18 de setembro de 2012 | 3h 07
O Estado de S.Paulo
A América Latina está hoje menos preparada para enfrentar um choque externo do que em 2008, quando o estouro da bolha financeira no mundo rico precipitou a economia global na maior crise desde a Grande Depressão dos anos 30 do século passado. A advertência é do Banco de Compensações Internacionais (BIS), de Basileia, também conhecido como o banco central dos bancos centrais. O alerta vale obviamente para o Brasil, embora as autoridades brasileiras insistam na afirmação contrária. Segundo a tese oficialmente aceita em Brasília, o País tem hoje melhores condições do que há quatro ou cinco anos para enfrentar uma crise internacional. A análise da recente experiência latino-americana é um dos estudos especiais incluídos no boletim trimestral do BIS, dedicado principalmente a um exame da economia global entre o meio de junho e o meio de setembro. O balanço é sombrio e pouco animador quanto à evolução, a curto prazo, de mercados ainda muito afetados pela crise fiscal e financeira da zona do euro.
A maior parte da América Latina, segundo o estudo, reagiu muito melhor aos problemas de 2007-2008 do que aos choques de dez anos antes, a crise financeira asiática de 1997 e o colapso russo de 1998. Houve, nesse intervalo, melhoras substanciais nas economias latino-americanas, com fortalecimento das contas públicas, maior abertura de mercados, diminuição da dívida externa e acumulação de reservas cambais. Os autores do estudo poderiam ter mencionado um detalhe histórico significativo. Durante décadas, países latino-americanos em dificuldades compuseram boa parte da clientela dos programas de socorro do FMI. O quadro mudou radicalmente nos primeiros anos do novo século. A novidade foi registrada várias vezes, com elogios, em assembleias do Fundo e do Banco Mundial. As economias da região estavam obviamente colhendo os resultados de ajustes e de reformas estruturais, iniciados, em alguns casos, antes das crises de 1997 e 1998.
Vários países latino-americanos se haviam tornado superavitários na conta corrente do balanço de pagamentos. Criaram, com isso, uma boa camada protetora para suportar impactos provenientes do exterior. Dispunham, além disso, de dólares para enfrentar especulações cambiais e de condições fiscais e monetárias para adotar políticas contracíclicas. A experiência brasileira coincide amplamente com esses detalhes. O governo teve folga suficiente, no orçamento, para reduzir impostos e para conceder subsídios fiscais a um programa de estímulo ao investimento empresarial. Também houve espaço para redução de juros. As primeiras medidas do Banco Central foram destinadas a sustentar o financiamento do comércio exterior e a dar liquidez aos bancos e em seguida a política de juros foi afrouxada. As reservas, bem menores que as de hoje, bastaram para as necessidades do momento. Alguns dólares foram gastos, mas logo o estoque superou o nível anterior ao agravamento da crise.
Em vários países o quadro mudou nos últimos anos e hoje a vulnerabilidade a choques externos é maior do que em 2007-2008, avisam os autores da análise. As transações correntes voltaram a ser deficitárias, as necessidades de financiamento externo são maiores do que há quatro ou cinco anos, as contas fiscais são menos fortes e há menos espaço, nos orçamentos, para políticas contracíclicas. A inflação geralmente menor é um dado positivo, mas os juros básicos também são muito menores e a margem para estímulos monetários diminuiu muito.
A piora dos fundamentos na América Latina é em parte atribuível à desaceleração da economia global, admitem os responsáveis pelo estudo. Mas a maior vulnerabilidade atual a choques externos é resultado de problemas internos. Os governos, sugerem os autores do trabalho, deveriam fortalecer as contas públicas e executar reformas para tornar mais competitiva a produção fora dos setores de commodities. "Esses esforços proporcionariam um grande retorno em termos de estabilidade econômica e financeira, se outro choque externo severo ocorrer a curto ou a médio prazo." A receita inteira vale para o Brasil.
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