2 de julho de 2011

Homossexualidade deve ou não ser debatida com crianças, jovens e adolescentes em salas de aula?


02 de julho de 2011
 Jornal da Comunidade | Educação | DF
A polêmica vai a escola

Homossexualidade deve ou não ser debatida com crianças, jovens e adolescentes em salas de aula? Discussão mobiliza o governo federal, os especialistas, as instituições de ensino e a bancada dos parlamentares religiososAfinal de contas, a homossexualidade é um desvio de conduta, um pecado ou simplesmente uma opção sexual? Deve ou não ser tolerada? Os chamados setores progressistas da sociedade acham que sim e acreditam que deve, inclusive, ser trabalhada nas escolas, como parte da formação das crianças, jovens e adolescentes. Setores considerados conservadores, no entanto, discordam dessa visão e não aceitam que essa questão seja abordada apenas no âmbito escolar. Estes defendem que a educação sexual deve ser resultado de uma parceria entre a família e o colégio.
Diante da realidade de preconceito e discriminação vivenciada pelo segmento homoafetivo, o Ministério da Educação (MEC) decidiu introduzir nas instituições de ensino um kit anti-homofobia. Mas a primeira cartilha, que chegou a ficar pronta para distribuição nas escolas, foi abortada em razão da pressão de parlamentares religiosos. O resultado é que o material acabou vetado pela presidente Dilma Rousseff. O MEC propõe reformular a cartilha e, assim, reiniciar seu projeto de educação sexual nas escolas públicas e particulares do Brasil.
No colégio INEI do Lago Sul, o Serviço de Orientação Educacional Psicopedagógico (SOEP) tem projetos com os alunos e com os pais, os quais, por meio do Ciclo Família, participam de encontros e de palestras com os próprios filhos. O projeto trata de assuntos que estão em discussão na mídia, como preconceito, bullyng e temas de amplo conhecimento dos alunos. A orientadora educacional Solange Branco explica que tudo isso é passado desde o maternal até o ensino médio, em atividades curriculares, projetos interdisciplinares em filosofia.
"No maternal esses temas são discutidos dentro das histórias literárias, em projetos mais simples, de desenho, colagens, recortes e outros projetos. O ensino fundamental trabalha com atividades dentro da disciplina filosofia, com uma abordagem muito maior, de acordo com a idade. No quinto ano, quando se fala em projeto afetivo-sexual, não abordamos somente o sexo em si, mas também o conhecimento do corpo humano", esclarece a orientadora.
Diálogo
Professores e alunos se relacionam cada vez mais como um núcleo familiar. Os pais, por sua vez, devem acompanhar a vida do filhos na escola, fora de casa, e conversar sempre com os professores. "O INEI apoia essa relação aberta com os pais e, sempre que possível, chama-os para dialogar. Por menor que seja o motivo da conversa, é importante essa relação entre a escola e a família", ressalta Solange.
Não se pode colocar um kit, com as informações que contém, desta maneira, como foi publicado. O INEI ainda não recebeu nada a respeito do kit do MEC, mas o entendimento da direção da instituição é de que, muitas vezes, força-se uma situação com as crianças, que acabam perdendo a inocência da infância. E isso não é bom. "A opção sexual a criança vai decidir mais para frente. Não se pode implantar coisas nelas, temos de lembrar que são apenas crianças", defende Solange. Ao contrário do que ocorre em muitas escolas ela acha necessária a conversa entre educadores e alunos.
Haddad muda campanha
O kit, que em fevereiro recebeu o apoio da Unesco, deve passar por mudanças. A presidente Dilma afirmou que algumas imagens e vídeos são desnecessários para o ambiente escolar. Recentemente o ministro da Educação, Fernando Haddad, levou à presidente uma sugestão de projeto para que o kit anti-homofobia faça parte de uma ampla campanha contra o preconceito de ordem sexual.
"Há um pleito da Frente Parlamentar da Família de que esse material contra a homofobia não fique circunscrito a esse preconceito, a essa forma de discriminação, e está sendo avaliada a oportunidade disso. Mas me parece uma postura legítima de parte de setores que querem ver o debate do fim da discriminação nas escolas envolvendo muitas dimensões, e não uma específica" afirmou Haddad, logo após participar de uma audiência pública sobre o tema na Comissão de Educação do Senado.
Psicólogos defendem diálogo de pais e escolas para educação sexual dos alunos Psicólogos acham que a educação sexual no âmbito escolar deve ser feita em consenso entre família a instituição de ensino. Fauzi Mansur, professor de psicologia educacional do Instituto Educacional Superior de Brasília (IESB), acha que o professor é, hoje, a primeira referência para o aluno. O trabalho em conjunto entre escola e família é importante, sem barreiras, acredita.
"Muitos pais passam mais tempo longe dos filhos do que com eles e os laços construídos entre escola e as crianças são fortes. O comportamento da sociedade muda quase todo mês. É necessária uma reflexão feita por todos dentro de um processo de revisão de conceitos", analisa Fauzi. Ele vislumbra um penhasco enorme entre escolas e famílias e diz que os filhos acabam perdidos nesse meio.
O psicólogo considera que o kit anti-homofobia deve ser melhor elaborado, porque todo o processo é lento e com isso o bullying pode aumentar. "Nada acontece por decreto", afirma Fauzi. Os pais são referência para as crianças. Por mais vivido que seja o integrante da família, ele deve se preparar, saber o que está falando, atualizar-se.
Não podemos ensinar nossos filhos achando, pensando que somos donos da verdade, explica. "A paternidade não concede ao pai ou à mãe a sabedoria necessária para esclarecer e sanar todas as dúvidas de um filho. É necessário o aprendizado em conjunto, dos pais, filhos e escola", conclui o psicólogo.
Veltz Capone, 47 anos, é pai de duas meninas, uma de 13 e outra de 17 anos. A filha mais velha, Gabriela Feitoza Capone, acaba de entrar para a faculdade. "Desde pequena converso com ela sobre sexo. É muito importante que saiba como funciona o corpo humano", justifica o autônomo. Ele se define como um pai liberal, porém preocupado com o nível de informação que os jovens têm hoje.
Sobre o kit anti-homofobia nas escolas, ele diz que nenhum pai acha que o filho será homossexual, mas o amor para o filho ultrapassa qualquer preconceito. "Quando se fala de sexo, fala-se da vida. É importante as escolas conversarem com os pais, assim todos, a instituição escola e a instituição família, trabalham juntos pelo crescimento dos jovens", conclui.
Preconceito
A psicóloga Ciomára Schneider tem outra ideia a respeito do kit anti-homofobia e a discussão do tema sexualidade nas escolas. "Acho bastante conveniente a discussão do preconceito, seja racial, sexual, não importa qual for, com as crianças em sala de aula. Na minha opinião foi muito bem pensada e estruturada a iniciativa do MEC", defende a psicóloga.
"A escola tem esse papel exclusivo e deve envolver os pais para saberem o que os filhos aprendem em sala de aula", diz a psicóloga. Ela sugere aulas mais dinâmicas e explica que o esforço deve ser conjunto. Ciomára acha adequada a conversa entre escola e alunos para que, assim, todos participem e possam discutir temas como a homofobia entre seus próprios grupos de amigos. "Envolver as famílias não é levar problema para casa. É solucionar a dúvida que muitos têm, na medida em que a informação chega rápido às casas, através da internet e da televisão," finaliza a doutora em psicologia educacional.

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