumento dos casos de extorsão foi colocado em foco no mês passado, quando suspeitos de trabalhar para o cartel Los Zetas dispararam contra um cassino em Monterrey, matando 52 pessoas. Segundo as autoridades, os proprietários do local rejeitaram pagar a taxa de proteção exigida pelo cartel.
Durante boa parte dos cinco anos que o presidente Felipe Calderón tem adotado a repressão contra os cartéis, o combate se concentrou nos líderes das gangues e na tentativa de desmembrar as grandes organizações em grupos menores. Mas, quando facções violentas são separadas dos chefões que sabem como levar a droga para os EUA, ou são afastadas das tradicionais rotas de circulação da droga, procuram novas ocupações, dizem os especialistas. E a extorsão é uma das menos arriscadas.
"Três ou quatro pistoleiros se autodenominam Zetas e passam a se dedicar à extorsão", explicou o especialista em segurança Guillermo Zepeda. Ele contou que, em áreas de Jalisco, seu Estado natal, os donos de lojas fecharam as portas para não pagar por proteção e vivem do dinheiro enviado por parentes nos EUA.
A extorsão estendeu-se a regiões do México relativamente distantes da guerra às drogas, segundo estudo de Eduardo Guerrero, analista da Lantia Consultores. "A extorsão é o melhor negócio depois do narcotráfico internacional", disse ele. "Se você é suficientemente violento, pode conseguir um bom rendimento regularmente." A extorsão "sempre recorre à intimidação". "E, como resultado, emprega mais violência que o tráfico."
Além disso, ao contrário dos crimes de cartel contra cartel, a violência agora alcança os cidadãos comuns. Esse envolvimento com civis inocentes pode rapidamente intensificar o medo da comunidade e essa é a razão pela qual algumas gangues, especialmente o poderoso cartel de Sinaloa, evitam a extorsão, por considerá-la ruim para os "negócios".
Alerta. A aversão popular à extorsão intensificou-se tanto que a gangue New People, em guerra com os Zetas, fez uma demonstração macabra para se distanciar dessa prática. Na terça-feira, deixou 35 corpos, supostamente de membros dos Zetas, numa importante avenida de Vera Cruz, com um cartaz dizendo: "População de Vera Cruz, não se deixe extorquir".
A triplicação dos casos de extorsão desde 2004 revela parte do problema. O grupo México Evalúa, que compila estatísticas criminais, estima que ao menos 80% dos casos não são comunicados e alguns Estados não se preocupam em investigá-los.
Acapulco, hoje uma das cidades mais perigosas do país, enfrenta uma dupla ameaça: ao mesmo tempo em que o combate aos cartéis e gangues menores provocam ciclos intermináveis de vingança, meros "valentões" aterrorizam as pessoas comuns. Os assassinatos envolvendo o crime organizado multiplicaram-se em quase oito vezes nos últimos dois anos e se elevaram bruscamente em 2010, depois de a Polícia Federal prender Édgar Valdez Villarreal, chefão de cartel nascido nos EUA e conhecido como "La Barbie", que fez de Acapulco a sua base. Entre janeiro e maio, o número desses crimes chegou a uma média de 78 ao mês.
Pressão. As autoridades procuraram não dar tanta importância aos fechamentos de escolas de Acapulco, que ficam nos bairros mais pobres da cidade. Mas, depois que cerca de 7 mil professores protestaram na quarta-feira, o governador de Guerrero, Ángel Aguirre, reuniu-se com os professores prometendo adotar medidas de segurança como aumento de patrulhas e instalação de alarmes e câmeras em cada escola.
Analistas questionam se as ameaças dos criminosos contra os educadores podem ser concretizadas. Muitas gangues evitam atacar um grupo tão poderoso politicamente como o sindicato dos professores. "Extorquir professores é perigoso, causa muita indignação", disse o especialista em segurança Raúl Benítez. Mas os professores acreditam nas ameaças.
Na escola de La Pátria, três bandidos apontaram armas contra os professores, roubaram seu dinheiro, documentos internos e um laptop de um educador que se identificou como Ricardo. A encarregada da folha de pagamento recebeu uma mensagem exigindo que fornecesse informações sobre os salários dos professores e depois deixou a cidade, contou Ricardo. "Podem ser apenas garotos carentes aproveitando-se da situação, mas estão espalhando o medo na população." / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
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