28 de março de 2011

ciencia e tecnología no Brasil




Bons em ciência, ruins em tecnologia
 

Paulo Feldman - O Estado de S.Paulo
  Os números divulgados recentemente pela OMPI (Organização Mundial da Propriedade Industrial) são muito ruins para o Brasil. Apesar da economia brasileira ter crescido em 2010, nossos pedidos de patentes internacionais caíram 14,4% ao mesmo tempo em que progrediram 56% na China e 20% na Coreia.
Fizemos apenas 422 pedidos de patentes. o que representou 0,25% do total de pedidos de patentes feitos no mundo inteiro no ano passado. Registro de patentes é hoje considerado o principal indicador da produção tecnológica de um país.
Isso significa que existe uma contradição em relação aos números da ciência e tecnologia no Brasil, pois somos o 11.º maior produtor de ciência do mundo, com cerca de 2,4% dos artigos publicados nas principais revistas cientificas mundiais. No entanto, não estamos nem entre os 23 principais produtores de tecnologia. Por que essa diferença? Uma das principais razões está na universidade.
A universidade brasileira que precisa ser parabenizada pela produção crescente e expressiva de seus docentes - o que permitiu o lado positivo das estatísticas acima - é a mesma universidade que não consegue e não sabe se relacionar com as empresas brasileiras para lhes prover tecnologia como acontece em outros países grandes produtores como EUA, Inglaterra, Coréia, Israel, entre vários outros. Nesses países existe um intercâmbio saudável entre o mundo acadêmico e o mundo empresarial.
Outra característica que nos diferencia dos países mais avançados em produção tecnológica está na formação de engenheiros. Temos apenas 23 engenheiros para cada 10 mil habitantes. Em Israel, esse mesmo índice atinge 140; e, no Japão, 75. Isso está ligado ao nosso deficiente ensino básico e provavelmente à má formação que nossos jovens recebem em matemática e física. Enquanto formamos 30 mil engenheiros por ano, a Índia e a China juntas formam 850 mil. O problema é complexo porque, para entrar no clube dos inovadores, vamos ter de rever todo nosso sistema educacional.
Estatais. A indústria também tem sua parte de culpa. Afinal o Brasil gasta 1,1% de seu PIB com P&D (pesquisa e desenvolvimento), mas menos da metade desse valor vem do setor privado. Quem mais investe são estatais como Petrobrás, empresas como Embrapa e os diversos institutos de pesquisa, como IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), Inpi (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), CTA (Centro Técnico Aeroespacial). A maior parte do investimento está no setor público.
Hoje, nos países mais avançados do mundo, a grande maioria dos gastos com P&D é feita pelo setor privado. O recordista nesse aspecto é a Coreia do Sul, onde 85 % do total gasto com P&D - que não é pouco, representa cerca de 3% do PIB - são feitos por empresas privadas como Samsung, LG, Hyundai, entre outras.
No Brasil, isso tem a ver com o fato das grandes empresas estarem fora dos setores de alta tecnologia onde a inovação é imperativo para a sobrevivência. A grande maioria das empresas brasileiras é produtora de commodities de baixo valor agregado. São dos setores de mineração, agroindústria, bebidas ou do setor de serviços. Nossa honrosa exceção é a Embraer.
Relação com universidade. Mas, se a grande empresa não possui estímulos para inovar, muito menos incentivos existem para a pequena empresa. O empresário, por ter de focar na sua sobrevivência, sequer cogita investir em pesquisa e, consequentemente, não tem como inovar. Países como Israel, onde boa parte da produção tecnológica vem das pequenas empresas, comprovam que é importante aproximar esses empresários e empreendedores das universidades. Ou seja, também no caso das pequenas empresas, a boa relação com as universidades pode ser decisiva.
Estamos no inicio de um novo governo e temos um ministro, Aloísio Mercadante, que por ser da universidade pode deixar sua marca se conseguir diminuir o abismo que hoje existe entre o mundo acadêmico e o mundo corporativo. Qual a saída? Incentivos para os dois lados passarem a se relacionar. Essa é uma das razões do sucesso do modelo coreano principalmente nesta área. Os professores que conseguirem fazer acordos com as empresas para desenvolverem suas pesquisas precisam ser premiados e as empresas que apoiarem a universidade merecem isenções tributárias.
Claro que parte do problema é cultural e por isso sua solução é muito mais complexa. O Brasil herdou a tradição europeia do cientista como acadêmico, e não o modelo norte-americano do cientista inventor e empresário. Para um pesquisador universitário, ter ligação com a indústria é considerado prostituição.
Lamentavelmente, o que tem impedido a solução dessa questão é o fato de que, em ambos os lados, muitos negam a existência do problema. Mas o mais importante é ter clareza e honestidade e reconhecer que sim, existe uma enorme falta de sintonia na relação entre universidades e empresas no Brasil. Só dessa forma se poderá caminhar para a solução da mesma.
Paulo Feldman é presidente do Conselho da Pequena Empresa da Fecomércio, diretor da Camara de Comércio Brasil-Israel e professor de Economia da Tecnologia da FEA/USP

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