JORGE WERTHEIN O mais recente Relatório Unesco sobre ciência, divulgado recentemente, vem reforçar o argumento sobre a importância crucial da ciência e da tecnologia para o desenvolvimento dos países. Mostra que governos mundo afora, cientes disso, têm expandido o financiamento de pesquisas, e os países em desenvolvimento que progrediram mais rapidamente nos anos recentes são os que adotaram políticas para a promoção da ciência, da tecnologia e da inovação. O Brasil, que mereceu capítulo exclusivo no documento, figura ali como um dos novos atores que têm contribuído para criar um ambiente global mais competitivo nessas áreas.
Para se ter uma ideia do avanço do Brasil no campo científico-tecnológico, o gasto doméstico bruto em pesquisa e desenvolvimento (P&D) aumentou em 28% entre 2000 e 2008. O relatório elogia também a criação dos fundos setoriais, que injetaram novos recursos no financiamento de P&D a partir do final da década passada e início desta.
Outro destaque é a política educacional brasileira para a pós-graduação, responsável pelo aumento no número de doutorados finalizados anualmente. O impacto dos artigos científicos com origem no Brasil também aumentou. E a presença do país cresceu nos principais ramos da ciência. O relatório salienta ainda iniciativas científicas de peso, como o Projeto Genoma, e exemplos de sucesso em inovação, como a produção de aviões a jato da Embraer, as pesquisas no setor agropecuário da Embrapa e o Programa Brasileiro de Álcool (ProÁlcool), que estimulou o país a produzir os melhores carros flex do mundo.
Mas, como não poderia deixar de ser, a despeito dos inegáveis progressos, restam ao Brasil alguns desafios. O documento da Unesco indica três principais: intensificar a P&D empresarial para estimular a inovação e a competitividade, desenvolver e internacionalizar as melhores universidades brasileiras, e disseminar a excelência científica além dos grandes centros urbanos do país. Entre as barreiras para se vencer esses desafios, incluem-se a dificuldade de acesso ao capital (devido às altas taxas de juros), problemas de logística (um obstáculo às exportações) e a necessidade de se melhorar significativamente a qualidade da educação (com impacto na formação de pessoal qualificado para o mercado de trabalho).
No que diz respeito à educação formal na área de ciências, não restam dúvidas do papel-chave que ela representa para P&D. Alunos brasileiros têm apresentado resultados preocupantes nos exames do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, o Pisa, por exemplo. O que vem dando errado? Um dos entraves reside em metodologias de ensino ultrapassadas.
Como declarou recentemente, de forma muito oportuna, o economista-chefe do Centro de Políticas Sociais vinculado à Fundação Getulio Vargas, Marcelo Neri: "Se na década de 90 o desafio era colocar os jovens na escola, agora é promover uma revolução na educação." Para demonstrá-lo, Neri apresentou estudo segundo o qual 40% dos jovens entre 15 e 17 anos consultados apontam que não estudam pelo fato de a escola e as aulas serem pouco interessantes. Quando o foco são cursos profissionalizantes, e a faixa etária é dos 15 aos 29 anos, esse percentual sobe para 63,8%.
Ademais, a escola em geral e o ensino fundamental em particular - tanto público, sob comando de Estados e municípios, quanto privado - ainda parecem insuficientemente sensíveis à importância de se formarem novos cientistas. Contentam-se em ministrar o conteúdo que deverá ser útil para um futuro exame de admissão. Eis algo relativamente fácil de compreender. A própria classe docente origina-se de um sistema que não a preparou adequadamente para a realidade contemporânea, na qual ciência e tecnologia têm nova dimensão e relevância, o que exige recursos pedagógicos compatíveis. Esse mesmo sistema não parece estimular a carreira de professor de ciências. Seria muito positivo o incentivo, nos cursos de pedagogia de hoje, à formação dos mestres de ciências de amanhã.
Como muito apropriadamente afirmam os cientistas Carlos Henrique de Brito Cruz e Hernan Chaimovich, autores do capítulo sobre o Brasil do relatório da Unesco, além do interesse natural pelo conhecimento científico, outro bom motivo pelo qual recursos públicos devem financiar a P&D - e, portanto, a formação nessas áreas - está no fato de que, "quanto mais conhecimento uma sociedade alcançar valendo-se do método científico, mais rica ela se torna."
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JORGE WERTHEIN foi representante da Unesco no Brasil e é vice-presidente da Sangari Brasil. E-mail: jorge.werthein@sangari.com.
Para se ter uma ideia do avanço do Brasil no campo científico-tecnológico, o gasto doméstico bruto em pesquisa e desenvolvimento (P&D) aumentou em 28% entre 2000 e 2008. O relatório elogia também a criação dos fundos setoriais, que injetaram novos recursos no financiamento de P&D a partir do final da década passada e início desta.
Outro destaque é a política educacional brasileira para a pós-graduação, responsável pelo aumento no número de doutorados finalizados anualmente. O impacto dos artigos científicos com origem no Brasil também aumentou. E a presença do país cresceu nos principais ramos da ciência. O relatório salienta ainda iniciativas científicas de peso, como o Projeto Genoma, e exemplos de sucesso em inovação, como a produção de aviões a jato da Embraer, as pesquisas no setor agropecuário da Embrapa e o Programa Brasileiro de Álcool (ProÁlcool), que estimulou o país a produzir os melhores carros flex do mundo.
Mas, como não poderia deixar de ser, a despeito dos inegáveis progressos, restam ao Brasil alguns desafios. O documento da Unesco indica três principais: intensificar a P&D empresarial para estimular a inovação e a competitividade, desenvolver e internacionalizar as melhores universidades brasileiras, e disseminar a excelência científica além dos grandes centros urbanos do país. Entre as barreiras para se vencer esses desafios, incluem-se a dificuldade de acesso ao capital (devido às altas taxas de juros), problemas de logística (um obstáculo às exportações) e a necessidade de se melhorar significativamente a qualidade da educação (com impacto na formação de pessoal qualificado para o mercado de trabalho).
No que diz respeito à educação formal na área de ciências, não restam dúvidas do papel-chave que ela representa para P&D. Alunos brasileiros têm apresentado resultados preocupantes nos exames do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, o Pisa, por exemplo. O que vem dando errado? Um dos entraves reside em metodologias de ensino ultrapassadas.
Como declarou recentemente, de forma muito oportuna, o economista-chefe do Centro de Políticas Sociais vinculado à Fundação Getulio Vargas, Marcelo Neri: "Se na década de 90 o desafio era colocar os jovens na escola, agora é promover uma revolução na educação." Para demonstrá-lo, Neri apresentou estudo segundo o qual 40% dos jovens entre 15 e 17 anos consultados apontam que não estudam pelo fato de a escola e as aulas serem pouco interessantes. Quando o foco são cursos profissionalizantes, e a faixa etária é dos 15 aos 29 anos, esse percentual sobe para 63,8%.
Ademais, a escola em geral e o ensino fundamental em particular - tanto público, sob comando de Estados e municípios, quanto privado - ainda parecem insuficientemente sensíveis à importância de se formarem novos cientistas. Contentam-se em ministrar o conteúdo que deverá ser útil para um futuro exame de admissão. Eis algo relativamente fácil de compreender. A própria classe docente origina-se de um sistema que não a preparou adequadamente para a realidade contemporânea, na qual ciência e tecnologia têm nova dimensão e relevância, o que exige recursos pedagógicos compatíveis. Esse mesmo sistema não parece estimular a carreira de professor de ciências. Seria muito positivo o incentivo, nos cursos de pedagogia de hoje, à formação dos mestres de ciências de amanhã.
Como muito apropriadamente afirmam os cientistas Carlos Henrique de Brito Cruz e Hernan Chaimovich, autores do capítulo sobre o Brasil do relatório da Unesco, além do interesse natural pelo conhecimento científico, outro bom motivo pelo qual recursos públicos devem financiar a P&D - e, portanto, a formação nessas áreas - está no fato de que, "quanto mais conhecimento uma sociedade alcançar valendo-se do método científico, mais rica ela se torna."
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JORGE WERTHEIN foi representante da Unesco no Brasil e é vice-presidente da Sangari Brasil. E-mail: jorge.werthein@sangari.com.
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