O preconceito contra mulheres na ciência é, sobretudo, institucional.
Segunda-Feira, 21 de fevereiro de 2011
Estudo diz que mulheres recebem menos dinheiro para fazer pesquisa
Quem conhece a história de Lawrence Summers, ex-reitor de Harvard, pode concordar com um estudo recente que afirma: o preconceito contra mulheres na ciência é, sobretudo, institucional.
Summers ficou conhecido em 2008 por afirmar que as mulheres teriam menos aptidão para as ciências. A frase causou comoção e manifestações de cientistas. Três anos depois, o debate está longe de ser esgotado.
Stephen Ceci e Wendy Williams, da Universidade Cornell, EUA, debruçaram-se sobre 20 anos de dados sobre candidatura a vagas de trabalho, financiamento de pesquisa e publicação de artigos científicos nos EUA.
Eles viram que a quantidade de mulheres na ciência aumentou desde a década de 1970. Mas elas ainda não chegam ao topo por causa da chamada "discriminação institucional".
Por exemplo, as mulheres recebem menos recursos para fazer pesquisa e têm menos oportunidades de trabalho em ciências - especialmente nos cargos de chefia.
O trabalho está publicado na revista científica Pnas (Proceedings of the National Academy of Sciences).
Os autores verificaram também que em algumas áreas, como na matemática, as cientistas revelam que se sentem tão isoladas e insatisfeitas no meio "masculino", que desistem da carreira.
Para a socióloga da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Maria Conceição da Costa, que estuda gênero e ciência, a pesquisa dos EUA faz bastante sentido. "As mulheres não conseguem alcançar os mesmos patamares porque a maior parte dos comitês de julgamento de bolsas é formado por homens, assim como os líderes de pesquisa e chefes de departamento", diz.
Em outras palavras: homens tendem a escolher homens para cargos de chefia. Uma das exceções é a professora Ana Paula Marins Chiaradia, coordenadora de matemática da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Guaratinguetá. "Nunca me senti isolada ou insatisfeita, nem percebi qualquer tipo de discriminação por ser mulher", conta. A matemática, no entanto, revela que teve dificuldades para conciliar a maternidade com a profissão porque os órgãos de fomento não estão "preparados" para lidar com cientistas mamães.
"A maternidade atrapalhou a minha produção científica e senti incompreensão por parte dos órgãos que me avaliam", contou Chiaradia. "É difícil voltar a trabalhar depois de uma licença maternidade. A cabeça está no filho e não na pesquisa", diz.
Apesar de conquistas recentes no Brasil, como licença maternidade para bolsistas de mestrado e doutorado (concedida em 2010), as mamães pesquisadoras saem perdendo nas avaliações de produtividade.
Mulher escolhe família no lugar de trabalho
Para os autores do estudo da Pnas, as mulheres, diferentemente dos homens, são mais propensas a fazerem escolhas pessoais em detrimento do trabalho (como cuidar dos filhos ou pais). Assim, elas tenderiam a "preferir" cargos menores ou posições em que, por exemplo, pudessem trabalhar meio período.
Isso as impediria de progredir para os níveis mais altos das ciências. Resta saber se as "escolhas pessoais" são causa ou consequência do processo de discriminação.
Os autores sugerem que as instituições deveriam estar sensíveis à discriminação para tentar promover uma melhor equidade de gênero na atividade científica.
Isso já tem ocorrido em países campeões no quesito "igualdade de gênero", e que também têm estimulado a maternidade, como a Suécia e a Dinamarca. Em congressos científicos nesses países, é comum haver espaços para os filhos dos cientistas - sejam eles mulheres ou homens.
A questão da discriminação na ciência contra mulheres já tinha sido levantado com fervor em 1997, num artigo da Nature, chamado "Nepotismo e sexismo na revisão por pares [tipo revisão de artigos científicos anterior à sua publicação]".
Na época, os autores Christine Wennerus e Agnes Wold, da Universidade de Göteborg, Suécia, já afirmavam que as mulheres com alta titulação não assumiam cargos de chefia porque sofriam discriminação.
(Folha de São Paulo)
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