23 de novembro de 2012

OPINIÃO: Nota de colégio não reflete qualidade da educação entregue



Avaliação espelha o nível socioeconômico; líderes do ranking selecionam alunos por meio de provas ou pela renda familiar

23 de novembro de 2012 | 2h 18
PAULA LOUZANO* - O Estado de S.Paulo
Mais uma vez o MEC divulga a nota do Enem por escola. Ainda que desde 2011 essas notas venham acompanhadas das taxas de participação dos alunos e o Inep só divulgue a nota das escolas onde mais da metade dos alunos fez as provas, na prática o MEC está estimulando o ranqueamento de escolas com base em um indicador equivocado. 

A nota de uma escola no Enem não reflete a qualidade da educação entregue por ela. Como as pesquisas no Brasil e no mundo mostram há muito tempo, em uma avaliação em larga escala as notas das escolas refletem em grande parte o nível socioeconômico dos seus alunos. Portanto não faz sentido comparar escolas cuja origem social dos alunos seja muito distinta. 

As escolas privadas e as públicas que aparecem nos primeiros lugares no ranking estão lá porque selecionam seus alunos, seja pela renda, no caso das privadas, seja por algum processo seletivo, no caso das escolas públicas. Portanto a nota do Enem, divulgada dessa maneira, não está medindo a contribuição que a escola agrega, já que não separa a bagagem que o aluno trouxe de casa do trabalho realizado pela escola. Essa separação é fundamental para julgarmos se e quanto uma escola é melhor que a outra, como sugerem os rankings.

Além disso, o Enem tem mais um agravante: por ser uma prova voluntária, a média dos alunos que realizam a prova não reflete a totalidade dos estudantes matriculados na escola. Como esse fenômeno não é aleatório e o Inep não tem controle sobre quais alunos deixam de fazer as provas, temos uma amostra passível de manipulações. 

Dois exemplos refletem o quão pernicioso pode ser o ranqueamento que confunde a nota do Enem com a qualidade da educação de um estabelecimento de ensino. Em 2011, o secretário de Educação do Espírito Santo moveu uma campanha nas escolas estaduais para que todos os alunos das escolas públicas fizessem o Enem, pois ele achava que isso ampliaria as oportunidades de estudos dos alunos mais pobres de seu Estado cujas famílias valorizam menos a educação. Ao sair a divulgação do Enem, as escolas públicas capixabas figuravam entre as piores do Brasil. 

Qual o segredo? Ao estimular todos os alunos a participar do Enem, o secretário "viciou sua amostra para baixo", pois incluiu alunos mais "fracos". Por outro lado, uma escola privada de São Paulo percebeu que, ao criar uma "nova" escola com seus melhores alunos, poderia fazê-la subir no ranking do Enem. Foi, portanto, "viciando sua amostra para cima" - selecionando os melhores alunos de sua rede para fazer a prova do Enem que o Colégio (Integrado) Objetivo se tornou o número um no ranking do ano passado e manteve sua posição neste ano. E, com isso, assistimos perplexos ao marketing que essa rede faz de todas as suas escolas com base nessa "conquista". 
Assim, uma estratégia pedagogicamente relevante - estimular os alunos mais vulneráveis de uma rede pública a fazer o Enem- é punida e uma atitude questionável é premiada. A finalidade do Enem não é essa. O ranqueamento que é feito com base na divulgação das notas das escolas está produzindo incentivos perversos no sistema educacional brasileiro.
* PAULA LOUZANO, PROFESSORA DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA USP

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