24 de abril de 2012

Hélio Schwartsman - Doação traída


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SÃO PAULO - A Justiça mandou a USP devolver à família do banqueiro Pedro Conde (1922-2003) R$ 1 milhão que ela doara à Faculdade de Direito, porque a universidade não cumpriu as contrapartidas acertadas, que eram batizar um auditório com o nome do capitalista e instalar um retrato seu na escola.

Meu primeiro impulso foi pensar "bem-feito!". É preciso ser muito tolo para recusar um monte de dinheiro em troca de tão econômicas homenagens. Depois, porém, me ocorreu que o episódio é sintoma de um problema mais complicado e mascara uma disputa ideológica: a chamada privatização da universidade pública. A discussão de fundo é como essas instituições se financiam e se devem ou não cobrar mensalidades.

Universidade gratuita, como quer a palavra de ordem, é algo que não existe. Prédios, laboratórios, professores e funcionários não se materializam do nada. Se não é o aluno que paga por sua formação, alguém o faz. Em geral é a sociedade, por meio dos impostos cobrados a todos. A questão, portanto, é definir qual modelo convém mais ao país. Ambos os lados têm bons argumentos.

Os defensores da "gratuidade" sustentam que mesmo nos EUA, onde universidades estatais cobram vultosas anuidades, o grosso do financiamento é público, ocorrendo por meio de verbas diretas para a pesquisa e de doações filantrópicas (que envolvem renúncia fiscal).

Os que advogam pelo pagamento recorrem à noção de justiça social. Embora a formação de médicos seja um investimento público (interessa à sociedade tê-los), é grande a apropriação privada que decorre do fato de a pessoa ter se graduado. Estudo de Marcelo Neri, da FGV, mostra que a diferença entre o salário do médico e o de alguém que não estudou chega a 1.503%.

A grande verdade é que, em vez de travar abertamente esse importante debate, nós o travestimos em picuinhas como as doações traídas.

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