18 de novembro de 2013

CARLOS GUILHERME MOTA, Carta aberta aos "estudantes" da USP


Nosso IEA é independente, mas não é neutro. Iremos apurar até o fim as responsabilidades por atos eivados de vandalismo boçal
No recente episódio de ocupação e desocupação da reitoria da Universidade de São Paulo, ocorreu um crime, por assim dizer, inafiançável: a depredação da sede de nosso Instituto de Estudos Avançados.
O IEA tem autonomia, não pertence à reitoria, embora esteja provisoriamente no mesmo edifício. Ainda assim, foi objeto de uma das mais indevidas e abjetas ocupações pseudouniversitárias de que se tem notícia no último meio século. Conseguiram, os predadores, perpetrar façanha ainda maior do que uma outra, também inesquecível, que ocorreu durante o regime militar.
Com efeito, na manhã da segunda-feira passada e nos dias seguintes, fomos tomando ciência do que ocorrera ao recebermos fotos e depoimentos que davam conta da barbárie. Ou seja, da depredação brutal e boçal da sede do IEA, após invasão indevida e festim descabido.
Podemos entender que manifestações estudantis, e mesmo de funcionários e professores, sempre fizeram parte da vida universitária. E que, agora, no compasso das manifestações sociais de insatisfação com os rumos da República, movimentos vêm adquirindo novos contornos, inclusive com os "black blocs" e o uso de metodologias que evocam os inícios de regimes fascistas.
O que não se pode conceber é que o movimento estudantil tenha permitido transbordamentos inconfessáveis como o ocorrido recentemente, com a depredação de nossas instalações no campus, levando de roldão computadores e documentos, arrombando portas, pichando e até furando paredes e estragando material de longas e cuidadosas reuniões. O prejuízo é incalculável. E mais: trata-se de ação criminosa, nem mais nem menos.
Incalculável é também o dano moral e psicológico que nos causou a devastação de salas de pesquisadores consagrados, como a do professor Aziz Ab'Saber. Não apenas esta, mas todas as nossas instalações foram visitadas pelos meliantes, digo, estudantes, inclusive o anfiteatro onde realizamos conferências abertas ao público, gratuitamente!
Como se sabe, trata-se de uma sede provisória, já precária "per se", pois fomos "mudados", sem consulta prévia, de nosso "locus" original do prédio da reitoria velha, enquanto aguardamos a lenta, muito lenta construção do novo.
É chegada a hora de se perguntar aos estudantes o que se pretendeu com tal barbarização. Protestar contra o reitor? Contra o processo eleitoral? Contra o IEA e suas multifacetadas linhas de reflexão, pesquisa e socialização do conhecimento?
Outras perguntas deverão ser feitas, e nós as faremos a vocês, passado este duro e constrangedor momento. Que tipo de formação tiveram? O que aprenderam em suas casas, escolas e faculdades? Que sistema universitário pretendem implantar? E o nosso IEA, em que precisamente ele os incomoda?
Note-se que temos trazido para seus quadros e seus embates muitos intelectuais, do porte de Milton Santos, Aníbal Quijano, Jacob Gorender, Raymundo Faoro, Eric Hobsbawm, Moreno Fraginals, Mayana Zatz, Boaventura de Sousa Santos e Leyla Perrone-Moisés.
Agora, porém, caros estudantes, o problema tornou-se mais grave. E dirijo-me à banda não podre do alunado, que também deve assumir suas responsabilidades em episódios altamente delituosos. Pois buliram não com um vespeiro, mas com a própria colmeia, onde se dá e se aprimora a produção e a crítica, habitada por abelhas bravias.
Nosso IEA é independente, mas não é neutro, e não vamos tolerar esse padrão concessivo e "liberal" com o qual a USP, o Estado e a República estão empapados. Iremos apurar até o fim as responsabilidades por tais atos eivados de vandalismo boçal. E efetuar as devidas punições com mão forte, para o que contamos com os poderes constituídos, que andaram fraquejando demais, e com o firme apoio da comunidade científico-cultural, nacional e internacional.
Quanto ao atual reitor, sugere- se sua renúncia imediata, por in-competente.

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