24 de janeiro de 2012
Veja mais | Folha de S. Paulo | Vladimir Safatle | BR
É consenso entre os brasileiros que os investimentos em educação, ciência e tecnologia são fundamentais para a realização das aspirações geopolíticas brasileiras.
Nesse sentido, o governo sofre cada vez mais pressão para aumentar seus gastos com o financiamento de pesquisas universitárias.
No entanto algo de sintomático acontece na definição das prioridades de pesquisa das agências de fomento como CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e outras.
De fato, todas elas sustentam a tradição brasileira de não negligenciar nenhum setor do conhecimento, seja nas áreas de humanas, exatas ou biológicas. Esta é uma tradição louvável e importante. Mas, quando é questão de definir quais são os tópicos que, do ponto de vista governamental, devem receber prioritariamente investimentos, tudo se passa como se a área de humanas pudesse ser soberanamente negligenciada.
O CNPq, por exemplo, tem um interessante programa de financiamento de bolsas de doutorado e mestrado no exterior chamado "ciência sem fronteiras". Entre outros, um de seus objetivos é o de : "investir na formação de pessoal altamente qualificado nas competências e habilidades necessárias para o avanço da sociedade do conhecimento". Um bom objetivo que pressupõe a amplitude necessária para o país levar em conta
suas múltiplas necessidades.
Porém, quando nos voltamos para as áreas prioritárias, não encontramos nada
referente às ditas humanidades. Seriam elas menos relevantes para o desenvolvimento nacional?
Quem em sã consciência diria que o estudo sobre as causas e ações possíveis contra a violência urbana é menos prioritário do que o estudo da biotecnologia?
Ou que a reflexão sobre a natureza da noção de "sofrimento psíquico" com seus modelos de intervenção clínica é menos prioritária que pesquisas sobre fármacos?
Ou ainda que a pesquisa sobre o impacto da publicidade em nossas crianças ou sobre as violações dos direitos
humanos na ditadura militar não tem a mesma importância que estudos sobre biodiversidade e bioprospecção? No
entanto nenhum dos primeiros tópicos foi contemplado como prioridade.
Por trás disso, encontramos a crença bizarra de que as prioridades com impacto mais direto no desenvolvimento industrial são as verdadeiras prioridades. Melhor seria olhar para as limitações da vida social brasileira. Isso faria mais justiça às contribuições que as humanidades podem dar.
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