6 de novembro de 2012

Recursos humanos para o desenvolvimento, artigo de Marcelo Neri, Fernanda De Negri, Paulo Nascimento e Divonzir Gussoi


 
Marcelo Côrtes Neri é presidente do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea); Fernanda De Negri, Paulo Meyer Nascimento, Divonzir Gusso são pesquisadores do Ipea. Artigo publicado no Valor Econômico de hoje (5).

Um dos principais ativos de um país são as pessoas e sua força de trabalho. A educação é o fator crucial para o desenvolvimento econômico e social.

Nos últimos anos o Brasil passou por um processo de crescimento com redução de desigualdades. A década inclusiva nos levou a novo patamar em termos de qualidade de vida, de renda e consumo per capita, mas também enseja novos desafios para o futuro. Um dos nossos maiores desafios está na formação de recursos humanos qualificados para um mercado de trabalho em expansão.

Temos uma situação diferente da chamada crise de desemprego brasileira que vigorou no período 1998 a 2003 e da situação europeia e americana atual. De todas as formas, é um problema que exige políticas de longo prazo. O tema da escassez de mão de obra qualificada é recorrente nos últimos anos. Outra questão relacionada é a melhoria dos indicadores de produtividade e competitividade. Para isso, a qualificação da mão de obra é de extrema relevância. O governo federal tem apostado em novos programas de qualificação como o Ciência sem Fronteiras e o Programa Nacional de Acesso Técnico e Emprego (Pronatec).

A fim de subsidiar o Plano Brasil Maior e discutir as questões relativas tanto a oferta quanto a demanda de pessoal qualificado no Brasil, o Ipea e a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) lançaram a Rede de Pesquisas sobre Formação e Mercado de Trabalho. O lançamento da Rede foi seguido por dois dias de seminário sobre os dilemas para a formação de recursos humanos de alto nível no País.

Contrariando algumas visões disseminadas, os estudos apresentados identificaram carência mais grave e generalizada de mão de obra na base da pirâmide e menos em áreas como as engenharias, um dos principais focos deste debate. O problema transparece mais em ocupações de nível técnico, fortalecendo a importância do Pronatec. Em carreiras de nível superior, os focos de escassez parecem estar circunscritos a habilitações específicas das engenharias (engenharia naval), certas profissões que têm sido mais demandadas nos últimos anos mas que formam pouca gente (geologia) e especialidades médicas (pediatria e obstetrícia). Outro foco de escassez passa pela dificuldade de se atrair profissionais qualificados para algumas regiões distantes ou mesmo dentro dos grandes centros. Por exemplo, Niterói e Belfort Roxo, ambas no Grande Rio, ocupam os extremos do ranking da relação médico por habitante nos 200 maiores municípios brasileiros.

Há também o desafio do desenvolvimento de competências específicas como o domínio de idiomas e cursos de informática que raramente são incorporados na agenda de políticas educacionais. Ou mesmo nas séries estatísticas utilizadas. A PME demonstra salto superior a 100% nos últimos oito anos na proporção de jovens de 15 a 17 anos que cursam ou que concluíram cursos não regulares.

Em muitos casos a deficiência não está apenas na oferta de formação básica ou técnica. Segundo os próprios jovens de 15 a 17 anos, dois terços dos fatores pelos quais não estão na escola regular está na falta de demanda como falta de interesse (40%) ou renda insuficiente (27%). No caso de cursos técnicos, a falta de demanda corresponde a 82% das razões alegadas. É preciso ouvir os jovens e informá-los sobre os potenciais retornos pecuniários prospectivos acerca das diversas escolhas educacionais.

De toda forma, é evidente que o País precisa ampliar o número de pessoas com cursos médios e superiores que alavanquem a aquisição de competências profissionais requeridas por níveis mais altos de produtividade e competitividade. A despeito das melhorias de fluxo na educação básica e da expansão de programas como Prouni e Fies, o Brasil ainda carece de mão de obra com melhor escolaridade: segundo publicação recente da OCDE, somente 41 a cada 100 brasileiros entre 25 e 64 anos dispõem de ensino médio completo, e apenas 11 detêm um título de nível superior, longe da média dos países ricos, onde 74% concluíram o ensino médio e 31% passaram por algum tipo de educação terciária.

Sem uma força de trabalho escolarizada, restringem-se as possibilidades de dinamizar e agregar valor à estrutura produtiva brasileira. Apesar da diversificação de nossa indústria, setores mais intensivos em tecnologia representam uma parcela ainda pequena do Produto Interno Bruto (PIB) e das exportações brasileiras. O crescimento da participação desses setores na economia é o norte do Plano Brasil Maior.

Por fim, o principal consenso que emergiu entre os pesquisadores é a importância da melhoria da qualidade da educação brasileira, em todos os níveis. Avaliações educacionais de larga escala mostram que apesar dos avanços, nossa educação básica ainda é de baixa qualidade e nosso ensino superior é muito heterogêneo. É preciso de bons engenheiros, médicos e programadores, como também de técnicos industriais, laboratoriais e de construção civil. Enfim, em todas as áreas tenhamos profissionais com os conhecimentos e as habilidades necessárias para o mundo do trabalho e para os desafios da sociedade do conhecimento. Essa é a principal rota a para ampliarmos a competitividade e a produtividade de nossa economia e para chegarmos ao desenvolvimento inclusivo e sustentável.

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