Aumento de casos se deve à melhora da coleta de dados, à expansão do crime nas cidades menores e à maior circulação de drogas
Acompanharam a tendência do Nordeste as regiões Sul (63,7% de aumento), Norte (63,1% de aumento) e Centro-Oeste (19,1%). A queda na taxa no Sudeste, de 39,7%, ajudou a manter estável o índice nacional, que cresceu 1,9% de 1998 a 2008, para 26,4.
Efeitos estatísticos
Para entender a influência da qualidade das informações nos dados da violência, é importante conhecer a metodologia do Mapa da Violência, que usa os registros oficiais de mortes do SIM (Sistema de Informações sobre Mortalidade), do Ministério da Saúde. A outra principal compilação de dados de violência no País, o Anuário do FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), por exemplo, usa as informações produzidas pelos órgãos de segurança dos Estados.
Para especialistas consultados pela reportagem, o avanço dos homicídios no Nordeste responde, em parte, a uma melhora nos próprios registros de mortes do sistema de saúde, fenômeno que ocorre também nos números dos órgãos de segurança. Com a redução da subnotificação, cenários que já eram ruins se tornam mais visíveis.
“Não dá para dizer quanto desse crescimento [dos homicídios no Nordeste] tem a ver com a melhora nos registros, mas é uma parcela considerável. Em alguns Estados, inclusive, os dados de saúde eram piores do que os do sistema de segurança, apontados com freqüência como mais frágeis”, afirma Renato Vieira de Souza, diretor do FBSP.
Efeitos econômicos
De 1995 a 2008, o PIB (Produto Interno Bruto) do Nordeste acumulou alta real de 52%, índice superior ao crescimento nacional no período, de 47%. Mas uma suposta relação de causa e efeito entre avanço econômico e criminalidade na região deve ser relativizada, afirmam analistas.
“Crime e violência possuem causas complexas. Em alguns casos, crescimento econômico rápido pode elevar crimes patrimoniais. Como crises econômicas também podem deflagrar violência. Mas na Colômbia, por exemplo, houve redução de homicídios em meio a uma crise econômica, pois havia uma política de segurança competente e prefeituras engajadas”, afirma o consultor em segurança Marcos Rolim.
Souza, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, lembra que a literatura sobre segurança demonstra que o contexto econômico costuma influenciar sobretudo os crimes contra o patrimônio, como roubos e furtos. “Homicídios são multifatoriais. Mas essa influência [da economia] nos crimes contra a vida é residual”, afirma.
Para o especialista, a economia que pode estar influindo na escalada nos homicídios no Nordeste é a chamada “economia do crime”, do tráfico de drogas e de armas.
De fato, na Bahia, por exemplo, a própria polícia reconhece que está perdendo a guerra para o tráfico em algumas regiões, como o Nordeste de Amaralina, em Salvador, complexo de favelas candidato a receber um posto de polícia comunitária nos moldes da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) carioca.
A capital baiana é campeã nacional em crescimento de homicídios entre as capitais, com avanço de 404% nos números absolutos de 1998 a 2008. Mas em uma prova de que o problema é nacional, a principal preocupação do governo baiano no setor, expressa em entrevista recente do novo secretário de Segurança Pública, Maurício Barbosa, é a atuação do PCC, facção criminosa paulista, no fornecimento de drogas para duas facções locais.
Efeitos geográficos
Autor do estudo, o sociólogo Julio Waiselfisz identifica um movimento de interiorização da violência, ou seja, o interior dos Estados passando a assumir peso maior no avanço das taxas de homicídios. Isso se dá por três razões, segundo Waiselfisz: o crescimento econômico dessas regiões, atrativo à criminalidade; o aumento de investimentos em segurança nas regiões metropolitanas e a melhora na coleta dos dados de mortalidade no interior do país.
Uma possível amostra dessa tendência de “espalhamento” do crime pode ser vista na Bahia, que registrou 13 assaltos violentos a banco no interior somente em 2011, uma média de cinco ocorrências a cada quatro dias.
Desafios
Puxados pelo Nordeste, os índices de violência no Brasil insistem em revelar o Brasil real que foge às estatísticas de crescimento econômico. E tornam mais urgentes soluções estruturais para problemas crônicos da segurança no país, como os índices de homicídios, mais de 60 mil inquéritos de assassinatos sem solução desde 2007 e a população carcerária superior a meio milhão de pessoas, para uma taxa de reincidência criminal de 60% a 70%.
Entre alternativas que vem sendo sugeridas à exaustão por especialistas e historicamente negligenciadas pela política, estão a reforma do modelo de polícia, melhoras na remuneração da classe policial e mudanças na legislação penal para enfrentar as “escolas do crime” em que se transformaram a maior parte das prisões brasileiras.
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