30 de julho de 2011

Corrida para lugar nenhum: Vicki Abeles


31 de julho de 2011
Educação e Ciências | Revista Época | Sociedade | BR
 Vicki Abeles: "Temos uma ideia limitada do sucesso"

Tomais Rangel 


A diretora americana condena a competitividade nas escolas e diz que boa colocação em rankings não é sinônimo de educação de qualidade
Camila Guimarães
Vicki Abeles

Quem é

Mãe de duas adolescentes, é advogada, mas largou a carreira executiva para virar documentarista
O que fez O documentário Race to nowhere (Corrida para lugar nenhum), que virou sensação nos EUA e gerou uma onda de discussões sobre os limites da competitividade
De origem simples, a americana Vicki Abeles aprendeu, logo cedo, que só conseguiria sucesso na vida se estudasse muito. Chegou lá depois de bastante esforço. Formou-se em Direito e fez carreira como executiva de finanças. Quis que suas duas filhas seguissem o mesmo caminho, mas percebeu da pior maneira possível que havia algo errado. Sob pressão da escola por boas notas, sua caçula adoeceu. Vicki viu, então, que havia algo de errado na cultura competitiva imposta pelas escolas americanas. Largou o trabalho para se dedicar a um documentário que mostra os efeitos negativos dessa cultura nas crianças. "Criamos uma geração de jovens doentes e sem inspirações", diz ela.
ÉPOCA - A senhora é uma mãe preocupada com a educação dos filhos. Por que resolveu criticar as escolas mais rigorosas, com melhores resultados?
Vicki Abeles - Tudo começou com uma preocupação gradual com a alta demanda da escola de minha filha que cursava a 7a série. Em uma reunião na escola, percebi que era um assunto que preocupava também outros pais. Quando cheguei em casa, às 11 da noite, encontrei minha filha ainda acordada, fazendo lição de casa. Mas a gota d'água veio com o diagnóstico de depressão. Ela teve diversas doenças por causa disso. Resolvi, então, pegar uma câmera e sair gravando histórias iguais à dela.
ÉPOCA - Qual é sua ideia de sucesso para suas filhas?
Abeles - Espero que cresçam felizes, confiantes, saudáveis, curiosas, criativas e conectadas. Espero que elas encontrem suas paixões e maneiras de fazer do mundo um lugar melhor. Especialmente, espero que elas tenham habilidades sociais e emocionais para estabelecer relações positivas com a família e os amigos.
ÉPOCA - Estudar com afinco não é importante? Abeles - Temos uma visão limitada do que é ter sucesso e do que é educação de boa qualidade. Somos conduzidos pelo medo de que nossas crianças não sejam capazes de competir globalmente. E nossa resposta para isso tem sido definir de forma limitada o que é ser um jovem de sucesso: ter boas notas e bom desempenho em rankings.
ÉPOCA - Mas a competitividade das escolas não melhorou a educação nos EUA?
Abeles - Não acredito nisso. O que mudou foi o foco do ensino. Ensinar agora é preparar para fazer prova. Não temos mais uma base curricular diversificada. Artes e educação física foram reduzidas ou eliminadas. E isso não funciona. Ainda temos falhas de aprendizado. A qualidade do aluno que chega à universidade é ruim e a evasão alta. Temos de fugir do modelo baseado em alto desempenho em avaliações e dar aos professores a chance de aplicar um currículo e provas que funcionem para as crianças.
ÉPOCA - Você acha que os pais confundem boa educação com ensino rigoroso?
Abeles - É fácil culpar os pais ou os professores, mas a verdade é que criamos um sistema que desvia a atenção do que é realmente importante. Queremos desenvolvimento acadêmico, é claro, mas também social, emocional e criativo. Acho que devemos lembrar que há outras habilidades na vida, inclusive cometer erros. Então deveríamos nos perguntar se ficar acordado durante horas à noite fazendo lição de casa, ou contratar um exército de professores particulares, vai ajudar em alguma coisa. u

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