22 de junho de 2012

Rio + 20: novo contrato social, por Merval Pereira


Enviado por Ricardo Noblat - 
22.6.2012
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Diante do documento final da Rio+20, que parece sem ambições maiores que a de alcançar um consenso entre os participantes, sem importar a profundidade dos compromissos assumidos, já começam vários movimentos para tentar avançar além dele, em acordos paralelos que possam suprir sua falta de perspectiva histórica.
A defesa de uma postura solidária entre as nações, defendida em entrevistas paralelas por dois pensadores da questão ambiental com uma visão política mais abrangente e menos burocrática do que a que domina a redação do documento final do encontro, parece ser o caminho para esses acordos paralelos.
Um deles é o secretário-geral adjunto da ONU Carlos Lopes, de Guiné-Bissau, encarregado da Comissão Econômica da África, que pretende retomar a tese do filósofo Jean-Jacques Rousseau de um novo contrato social para enfrentar os desafios econômicos e políticos.
O outro é o sociólogo francês Edgar Morin, presidente do Institut International de Recherche Politique de Civilisation. Os dois encontraram-se ontem em um almoço promovido pelo sociólogo brasileiro Cândido Mendes, membro da Academia Brasileira de Letras e secretário-geral da Academia da Latinidade, um organismo internacional dedicado à aproximação cultural e política entre o Oriente e o Ocidente, do qual os dois participam.
O sociólogo Edgar Morin participou de uma atividade paralela da Rio+20 na Escola Sesc de Ensino Médio na Barra da Tijuca justamente sobre “a força moral de um contrato social para o século XXI”.
O resultado dos debates será levado ao Segmento de Alto Nível da Conferência. Entre os assuntos discutidos estão os desafios de uma política da humanidade, o papel dos povos e territórios frente às encruzilhadas relacionadas à agricultura, segurança alimentar, fonte de energia, às formas de produção e de consumo.
As experiências agroecológicas para produções alternativas foram tema do pioneiro em agricultura agroecológica na França, Philippe Desbrosses. Também estava presente o professor emérito da École dês Hautes Etudes en Sciences Sociales, Ignacy Sachs, precursor do conceito de “desenvolvimento sustentável” a partir, na década de 1970, de um modelo ambientalmente correto de produção, distribuição e consumo de bens.
Sachs vai participar do debate com Carlos Lopes e outros para buscar os pontos de um novo pacto social para o século XXI. Lopes acredita que assim como os Objetivos do Milênio da ONU foram aprovados como maneira de superar o impasse do Protocolo de Kyoto, que os Estados Unidos não ratificaram, também novos compromissos paralelos poderão ser assumidos para evitar o fracasso da Rio+20, mais uma vez provocado pela atitude dos Estados Unidos e da China de não se empenharem na aprovação de um documento mais ousado.
Nos Objetivos do Milênio estão incorporados compromissos com as questões social, econômica e ambiental, que não podem ser dissociadas, como defende Edgar Morin, em busca de uma visão solidária dos países.
Carlos Lopes acha que a solução só chegará quando a visão econômica moderna incorporar a questão ecológica não como uma barreira, mas como uma maneira de impulsionar o desenvolvimento.
Uma das grandes questões da atual discussão é a do financiamento dos projetos e programas, devido à grave crise econômica internacional que assola o mundo desde 2008. Lopes dá a China como exemplo de uma maneira de encarar esses investimentos no longo prazo, sem uma visão imediatista que domina a economia mundial.
Segundo Edgar Morin, os países hoje estão atrelados à especulação financeira e são incapazes de ter uma visão holística dos problemas do planeta.
Carlos Lopes lembrou que, segundo o FMI, as zonas mais resilientes à crise, que crescerão mais na próxima década são precisamente aquelas que precisavam progredir mais, como a África, que é o continente que mais cresce hoje no mundo.
Mesmo que a base seja muito pequena, e, portanto, o crescimento médio de cerca de 6% possa não significar o mesmo que em outras regiões mais desenvolvidas, o fato é que a África está sofrendo uma alteração profunda em sua estrutura física, com grandes investimentos em tecnologia da informação, com uma população urbana jovem conectada com as novas tecnologias.
A China compreende esse fenômeno e, para exemplificar a grandeza dos seus investimentos, Carlos Lopes lembra que nos anos 60 do século passado a China começou aplicando U$ 1 milhão de dólares na região, e hoje tem programação de U$ 120 bilhões até 2015, investimento que foi sendo ampliado de maneira exponencial no decorrer das décadas e continuará em ritmo acelerado nos próximos anos.
Ele lamenta que o Brasil não tenha uma visão estratégica tão bem estruturada para a África como a China, independente da capacidade de investimento. Na sua visão, por enquanto o Brasil, embora compreenda a importância de apoiar o desenvolvimento da África, tem mais voluntarismo do que programa estratégico.
Ele lembra que a África tem as maiores reservas de terras aráveis do mundo ainda não aproveitadas, e o futuro da produção alimentar para a humanidade está lá e no Brasil. As experiências da Embrapa podem ser muito úteis para a agricultura na África.
Carlos Lopes vê no rascunho do documento final da Rio+20 coordenado pelo Brasil a prova do que vinha sustentando nos últimos dias: o Brasil não é um líder ambiental, apesar de estar no centro dos debates sobre o assunto desde a Rio 92 e agora a Rio+20.

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