Fecha-se mais e mais o cerco da repressão contra quem é flagrado ao dirigir sob influência do álcool. Em poucos anos, uma prática tão generalizada quanto perigosa deixou de ser apenas uma inconsequência da vida adulta para passar ao reino da criminalidade e do opróbrio.
Tudo o que for possível fazer para coibir a combinação assassina de bebida e direção costuma ser visto com simpatia. Cabe indagar, porém, se no afã fiscalizador não se atropelam direitos fundamentais.A diminuição do limiar de tolerância para o nível de álcool no sangue já terá parecido exagerada para muitos. Por outro lado, é notório que o motorista, depois de beber, tende a se iludir quanto à própria capacidade de manter incólumes seus reflexos e descortino.
Punições severas, fiscalização mais intensa e limites estritos para o consumo se incorporam, aos poucos, no cotidiano brasileiro. Sua legitimidade não sofre contestações relevantes, e seus resultados são evidentemente benéficos.
Talvez por isso, a procura de aplauso político inspira a criação de mais e mais mecanismos. A Assembleia Legislativa de São Paulo acaba de aprovar um projeto determinando que, além do número da carteira de habilitação, seja publicado o nome de quem quer que tenha sido sancionado por dirigir depois de beber.
A lista dos punidos teria, argumenta-se, implicações úteis para empregadores e companhias de seguros --como se a cassação da própria habilitação, e as consequências penais do uso do álcool ao volante, não fossem suficientes.
É difícil imaginar que uma medida dessas acrescente algo ao que realmente interessa: evitar, pela educação e pela fiscalização preventiva, que vidas sejam postas em perigo pelo condutor alcoolizado.
Acostumado à impunidade e à arbitrariedade de ações policiais, o país parece, por vezes, embriagar-se de rigor. Pede-se pena de prisão para todo tipo de delinquência, e não só para a que atenta gravemente contra a segurança pública. O tabagismo, mesmo quando não oferece riscos senão ao próprio fumante, passa perto da criminalização em certos ambientes.
Uma lista pública dos punidos pelo uso do álcool é outro sintoma dessa mentalidade. Ao Estado cumpre, na medida do possível, proteger os cidadãos, e punir quem os ameace, e não se tornar o instrumento de estigmatização de quem errou. Menos ainda para açular, contra ele, o rancor que se esconde sob o ânimo puritano.
Folha de S,Paulo, 9/6/2013
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