14 de novembro de 2012

MATIAS SPEKTOR Vai para onde?



O Brasil galgou posições no sistema internacional, mas não está claro que essa expansão seja sustentável
Passei as últimas semanas entrevistando funcionários do governo americano e outros profissionais de Washington sobre o processo de ascensão do Brasil.
Falei com gente de Casa Branca, Tesouro, Departamento de Estado, Pentágono, Conselho Nacional de Inteligência, Câmara de Comércio e Comitê de Relações Exteriores do Senado. Conversei com especialistas do Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e centros de pensamento ("think tanks").
Escolhi pessoas que, ao longo dos últimos anos, mostraram curiosidade por aquilo que a diplomacia brasileira diz e faz, mesmo quando dela discordam. Todos, sem exceção, são simpáticos em relação ao país.
Não há espaço aqui para um relato detalhado, mas vale a pena ressaltar a mensagem geral: nos últimos dez anos, o Brasil galgou posições no sistema internacional outrora impensáveis, mas não está claro que essa expansão seja sustentável. Em Washington, a imagem do Brasil emergente está em via de reavaliação. Para a maioria dos interlocutores, há sinais de retração.
Por quê? Ouvi quatro explicações principais.
Primeiro, o ativismo diplomático dos últimos anos teria posto o Brasil no mapa, ao custo de trazer resultados duvidosos ou negativos em temas centrais da agenda -Mercosul, Unasul, G20, rodada Doha e Conselho de Segurança da ONU.
Segundo, o investimento concreto em política externa teria ficado muito aquém das ambições oficiais. Faltariam orçamento e pessoal. Ninguém entende, por exemplo, por que se celebra repetidamente a abertura de novas embaixadas na África e no Caribe quando todos sabem que as mesmas geralmente carecem de recursos para operar direito.
Terceiro, o Brasil teria encontrado grandes obstáculos na própria vizinhança. O investimento diplomático na América do Sul, embora inédito, estaria muito longe de facilitar o jogo brasileiro mundo afora.
Quarto, o Brasil advogaria a favor de um mundo menos controlado pelo Atlântico Norte -e mais inclusivo de grandes países emergentes- sem oferecer uma visão prática de como isso produziria mais estabilidade, justiça e afluência.
Líbia, Síria e a crise financeira global seriam bons exemplos da desconexão entre o discurso da multipolaridade e a oferta de concepções alternativas viáveis.
Essas explicações precisam ser tomadas com distanciamento crítico, porque Washington tende a ser uma cidade umbilical e viciada em interpretar o mundo por meio de lentes exclusivamente nacionais.
Mas seria um erro descartá-las como baboseira ou má-fé. Elas apontam para problemas importantes que todo governo brasileiro precisará enfrentar nos próximos anos.
Também representam um alerta útil. A crença de que o Brasil precisa ser ouvido e incorporado à resolução dos grandes problemas internacionais tem raízes mais profundas em Washington do que em Londres, Moscou, Nova Déli ou Pequim.
Mais que qualquer outro país do mundo, os EUA reconhecem e celebram a trajetória brasileira, apesar dos atritos acumulados no caminho.
Se há dúvidas sobre o futuro de nossa ascensão na capital americana, que dirá em outras praças.

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