O Povo, Ceara, 18/4/2013
Parte do governador do maior estado do Brasil o movimento para aplicar penas mais duras a crianças e adolescentes que cometem crimes. O paulista Geraldo Alckmin (PSDB) quer mudar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para que menores de idade acusados por crimes hediondos possam permanecer internados por até oito anos. Hoje, o período máximo recluso é três anos. Na carona da proposta, surge movimento que pretende mudança ainda mais radical, com redução da maioridade penal. A ideia é tratar adolescentes de 16 ou mesmo 14 anos da mesma forma como se trata quem tem 18 anos ou mais. Pelo menos três emendas à Constituição querem mexer nesse item, que alguns juristas consideram cláusula pétrea. Ao largo dessa discussão há, entretanto, outra tragédia relacionada à relação entre os jovens e o crime, com desdobramentos graves para a coletividade. Números do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias do Ministério da Justiça, relativos a dezembro de 2012, indicam que há 266,2 mil pessoas entre 18 e 29 anos encarceradas no Brasil. Desconsiderados os detentos cujas idades não constam nas estatísticas, são 52,4% dos presos no País com menos de 30 anos. No Ceará, pela mesma fonte, são 7,3 mil - pouco mais da metade do total, descontados aqueles cuja idade não consta no levantamento. Gente que sairá da prisão com 25, 30, 35 anos. E vão fazer o que da vida quando estiverem em liberdade? Que tipo de condição de reintegração é propiciado a eles? Uma população carcerária, no Ceará, composta por 61% de pessoas que não concluíram ensino fundamental e dentre as quais 1,1 mil são analfabetas. Além disso, presos que desenvolviam atividade de trabalho ou estudo, ainda no Ceará, não chegavam a um terço.
Enquanto o Brasil discute se deve pegar uma garotada mal saída da infância e jogá-la no sistema prisional comum, negligencia-se o debate sobre como reintegrar esses ainda jovens que deixam as penitenciárias sem perspectivas. E, mais importante, como evitar que outros tantos continuem a ser empurrados para o crime. Problema que comprometeu gerações e continua a envolver outras.
ADOLESCENTES NAS ESTATÍSTICAS CRIMINAIS
Discussões sobre redução da maioridade penal sempre ressurgem em momentos de comoção. Desta vez, ela vem a reboque do assassinato do universitário Victor Hugo Deppman, de 19 anos, baleado na semana passada, em frente de casa, em São Paulo, por adolescente de 17 anos. Em 4 de março de 2007, na coluna Menu Político, que assinava no caderno People, tratei do assunto. À época, o mote era a morte do menino João Hélio. Naquela oportunidade, como agora, havia garotos tanto entre as vítimas quanto entre os responsáveis pelas ocorrências. Quando isso ocorre, menores de idade passam a ser tratados como se fossem os grandes responsáveis pela explosão da criminalidade. Os jovens são, sim, destaque nas estatísticas, mas sobretudo como vítimas. Na coluna de 2007, citava dados da Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI) segundo os quais jovens de 15 a 24 anos representavam 38,5% das vítimas de homicídios, embora correspondessem a cerca de 20% da população brasileira.
Com números mais recentes, estudo do Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (Cebela), coordenado por Julio Jacobo Waiselfisz, mostra que as mortes de jovens (recorte de 15 a 29 anos) por armas de fogo no Brasil passaram de 9,1 a cada 100 mil habitantes em 1980 para 42,5 em 2010. Entre os não-jovens, o índice passou de 3,5 para 10,7 por 100 mil habitantes. O gráfico acima mostra a explosão dos crimes que vitimam sobretudo quem está no início da vida adulta.
Já quanto à autoria dos crimes, a coluna citava, ainda em 2007, o Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente (Ilanud), segundo o qual, à época, cerca de 10% dos delitos no Brasil eram cometidos por quem tinha até 18 anos. Três em cada quatro deles eram crimes contra o patrimônio, não contra a pessoa. Mais de um terço eram furtos sem violência. Já crimes contra a vida eram, segundo a Unesco, 8% das infrações cometidas por jovens e menos de 1% das ocorrências.
A questão urgente sobre a qual o Brasil precisa se debruçar são os homicídios contra jovens e como evitar o envolvimento deles com crimes, o que empurra essa geração para o sistema carcerário.
>
Nenhum comentário:
Postar um comentário