9 de setembro de 2011

Municípios pedem mais autonomia e verbas ao MEC


e setembro de 2011
Educação no Brasil | Valor Econômico | Brasil | BR

Ana Paula Paiva/Valor/Ana Paula Paiva/Valor 

Cleuza Repulho, da Undime, cobra do MEC aumento do valor do custo por aluno de cidades pobres para o repasse de verbas

Luciano Máximo
Na educação pública brasileira, quase um terço dos municípios do país recebe o selo de prioritários. Pelo menos 85% deles estão nas áreas rurais do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Além da pouca capacidade de arrecadação, essas cidades se caracterizam por notas no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) abaixo da média nacional e pela extrema dependência do Ministério da Educação (MEC) e dos governos estaduais na criação e execução de praticamente todas as políticas educacionais que buscam melhorar a qualidade do ensino - do fornecimento de merenda ao transporte escolar, da construção e reforma de escolas à formação e capacitação de professores.
Reunidos na semana passada em um resort na Bahia durante o 4º Fórum Extraordinário da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime), 1,1 mil secretários municipais de Educação - 902 deles de cidades prioritárias - se mostraram descontentes com essa relação de dependência, porque, muitas vezes, as políticas do MEC direcionadas ao ensino municipal não atendem à necessidade ou à realidade de cada localidade. Ao mesmo tempo, os participantes foram contraditórios: defenderam de forma unânime que o ministério aumente os recursos das mesmas ações criticadas.
No encontro da Undime não faltaram histórias de "confusão" entre os gestores municipais de educação e o MEC. Chaves, município da Ilha do Marajó no Pará, foi contemplado com um ônibus do programa federal Caminho da Escola. "O único transporte escolar terrestre na nossa cidade é quando a criança vai e volta a cavalo ou de búfalo na várzea dos rios no tempo de seca. Normalmente as levamos e buscamos em pequenas canoas ou barcos terceirizados", relata Ângela Figueiredo, secretária municipal de Educação de Chaves.
O ônibus não chegou a ser entregue e a administração municipal solicitou ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão do MEC, quatro lanchas especialmente desenhadas pela Marinha para o transporte escolar de estudantes ribeirinhos. "Estamos aguardando, pode ajudar muito no transporte, mas tem outro problema: o motor das lanchinhas é a gasolina, que tem um custo muito elevado. Nosso prefeito [PT] está cogitando cancelar o convênio." Na entrega das primeiras lanchas do FNDE e da Marinha, em agosto do ano passado, o Valor apurou que a entrega das embarcações ficou emperrada por vários meses por causa da burocracia na liberação dos documentos.
As secretárias municipais de Educação de Brumadinho (MG) e Araguapaz (GO) questionam a demora para acessar os recursos federais para a construção de creches. Elas esperaram em média dois anos para receber a verba do Pró-Infância, convênio do MEC que financia as obras das unidades infantis. "Os municípios têm muita dificuldade em achar o terreno, e o projeto é facilmente rejeitado por causa de detalhes mínimos. O MEC precisa considerar as particularidades de cada região", diz Sônia Aparecida Barcelos, de Brumadinho, região metropolitana de Belo Horizonte. "Tenho uma pessoa só para cuidar das parcerias com o MEC, todo dia estamos ligando e cobrando", acrescenta Susi Beatriz, titular da Educação de Araguapaz, município goiano com 7,5 mil habitantes.
O diretor de articulação dos sistemas de ensino da Secretaria de Educação Básica do MEC, Romeu Caputo, explicou que o governo federal está "reaprendendo" a investir em infraestrutura da educação. "Temos que analisar as dificuldades do ponto de vista histórico. A União ficou muito tempo sem participar da vida dos municípios, não há razão para ser pessimista", justificou Caputo, destacando que nos últimos anos as transferências de recursos para municípios via programas do MEC, como o PDE Escola, multiplicaram por dez e o número de colégios atendidos passou de 2 mil para quase 19 mil.
Já os gastos com o Plano de Ações Articuladas (PAR), política federal de transferência de recursos e assistência técnica em gestão educacional, formação docente, recursos pedagógicos e infraestrutura escolar aos municípios com as piores notas no Ideb, atingiram R$ 7,4 bilhões em 2010, valor que representa crescimento de mais de 500% em relação aos investimentos iniciais, em 2007.
Apesar das cobranças, parte dos problemas também pode ser atribuída à gestão ineficiente das secretarias municipais de Educação e à falta de informação. Ao fim de sua apresentação no Fórum da Undime, Romeu Caputo foi cercado por vários dirigentes. As perguntas dirigidas a ele eram elementares e poderiam ser respondidas com uma simples consulta ao site do MEC. "Nos esforçamos para manter a transparência dos processos e sempre disponibilizar as informações necessárias", afirmou Caputo.
Antonio Bittencourt, secretário municipal de Educação de Aracaju, conta que com ajuda dos programas federais conseguiu melhorar a nota do município no Ideb. "Priorizamos a gestão, que acaba facilitando tudo. Mas o Brasil é muito grande, todo mundo sabe que muitas cidades sofrem com secretários sem experiência ou indicados por políticos. Aí a educação vai mal", opina Bittencourt.
"Alguns secretários da região Norte e Nordeste ligam a cobrar para a gente ou para o MEC em Brasília para tratar das políticas educacionais", conta Cleuza Repulho, secretária municipal de Educação de São Bernardo do Campo e presidente da Undime. Para ela, as distorções na relação dos municípios mais pobres com o MEC e os governos estaduais refletem a desigualdade da educação brasileira, que deve ser enfrentada com mudanças no modelo de financiamento. "O MEC deveria levar em conta um custo-aluno das cidades pobres mais alto. O custo de vida pode ser mais alto em São Paulo, mas a educação é muito mais cara no interior do Pará, onde as distâncias são muito maiores para transportar alunos e capacitar professores e a infraestrutura escolar é mais precária", completa Cleuza.

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