26 de dezembro de 2010
Educação e Ciências | Revista Época |
O grande desafio é valorizar os professores
Ilona Becskeházy
O Brasil termina otimista a primeira década do século XXI. Temos a sensação de que estamos nos preparando para finalmente alcançar o futuro brilhante com que sonhamos há tanto tempo. Um futuro parecido com o presente das nações mais desenvolvidas. Nações que colocaram o bem comum à frente dos interesses individuais e a construção do futuro à frente do desfrute do presente. Sociedades que fizeram escolhas que se refletiram no seu desenvolvimento, podendo oferecer a seu povo um padrão de vida confortável, baseado não em consumismo, mas em serviços públicos de qualidade que permitem aos cidadãos viver em paz com seus negócios, empregos e famílias.
Parece que as sementes plantadas nos últimos anos começaram a brotar. Seremos capazes de nutri-las para podermos aproveitar seus frutos?
A resposta a essa pergunta depende, sem dúvida, da capacidade de acelerarmos o desenvolvimento da educação formal de nosso povo. Começamos com um atraso gigantesco em relação aos países desenvolvidos, que, de uma maneira geral, começaram a colocar suas crianças em massa na escola desde o século XIX, enquanto nós ainda escravizávamos muitas das nossas.
A boa notícia é que podemos trilhar pelo menos parte do caminho desses países. Cinco linhas de políticas públicas em educação, que são consenso internacional, foram adotadas pela Fundação Lemann como seus temas estratégicos desde 2006. Essas políticas têm sido exaustivamente estudadas pelo Programa de Promoção da Reforma Educacional na América Latina e Caribe (Preal) e foram recentemente validadas pelos achados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em inglês).
A primeira delas é a existência de um currículo nacional ambicioso sobre o qual possam ser estruturados os cursos de formação de professores, as suas avaliações de desempenho, as aferições de proficiência dos alunos e o acompanhamento da instrução pelas famílias. Interessa ao Brasil, tanto do ponto de vista social quanto econômico, que subgrupos tão diversos quanto os índios da Amazônia, os quilombolas da Bahia e os filhos da classe média alta do Rio de Janeiro saibam resolver uma equação de segundo grau no fim da 7a série ou compreender as complexidades dos personagens de Machado de Assis no início do ensino médio. Currículo desafiante é a base para desenvolver a capacidade de raciocínio matemático, de argumentação verbal e outras habilidades essenciais para viver bem no século XXI.
A segunda, que complementa a primeira, é a adoção de sistemas de avaliações em todos os níveis, que cheguem até a sala de aula e possam incutir nos professores a capacidade de aferir diariamente se o conteúdo apresentado realmente está sendo dominado por todos os alunos. Avaliar com competência é essencial para aferir se o direito de aprender dos alunos está sendo atendido.
A terceira é dotar as escolas de todo o apoio operacional e técnico necessário para cumprir sua missão de educar as futuras gerações. A contrapartida desse apoio é que as escolas sejam responsáveis por seus resultados e cobradas pelo aprendizado de todos os seus alunos. Apenas uma ínfima parte dos secretários municipais brasileiros tem controle sobre suas despesas e agora é comum que as escolas sejam responsabilizadas pelas contas de água e luz, mas ainda sem poder escolher seu quadro de professores. O poder discricionário da ordenação de despesas e de pessoal deve estar nas mesmas mãos do poder pedagógico, seja ele concentrado nas secretarias ou nas escolas. A combinação atual de poder político com o de controle dos recursos da educação claramente não funciona.
A quarta é a mais fácil de explicar e a mais difícil de implementar: a valorização dos profissionais da educação. Não se pode falar em valorizar nenhum profissional sem falar em aumento do nível de exigência para entrar e permanecer em uma carreira. Os professores não são exceção. Aumento de salário, extensão da idade para se aposentar, aprofundamento do treinamento e da supervisão, rigidez das avaliações de desempenho são características de uma profissão valorizada. O simples aumento de salário e do tempo fora da sala de aula apenas aumenta os custos de um processo de melhoria da qualidade que mal começou.
Por fim, temos a necessidade de aumentar os investimentos nas atividades de instrução. Investimento nos professores, claro, mas também nos materiais didáticos, nos acompanhamentos pedagógicos, nas aulas de reforço e de enriquecimento curricular, nos serviços de apoio à educação. Quanto mais gastamos longe da sala de aula, mais perdemos tempo e dinheiro, sem melhorar o capital humano de que precisamos para ser uma grande nação.
É alentador ver que o novo Plano Nacional de Educação, recentemente enviado ao Congresso pelo governo federal - se não modificado em sua essência -, aponta na mesma direção dessas políticas e contempla de formas variadas o que está proposto acima. Além disso, não podemos desprezar as contribuições que o setor privado e a tecnologia podem dar para a implementação dessas políticas. Assim, parece que podemos sonhar com um país mais educado e desenvolvido na próxima década.
No entanto, para recuperarmos este século de atraso educacional, é preciso aumentar a velocidade das conquistas que obtivemos na última década. Nosso futuro promissor depende de materializarmos essas intenções com coragem para quebrar paradigmas, com humildade para fazermos arranjos políticos em torno do aprendizado, com audácia para sonharmos alto e com pragmatismo para não perdermos mais tempo.
O Brasil termina otimista a primeira década do século XXI. Temos a sensação de que estamos nos preparando para finalmente alcançar o futuro brilhante com que sonhamos há tanto tempo. Um futuro parecido com o presente das nações mais desenvolvidas. Nações que colocaram o bem comum à frente dos interesses individuais e a construção do futuro à frente do desfrute do presente. Sociedades que fizeram escolhas que se refletiram no seu desenvolvimento, podendo oferecer a seu povo um padrão de vida confortável, baseado não em consumismo, mas em serviços públicos de qualidade que permitem aos cidadãos viver em paz com seus negócios, empregos e famílias.
Parece que as sementes plantadas nos últimos anos começaram a brotar. Seremos capazes de nutri-las para podermos aproveitar seus frutos?
A resposta a essa pergunta depende, sem dúvida, da capacidade de acelerarmos o desenvolvimento da educação formal de nosso povo. Começamos com um atraso gigantesco em relação aos países desenvolvidos, que, de uma maneira geral, começaram a colocar suas crianças em massa na escola desde o século XIX, enquanto nós ainda escravizávamos muitas das nossas.
A boa notícia é que podemos trilhar pelo menos parte do caminho desses países. Cinco linhas de políticas públicas em educação, que são consenso internacional, foram adotadas pela Fundação Lemann como seus temas estratégicos desde 2006. Essas políticas têm sido exaustivamente estudadas pelo Programa de Promoção da Reforma Educacional na América Latina e Caribe (Preal) e foram recentemente validadas pelos achados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em inglês).
A primeira delas é a existência de um currículo nacional ambicioso sobre o qual possam ser estruturados os cursos de formação de professores, as suas avaliações de desempenho, as aferições de proficiência dos alunos e o acompanhamento da instrução pelas famílias. Interessa ao Brasil, tanto do ponto de vista social quanto econômico, que subgrupos tão diversos quanto os índios da Amazônia, os quilombolas da Bahia e os filhos da classe média alta do Rio de Janeiro saibam resolver uma equação de segundo grau no fim da 7a série ou compreender as complexidades dos personagens de Machado de Assis no início do ensino médio. Currículo desafiante é a base para desenvolver a capacidade de raciocínio matemático, de argumentação verbal e outras habilidades essenciais para viver bem no século XXI.
A segunda, que complementa a primeira, é a adoção de sistemas de avaliações em todos os níveis, que cheguem até a sala de aula e possam incutir nos professores a capacidade de aferir diariamente se o conteúdo apresentado realmente está sendo dominado por todos os alunos. Avaliar com competência é essencial para aferir se o direito de aprender dos alunos está sendo atendido.
A terceira é dotar as escolas de todo o apoio operacional e técnico necessário para cumprir sua missão de educar as futuras gerações. A contrapartida desse apoio é que as escolas sejam responsáveis por seus resultados e cobradas pelo aprendizado de todos os seus alunos. Apenas uma ínfima parte dos secretários municipais brasileiros tem controle sobre suas despesas e agora é comum que as escolas sejam responsabilizadas pelas contas de água e luz, mas ainda sem poder escolher seu quadro de professores. O poder discricionário da ordenação de despesas e de pessoal deve estar nas mesmas mãos do poder pedagógico, seja ele concentrado nas secretarias ou nas escolas. A combinação atual de poder político com o de controle dos recursos da educação claramente não funciona.
A quarta é a mais fácil de explicar e a mais difícil de implementar: a valorização dos profissionais da educação. Não se pode falar em valorizar nenhum profissional sem falar em aumento do nível de exigência para entrar e permanecer em uma carreira. Os professores não são exceção. Aumento de salário, extensão da idade para se aposentar, aprofundamento do treinamento e da supervisão, rigidez das avaliações de desempenho são características de uma profissão valorizada. O simples aumento de salário e do tempo fora da sala de aula apenas aumenta os custos de um processo de melhoria da qualidade que mal começou.
Por fim, temos a necessidade de aumentar os investimentos nas atividades de instrução. Investimento nos professores, claro, mas também nos materiais didáticos, nos acompanhamentos pedagógicos, nas aulas de reforço e de enriquecimento curricular, nos serviços de apoio à educação. Quanto mais gastamos longe da sala de aula, mais perdemos tempo e dinheiro, sem melhorar o capital humano de que precisamos para ser uma grande nação.
É alentador ver que o novo Plano Nacional de Educação, recentemente enviado ao Congresso pelo governo federal - se não modificado em sua essência -, aponta na mesma direção dessas políticas e contempla de formas variadas o que está proposto acima. Além disso, não podemos desprezar as contribuições que o setor privado e a tecnologia podem dar para a implementação dessas políticas. Assim, parece que podemos sonhar com um país mais educado e desenvolvido na próxima década.
No entanto, para recuperarmos este século de atraso educacional, é preciso aumentar a velocidade das conquistas que obtivemos na última década. Nosso futuro promissor depende de materializarmos essas intenções com coragem para quebrar paradigmas, com humildade para fazermos arranjos políticos em torno do aprendizado, com audácia para sonharmos alto e com pragmatismo para não perdermos mais tempo.
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