11 de maio de 2014

Exemplo do Uruguai na política sobre drogas

GLOBO - Últimas notícias by EDITORIAL  /  10/5/2014




Com a regulamentação da chamada “lei da maconha”, através de decreto assinado segunda-feira pelo presidente José “Pepe” Mujica, o Uruguai se inscreve entre os países que optam por novos e mais eficazes paradigmas na luta contra o narcotráfico e o consumo de drogas. Esse flagelo mundial desafia governos e se mostra renitentemente refratário à ortodoxia das políticas baseadas em ações policial-militares.
Ainda prevalente na maior parte das nações do planeta, essa orientação que privilegia o combate aos entorpecentes pelo viés criminal, não tem logrado obter grandes avanços; ao contrário, a ONU, por sua agência específica, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc), alerta que o consumo, suprido pelo tráfico (crime organizado), tem aumentado. Em números, chega-se a dramas como o denunciado ano passado, em Viena, pelo Unodc: as drogas ilícitas — sem controle e em geral comercializadas em ambientes onde predominam a violência decorrente da criminalidade e inexistentes (ou tíbios) cuidados com a saúde — matam mais de 500 pessoas por dia. Ou seja, a cada hora registram-se quase 21 óbitos em decorrência de alguma relação da vítima com substâncias psicotrópicas. Essa realidade não se muda com ideologias, teimosias sociológicas ou preconceitos, mas com ações capazes de lhe dar respostas efetivas. A opção do Uruguai o coloca à frente na luta contra o narcotráfico, o monopolizador meio de abastecimento de um mercado dominado pelo crime e por suas “leis”. E abre caminho para o país enfrentar a questão pelo viés da saúde pública, em vez de tratá-lo com programas centrados no aspecto criminal do problema, ineficazes, como está provado.
Ressalvadas especificidades de cada país, o Brasil precisa mirar no corajoso exemplo uruguaio de adotar nova e mais flexível abordagem para o problema. Aqui, certamente, a questão das drogas é mais complexa, pois nela se confundem aspectos que são, de fato, puramente criminais, como a existência de quadrilhas do crime organizado enraizadas em comunidades subjugadas pela violência, e outros de ordem social, como a fragilidade das políticas sanitárias públicas, essenciais para a adoção de programas de tratamento de usuários, imperativo de um novo paradigma da questão. Outra complicação reside no fato de o território brasileiro ser, ao mesmo tempo, grande mercado consumidor e exportador de drogas.
Não está na agenda brasileira a legalização da produção e consumo da maconha. Mas mudar o protocolo da guerra contra as drogas, com ações de saúde pública na ponta do consumo, e combate intransigente ao tráfico, é a melhor política, e isso não transformará o Brasil num narcoestado, argumento frequente de grupos interessados em manter o viés policial na abordagem da questão. Por certo, o Uruguai está longe disso, assim como nações que adotaram a descriminalização, como Portugal e Holanda, onde a criminalidade caiu e o consumo de drogas se mantém sob controle.

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