O ano de 2012 ficou marcado pelo crescimento da pressão da opinião pública para que os adolescentes com idade entre 16 e 18 anospossam ser criminalizados. Cleomar Manhas, doutora em educação e assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), de Brasília, defende que, em 2013, a prioridade das políticas sociais seja a valorização dos adolescentes que estejamem situação de risco.
Cleomar Manhas
Em 2013 queremos que os adolescentes tenham visibilidade e sejam contemplados nas políticas públicas e não criminalizados como estão hoje, com tantas propostas de retirada de direitos, direcionadas a esta parcela da sociedade, que, de acordo com a Constituição Federal, tem prioridade absoluta com relação à ação do Estado. Vejamos o que diz o artigo 227: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".
Ao chegarmos a mais um fim de ano, é comum renovarmos nossas esperanças e planos para o ano vindouro. Isso em âmbito pessoal. No entanto, quando atuamos para que as políticas públicas se desenvolvam tendo como parâmetro a realização de direitos humanos, renovamos esperanças coletivas relacionadas às políticas sociais.
Em momentos difíceis há sempre "bodes expiatórios" escolhidos para justificarem as tensões. A crise do momento, capitaneada por São Paulo, diz respeito à segurança pública. Aliás, não se pode dizer que é a do momento, visto que desde o advento do crescimento exponencial das grandes cidades, ainda na década de 1980, o tema está em questão. E agora, com uma novidade para os brasileiros, ela não se restringe aos tradicionais centros, tais como São Paulo e Rio de Janeiro. A violência acompanhou a tendência de descentralização dos polos de desenvolvimento econômico e está em lugares ainda não acostumados à sua presença. E os "bodes expiatórios" são os adolescentes, para os quais há vários projetos em tramitação no Congresso Nacional solicitando a redução da idade penal.
O Mapa da violência de crianças e adolescentes 2012, pesquisa realizada pela Flacso, sob a responsabilidade do professor Júlio Jacobo Waiselfisz, apresentou dados alarmantes acerca da violência sofrida por crianças e adolescentes na faixa etária compreendida entre 0 e 19 anos. O Brasil ocupa o 4º lugar, em um conjunto de 99 países, com os maiores índices de homicídios nesta faixa etária, com crescimento de 346% entre 1980 e 2010, sendo os adolescentes entre 14 e 18 anos as maiores vítimas.
A partir desta pesquisa podemos inferir que os adolescentes são parcela da população fortemente vitimada pela violência, especialmente, homicídios, com estatísticas preocupantes e em total confronto com os princípios de direitos humanos. No entanto, o que vemos, tanto na mídia, quanto no Parlamento e em parte da sociedade, é a criminalização desta parcela da população, em vez de estarem refletindo sobre esses números, que demonstram uma verdadeira epidemia.
Outro aspecto relevante diz respeito à educação. Apesar de o acesso à educação fundamental estar praticamente universalizado, no percurso entre esta etapa e o ensino médio, a educação pública vai perdendo espaço. Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2011, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que a quantidade de adolescentes de 15 a 17 anos longe dos bancos escolares aumentou. Em 2009, 1,47 milhão de brasileiros nessa faixa etária não estudavam. Eles representavam 14,8% dessa população. Em 2011, o número de excluídos subiu para 1,72 milhão (16,3% dos 10,5 milhões de jovens).
De acordo com estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) acerca do Plano Nacional de Educação, que está em votação no Congresso Nacional e guiará a política nos próximos 10 anos, a faixa etária entre 15 e 17 anos será o maior desafio para a universalização da educação, visto o grande número de excluídos do sistema. E o desafio, ainda de acordo com o estudo, não diz respeito apenas à ampliação de vagas, mas também à garantia de permanência e progressão dos estudantes ao longo do ensino fundamental, de modo que ingressem, a partir dos 15 anos, no ensino médio e concluam a educação básica.
Os motivos de termos expressivo número de adolescentes fora da escola são vários e vão desde a falta de qualidade da educação, passando por vulnerabilidades, tais como o trabalho infantil, gravidez na adolescência, falta de transporte escolar e falta de acessibilidade para adolescentes com deficiência, entre outros, que, em comum, têm o fato de serem passíveis de resolução por meio de políticas públicas assertivas e integradas.
Muito se fala da necessidade de integração de políticas, mas pouco se faz, pois cada órgão público com seus gestores está sempre em busca da autoria e do protagonismo e não consegue operar, de fato, em parceria. Porém, para os adolescentes é urgente que se ofereça um conjunto de políticas articuladas que incluam educação, saúde, cultura, Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), segurança pública, entre outras que atuem de maneira sistematizada. Portanto, o que precisamos é que de fato elas se materializem em políticas que realizem plenamente os direitos humanos.
Cleomar Manhas é doutora em educação e assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), de Brasília
Correio Brasiliense, 29/12/2012
Cleomar Manhas
Em 2013 queremos que os adolescentes tenham visibilidade e sejam contemplados nas políticas públicas e não criminalizados como estão hoje, com tantas propostas de retirada de direitos, direcionadas a esta parcela da sociedade, que, de acordo com a Constituição Federal, tem prioridade absoluta com relação à ação do Estado. Vejamos o que diz o artigo 227: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".
Ao chegarmos a mais um fim de ano, é comum renovarmos nossas esperanças e planos para o ano vindouro. Isso em âmbito pessoal. No entanto, quando atuamos para que as políticas públicas se desenvolvam tendo como parâmetro a realização de direitos humanos, renovamos esperanças coletivas relacionadas às políticas sociais.
Em momentos difíceis há sempre "bodes expiatórios" escolhidos para justificarem as tensões. A crise do momento, capitaneada por São Paulo, diz respeito à segurança pública. Aliás, não se pode dizer que é a do momento, visto que desde o advento do crescimento exponencial das grandes cidades, ainda na década de 1980, o tema está em questão. E agora, com uma novidade para os brasileiros, ela não se restringe aos tradicionais centros, tais como São Paulo e Rio de Janeiro. A violência acompanhou a tendência de descentralização dos polos de desenvolvimento econômico e está em lugares ainda não acostumados à sua presença. E os "bodes expiatórios" são os adolescentes, para os quais há vários projetos em tramitação no Congresso Nacional solicitando a redução da idade penal.
O Mapa da violência de crianças e adolescentes 2012, pesquisa realizada pela Flacso, sob a responsabilidade do professor Júlio Jacobo Waiselfisz, apresentou dados alarmantes acerca da violência sofrida por crianças e adolescentes na faixa etária compreendida entre 0 e 19 anos. O Brasil ocupa o 4º lugar, em um conjunto de 99 países, com os maiores índices de homicídios nesta faixa etária, com crescimento de 346% entre 1980 e 2010, sendo os adolescentes entre 14 e 18 anos as maiores vítimas.
A partir desta pesquisa podemos inferir que os adolescentes são parcela da população fortemente vitimada pela violência, especialmente, homicídios, com estatísticas preocupantes e em total confronto com os princípios de direitos humanos. No entanto, o que vemos, tanto na mídia, quanto no Parlamento e em parte da sociedade, é a criminalização desta parcela da população, em vez de estarem refletindo sobre esses números, que demonstram uma verdadeira epidemia.
Outro aspecto relevante diz respeito à educação. Apesar de o acesso à educação fundamental estar praticamente universalizado, no percurso entre esta etapa e o ensino médio, a educação pública vai perdendo espaço. Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2011, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que a quantidade de adolescentes de 15 a 17 anos longe dos bancos escolares aumentou. Em 2009, 1,47 milhão de brasileiros nessa faixa etária não estudavam. Eles representavam 14,8% dessa população. Em 2011, o número de excluídos subiu para 1,72 milhão (16,3% dos 10,5 milhões de jovens).
De acordo com estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) acerca do Plano Nacional de Educação, que está em votação no Congresso Nacional e guiará a política nos próximos 10 anos, a faixa etária entre 15 e 17 anos será o maior desafio para a universalização da educação, visto o grande número de excluídos do sistema. E o desafio, ainda de acordo com o estudo, não diz respeito apenas à ampliação de vagas, mas também à garantia de permanência e progressão dos estudantes ao longo do ensino fundamental, de modo que ingressem, a partir dos 15 anos, no ensino médio e concluam a educação básica.
Os motivos de termos expressivo número de adolescentes fora da escola são vários e vão desde a falta de qualidade da educação, passando por vulnerabilidades, tais como o trabalho infantil, gravidez na adolescência, falta de transporte escolar e falta de acessibilidade para adolescentes com deficiência, entre outros, que, em comum, têm o fato de serem passíveis de resolução por meio de políticas públicas assertivas e integradas.
Muito se fala da necessidade de integração de políticas, mas pouco se faz, pois cada órgão público com seus gestores está sempre em busca da autoria e do protagonismo e não consegue operar, de fato, em parceria. Porém, para os adolescentes é urgente que se ofereça um conjunto de políticas articuladas que incluam educação, saúde, cultura, Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), segurança pública, entre outras que atuem de maneira sistematizada. Portanto, o que precisamos é que de fato elas se materializem em políticas que realizem plenamente os direitos humanos.
Cleomar Manhas é doutora em educação e assessora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), de Brasília
Correio Brasiliense, 29/12/2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário