1 de dezembro de 2012

ANDRÉ SINGER A estratégia social


Folha de S.Paulo, 1/12/2012
Entre a lei dos royalties e a MP das elétricas, o mandato de Dilma Rousseff vai chegando ao meio sem produzir novo marco na redução da desigualdade. O governo deveria aproveitar a janela não eleitoral que se abrirá no primeiro semestre de 2013 e enviar ao Congresso a Consolidação das Leis Sociais (CLS), que ficou na gaveta de Lula, deixando, assim, um legado definitivo.
A ampliação dos atendidos pelo Brasil Carinhoso, anunciada anteontem no Planalto, é, sem dúvida, positiva. Na prática, a presidente vem subindo o valor do Bolsa Família (BF). Pode parecer pouco para quem transita nas faixas A e B (a grande maioria dos leitores deste jornal), contudo, para os sete milhões de brasileiros que passarão a receber a partir de dezembro acréscimo mensal de R$ 15,60, constitui adição significativa.
Representará, por exemplo, aumento de 45% na transferência para um grupo familiar constituído por pai, mãe e três filhos. No caso, os R$ 78 suplementares permitirão, sobretudo onde o custo de vida é menor, como no interior do Norte e do Nordeste, incrementar o consumo de proteínas indispensáveis ao desenvolvimento das crianças. Em maio passado, outros nove milhões de beneficiários já haviam sido contemplados pela melhoria.
Daí a pensar que a mera elevação do BF possa "erradicar a pobreza absoluta", compromisso assumido na cam-panha de 2010, vai distância considerável.
Para diminuir a diferença entre uma coisa e outra, o Executivo rebaixou as metas, o que produz efeito estatístico enganoso. Em maio de 2011, adotou o objetivo de combater a "pobreza extrema", que se define por ingresso monetário cujo teto é a metade daquele posto pela "pobreza absoluta". Diminuiu-se, portanto, de maneira expressiva o número de indivíduos abrangidos pela categoria.
Mas não foi só. Equiparou-se a "pobreza extrema" à renda familiar per capita de até R$ 70, o que corresponde, hoje, a aproximadamente um oitavo de salário mínimo quando, usualmente, o critério adotado é de um quarto de salário mínimo, ou seja, o dobro. Em consequência, com o aporte de alguns reais ao mês, pode-se dizer que o indivíduo saltou de condição, o que é falso.
Dilma não conseguirá "erradicar a pobreza", mas tem chance de transformar em direito o progresso gradual alcançado. A aprovação da CLS pelo Legislativo, imaginada como maneira de converter em política de Estado não só a BF como a valorização do salário mínimo, o acesso ao ensino superior e outros programas desenhados pelo modelo incremental do lulismo, representaria enorme ganho de cidadania. Ainda há tempo para realizá-lo.

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