5 de setembro de 2014

Atacado, ex-reitor critica 'desmonte' da USP


UNIVERSIDADES EM CRISE

João Grandino Rodas critica planos do sucessor e se defende das acusações de que deixou universidade 'falida'

'Situação da Unesp e da Unicamp é bastante similar, mesmo que eu não tenha sido reitor lá', afirma ex-dirigente
FÁBIO TAKAHASHIDE SÃO PAULO
A USP tem passado por processo de desmonte nos últimos meses, afirma o ex-reitor João Grandino Rodas.
Em sua primeira entrevista após deixar o cargo, em janeiro, Rodas critica a ideia do atual reitor, Marco Antonio Zago, de adotar plano de demissões voluntárias para 10% dos funcionários e transferir o Hospital Universitário para o governo paulista.
Zago, que foi pró-reitor da administração Rodas, afirma que adotou as medidas devido à situação que encontrou, em que a folha de pagamento consome 105,6% do orçamento da USP. Procurado, ele preferiu não se manifestar.
A seguir, os principais trechos da entrevista, concedida à Folha por e-mail, em que rebate a crítica, feita por parte da universidade, de que ele é o causador da crise.
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Folha - O novo reitor diz que adotou cortes devido à expansão da folha de pagamento em sua gestão. O sr. concorda?
João Grandino Rodas - A USP, nos últimos anos, aumentou o número de alunos [20% em oito anos]. Entretanto, o percentual de imposto a ser recebido [do Estado] não mudou. Em tempos de vacas gordas, isso não se nota. Contudo, quando os recebimentos diminuem [queda no repasse proveniente do ICMS], é óbvio que o aumento de dispêndio exerce certa pressão.
Na gestão 2010-2013, não houve aumento sensível do número de funcionários [a alta foi de 8%]. Mas foi instituído por voto unânime do Conselho Universitário plano de carreira, pois uma universidade de nível tem de ter funcionários motivados [o plano permitiu aumento médio de 75% nos salários].
Quando sobrevém período financeiro crítico, é normal que tais mecanismos de aumento salarial sejam espaçados. Entretanto não se pode dizer, como a atual gestão vem fazendo, que a USP está "falida" e muito menos que o responsável sou eu.
Com reserva bilionária nos bancos [hoje em R$ 1,6 bilhão], como pode a USP estar "falida"? Ressalte-se que a situação do comprometimento orçamentário da Unesp e da Unicamp é bastante similar à da USP, mesmo que eu não tenha sido reitor lá [elas usam cerca de 95% com pessoal].
Quando assumi, havia R$ 3,6 bilhões de saldo em bancos. Manter indefinidamente as reservas contraria o seu próprio objetivo, pois o dinheiro não existe para perder valor e dar lucro aos bancos.
Qual sua opinião sobre o plano de demissões voluntárias?
Demanda altas somas de dinheiro, para "comprar" o pedido de demissão. Tenho dúvidas de que a USP possa gastar altas somas e não correr o risco de ações civis, para proteger o dinheiro público.
Por fim, se não for bem alinhavado, acorrerão ao PDV (plano de demissões voluntárias) funcionários mais aptos, que conseguirão lugares na iniciativa privada, com prejuízos para a USP.
Uma comissão nomeada pelo reitor concluiu que as causas do desequilíbrio financeiro foram as movimentações na carreira de funcionários, que não foram aprovadas pelo Conselho Universitário.
Não conheço o resultado da sindicância. Considero que deveriam ser abertas sindicâncias em todos os órgãos da USP, inclusive nas pró-reitorias e outras unidades, então dirigidas pelos atuais dirigentes da USP. Será que eles se portavam de acordo com o que hoje alardeiam?
O sr. é favorável à transferência do Hospital Universitário para a Secretaria da Saúde?
Sou contra o desmonte da USP, coisa que nenhuma das outras universidades paulistas fez, pois trará prejuízos indeléveis. Quanto aos hospitais, deve-se ter em mente que são hospitais-escola. Não tem cabimento entregar hospitais prontos, que no dia seguinte serão anunciados por políticos como grande feitos em prol de currais eleitorais. Será por acaso que a autorização para entrega ocorre às vésperas das eleições?
    5/9/2014
UNIVERSIDADES EM CRISE

Secretário de Alckmin diz que instituições vão ter mais repasses

Andrea Calabi contraria previsão das universidades e do próprio governador e avalia cenário como 'favorável'
Arrecadação do ICMS, principal fonte de receita da USP, vai aumentar R$ 2 bilhões, de acordo com ele
THAIS BILENKYNATÁLIA CANCIANARTUR RODRIGUESDE SÃO PAULOContrariando a previsão pessimista das universidades públicas paulistas, o secretário estadual da Fazenda, Andrea Calabi, disse à Folha que não cairá o valor repassado às instituições em 2014.
A afirmação também destoa da fala do governador Geraldo Alckmin, candidato à reeleição pelo PSDB.
O governador afirmou que a arrecadação estadual não crescerá enquanto a economia nacional mantiver o fraco desempenho atual.
Calabi disse que as universidades receberão R$ 287,4 milhões a mais do que previam, resultado, segundo ele, da previsão de crescimento da arrecadação do ICMS.
O imposto é a principal fonte de receita das universidades; se a arrecadação cai, caem os repasses.
"As últimas informações são favoráveis", disse ele, e o Estado arrecadará R$ 92 bilhões no ano, ante previsão anterior de R$ 90 bilhões.
O Cruesp, conselho de reitores da USP, Unicamp e Unesp, passou a trabalhar com uma previsão de arrecadação de R$ 89 bilhões, baseada nos repasses já feitos --até agosto, foram 4% inferiores ao esperado.
A se confirmar a projeção da Fazenda, as três universidades terão recebido ao final do ano R$ 8,804 bilhões. Isso equivale a 9,75% da receita resultante de ICMS.
Segundo dados divulgados pelo site da pasta, cerca de R$ 60 bilhões foram arrecadados em ICMS de janeiro a junho deste ano. Desse valor, aproximadamente R$ 4,04 bilhões foram repassados a USP, Unesp e Unicamp.
Na terça-feira (2), Alckmin dissera que "a crise é transitória porque estamos com o PIB negativo. Isso vai passar, e a hora que a economia crescer, o ICMS cresce". Calabi disse que as "arrecadações estão indo bem".
"Não tem queda [nos repasses]. Na verdade, isso é [reflexo de] como foi construído o orçamento das universidades", avaliou Calabi.
"O engano fundamental nessa discussão do Cruesp é que não é para jogar para fora [a causa do problema e dizer] que estamos fazendo o máximo possível, que dependemos da profundidade da crise da economia. É preciso olhar pra frente e fazer uma transformação importante."
Questionado se avaliava como positivas as medidas propostas pelo reitor da USP, Marco Antonio Zago, de contenção da crise, como demissões voluntárias, Calabi disse: "Me inclui fora dessa!".
O secretário observou que os repasses de ICMS à USP têm a mesma ordem de grandeza dos destinados à cidade de São Paulo, "com seus 12 milhões de habitantes". "É um valor muito expressivo."
Da porcentagem repassadas às universidades, a USP fica com 5% --R$ 4,5 bilhões neste ano, segundo a projeção da Fazenda. Até junho, a USP recebeu R$ 2,12 bilhões. À Unesp, foram repassados R$ 989 milhões no período. À Unicamp, R$ 927 milhões.

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