SÃO PAULO - Cobram-me um posicionamento em relação às invectivas que minha antiga professora de filosofia Marilena Chaui fez contra a classe média. Para os que não tomaram ciência, ao falar no lançamento do livro "10 Anos de Governos Pós-neoliberais no Brasil: Lula e Dilma", no mês passado, Marilena declarou: "A classe média é uma abominação política, porque é fascista, é uma abominação ética porque é violenta, e é uma abominação cognitiva porque é ignorante. Fim".
Eu também gostaria que nossas elites estivessem um pouco mais à esquerda do que estão, pelo menos no que diz respeito às liberdades e à defesa de soluções pacíficas para todo gênero de conflito, mas não podemos esquecer que vivemos num país basicamente conservador e, na comparação com as camadas populares, a classe média brasileira desponta quase como um farol do Iluminismo.
E nem é preciso muito malabarismo filosófico para chegar a essa conclusão. Trata-se, na verdade, de uma questão empírica fácil de verificar. As várias pesquisas Datafolha que exploraram a opinião do brasileiro em temas controversos publicadas ao longo dos últimos anos mostram que são invariavelmente os mais ricos que manifestam as posições mais progressistas. Eles apoiam proporcionalmente mais do que os pobres o aborto, a eutanásia e a legalização das drogas. São mais tolerantes em relação ao homossexualismo e menos religiosos. Tendem a ser mais severos com políticos corruptos.
Quem primeiro chamou a atenção para esse fenômeno foi o sociólogo Alberto Carlos Almeida no livro "A Cabeça do Brasileiro", lançado em 2007 e que, à época, despertou bastante polêmica. Se pensarmos bem, entretanto, tais conclusões não deveriam surpreender ninguém. É mais do que conhecida a correlação entre renda e nível de instrução, e uma das principais razões por que mandamos as crianças para a escola é torná-las pessoas mais sábias e esclarecidas.
Folha de S.Paulo, 9/6/2013
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