Chico Santos, Valor, 16/4/2013
A expressão "dar murro em ponta de faca" é um tanto surrada, mas às vezes não tem alternativa. Em 2011 o pesquisador Manoel Marcondes Neto, professor de Fundamentos do Marketing e de Comunicação Organizacional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e a consultora fiscal-tributária Lusia Angelete Ferreira lançaram o livro "Economia da Cultura" (ed. Ciência Moderna), como diz o subtítulo, uma "contribuição para a construção do campo e histórico da gestão de organizações culturais no Brasil".
O livro faz um levantamento, que vai do começo do século passado até 2010, das instituições e organizações voltadas para o estímulo e apoio à cultura, aí compreendidos cinema, livros, museus, música e teatro, da atividade econômica criada em torno desses segmentos. E traz conclusões sombrias.
"A legislação atual exige estrutura formal e burocrática para a utilização de incentivos fiscais, mas não contribui para a autossustentação dessas organizações, sempre dependentes de orçamentos contingenciados pelo Executivo, apesar do surgimento [desde 1986] de um 'marketing cultural', responsável por nove entre dez iniciativas de patrocínio à arte e à cultura", diz um trecho do resumo publicado nas primeiras páginas.
Marcondes, que nas décadas de 1980 e 1990 foi um produtor cultural, derrubado pelo confisco de poupanças do Plano Collor (1990), diz que o livro vendeu e circulou, mas não o suficiente para provocar a polêmica desejada, dado o descompasso entre o potencial criativo do país e a riqueza gerada em torno dele, um setor, segundo os autores, "permeado por agentes culturais dependentes de recursos alheios". Tanto que a Uerj decidiu trazer de volta o tema e a publicação, marcando debate sobre a economia da cultura para amanhã, às 18h (r. São Francisco Xavier, 524, Maracanã).
Além do livro, o debate vai tomar como base a experiência de 15 anos de um curso de extensão sobre marketing cultural ministrado pela universidade, do qual Marcondes foi professor, e que acabou sucumbindo à falta de alunos. Para o professor, o formato oferecido pela universidade, buscando atrair o participante pessoa física e não a empresa na qual aquele interessado trabalha para que ela pague a formação do seu empregado, acabou fazendo minguar a afluência de alunos.
Tudo, na visão do paulista de 54 anos radicado no Rio desde os 18, é parte de um caldo que não engrossa apesar de arder em fogo brando no mercado e na academia há muitos anos. "O nosso trabalho na Uerj é solitário", diz Marcondes, ressaltando que, por exemplo, são pouquíssimos os cursos regulares de graduação em produção cultural no país. "Faltam estudos acadêmicos e faltam dados", afirma. Segundo ele, não há nenhum estudo evidente medindo qual foi o impacto da saída dos fabricantes de cigarros do patrocínio cultural a partir de 2003.
A própria tibieza política e econômica do Ministério da Cultura, na avaliação do professor da Uerj, é a maior evidência do problema. Segundo dados que Marcondes e Lusia apresentarão amanhã no debate, coube ao Ministério da Cultura R$ 1,1 bilhão do orçamento de R$ 1,41 trilhão executado pela União no ano passado, o equivalente a 0,08%, quando a Unesco, órgão das Nações Unidas que trata das áreas de educação, ciência e cultura, recomenda um mínimo de 1% do orçamento para a área cultural.
Por essa e outras razões, Marcondes é favorável à reintegração do antigo MEC, que embora tenha sua sigla originária de Ministério da Educação e Cultura, hoje cuida apenas da educação, pasta que no ano passado aplicou R$ 51,3 bilhões.
Nem tudo no livro, ou na entrevista de Marcondes ao Valor, é desalento. Ele vê sinais positivos em iniciativas recentes, incluindo o projeto de Pontos de Cultura (2004), do ex-ministro Gilberto Gil, desde que tratado com a devida prioridade, e a criação do Vale-Cultura. Neste caso, tem duas observação: é preciso haver atividade cultural no município para que o dinheiro (R$ 50 por mês) seja usado. E, para ele, não deve ser permitido usar o vale para as
A expressão "dar murro em ponta de faca" é um tanto surrada, mas às vezes não tem alternativa. Em 2011 o pesquisador Manoel Marcondes Neto, professor de Fundamentos do Marketing e de Comunicação Organizacional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e a consultora fiscal-tributária Lusia Angelete Ferreira lançaram o livro "Economia da Cultura" (ed. Ciência Moderna), como diz o subtítulo, uma "contribuição para a construção do campo e histórico da gestão de organizações culturais no Brasil".
O livro faz um levantamento, que vai do começo do século passado até 2010, das instituições e organizações voltadas para o estímulo e apoio à cultura, aí compreendidos cinema, livros, museus, música e teatro, da atividade econômica criada em torno desses segmentos. E traz conclusões sombrias.
"A legislação atual exige estrutura formal e burocrática para a utilização de incentivos fiscais, mas não contribui para a autossustentação dessas organizações, sempre dependentes de orçamentos contingenciados pelo Executivo, apesar do surgimento [desde 1986] de um 'marketing cultural', responsável por nove entre dez iniciativas de patrocínio à arte e à cultura", diz um trecho do resumo publicado nas primeiras páginas.
Marcondes, que nas décadas de 1980 e 1990 foi um produtor cultural, derrubado pelo confisco de poupanças do Plano Collor (1990), diz que o livro vendeu e circulou, mas não o suficiente para provocar a polêmica desejada, dado o descompasso entre o potencial criativo do país e a riqueza gerada em torno dele, um setor, segundo os autores, "permeado por agentes culturais dependentes de recursos alheios". Tanto que a Uerj decidiu trazer de volta o tema e a publicação, marcando debate sobre a economia da cultura para amanhã, às 18h (r. São Francisco Xavier, 524, Maracanã).
Além do livro, o debate vai tomar como base a experiência de 15 anos de um curso de extensão sobre marketing cultural ministrado pela universidade, do qual Marcondes foi professor, e que acabou sucumbindo à falta de alunos. Para o professor, o formato oferecido pela universidade, buscando atrair o participante pessoa física e não a empresa na qual aquele interessado trabalha para que ela pague a formação do seu empregado, acabou fazendo minguar a afluência de alunos.
Tudo, na visão do paulista de 54 anos radicado no Rio desde os 18, é parte de um caldo que não engrossa apesar de arder em fogo brando no mercado e na academia há muitos anos. "O nosso trabalho na Uerj é solitário", diz Marcondes, ressaltando que, por exemplo, são pouquíssimos os cursos regulares de graduação em produção cultural no país. "Faltam estudos acadêmicos e faltam dados", afirma. Segundo ele, não há nenhum estudo evidente medindo qual foi o impacto da saída dos fabricantes de cigarros do patrocínio cultural a partir de 2003.
A própria tibieza política e econômica do Ministério da Cultura, na avaliação do professor da Uerj, é a maior evidência do problema. Segundo dados que Marcondes e Lusia apresentarão amanhã no debate, coube ao Ministério da Cultura R$ 1,1 bilhão do orçamento de R$ 1,41 trilhão executado pela União no ano passado, o equivalente a 0,08%, quando a Unesco, órgão das Nações Unidas que trata das áreas de educação, ciência e cultura, recomenda um mínimo de 1% do orçamento para a área cultural.
Por essa e outras razões, Marcondes é favorável à reintegração do antigo MEC, que embora tenha sua sigla originária de Ministério da Educação e Cultura, hoje cuida apenas da educação, pasta que no ano passado aplicou R$ 51,3 bilhões.
Nem tudo no livro, ou na entrevista de Marcondes ao Valor, é desalento. Ele vê sinais positivos em iniciativas recentes, incluindo o projeto de Pontos de Cultura (2004), do ex-ministro Gilberto Gil, desde que tratado com a devida prioridade, e a criação do Vale-Cultura. Neste caso, tem duas observação: é preciso haver atividade cultural no município para que o dinheiro (R$ 50 por mês) seja usado. E, para ele, não deve ser permitido usar o vale para as
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