7 de janeiro de 2012

Sexta Economía do mundo? Apenas ilusão


07 de janeiro de 2012
Educação e Ciências | Folha de S. Paulo | TENDÊNCIAS/DEDATES | BR

Flávio Comim
A imagem do Brasil como sexta economia do mundo é apenas uma ilusão para o cidadão comum.
Somos ainda um país muito desigual, no qual milhões vivem indignamente. Nosso desenvolvimento humano tem andado a passos lentos e, em vez de encararmos os fatos, preferimos uma atitude na linha do "me engana que eu gosto" quando nos deparamos com algumas estatísticas feitas "para inglês ver", com pouca materialidade no dia a dia de milhões de brasileiros.
A sexta economia do mundo produziu em 2011 US$ 2,5 bilhões. No entanto, se dividimos esse valor pela população, encontramos que a renda per capita brasileira é apenas a 77º no ranking mundial, sugerindo que o padrão de vida médio no país ainda é significativamente inferior ao padrão europeu.
A situação piora quando observamos o ranking brasileiro no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), no qual o país cai para a 84º posição. Além disso, a velocidade de crescimento do IDH está caindo desde o início da década passada, chegando agora a 0.69% ao ano.
O país vem ainda acumulando dívidas nos campos da saúde e da educação que impedem avanços mais consistentes no padrão de vida.
Ao olhar para o passado, vemos que o Brasil de 2010 não pode ser comparado, por exemplo, com a França, a Holanda ou a Inglaterra de vinte anos atrás.
Esses países já tinham um nível de renda per capita entre 60% e 80% superior ao brasileiro atual, indicando que vinte anos pode não ser um prazo suficiente para a convergência absoluta entre países.
E o contraste entre a atual renda per capita brasileira, de menos de US$ 13 mil por ano, com os US$ 40 mil recebidos em média pelos ingleses conta apenas uma pequena parte dessa história.
Dado o ainda alto nível de desigualdade da distribuição de renda no Brasil (com um índice de gini de 0.53), vemos que essa renda média pode significar ainda menos para a maioria da população. Os últimos dados do Censo nos mostram que os 10% mais ricos no Brasil têm 42.8% da renda, e os 10% mais pobres têm apenas 1.3%.
Em 1990, França, Holanda e Inglaterra já possuíam um alto nível de escolaridade, medido por anos médios de estudo. Os valores eram respectivamente de 12, 11,1 e 11,7 anos; o valor atual brasileiro é 7,2.
Além de faltarem anos de estudo ao brasileiro, falta, ainda mais, qualidade nesses anos. De fato, o pouco progresso na qualidade da educação brasileira é evidência de um futuro comprometido.
Apesar dos avanços sociais recentes, o Brasil ainda tem 14,6 milhões de analfabetos (9,6% da população acima de 15 anos, em 2010), 30% da sua população ainda sofre algum tipo de insegurança alimentar e 8,5% sobrevive com menos de R$ 70 mensais. Ainda são altas as taxas de brasileiros sem provisão regular de água (17.1%) e sem saneamento (32.9%).
É importante mencionar que a natureza do crescimento econômico brasileiro recente é baseada na produção de commodities, longe das matrizes produtivas do mundo desenvolvido, que são intensivas em ciência, tecnologia e capital.
Para chegar ao padrão europeu, há que se tratar com mais seriedade a questão da ciência, da tecnologia e da educação de qualidade.
Em resumo, o padrão de vida no Brasil ainda é muito mais baixo do que o europeu há vinte anos atrás; os avanços sociais são importantes, mas ainda lentos; e não investimos em educação de qualidade, como outros países que se tornaram desenvolvidos fizeram. A ideia de ter um padrão europeu seduz, mas também pode nos afastar da verdade sobre onde estamos e quem somos.
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FLAVIO COMIM, 45, é professor de economia da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e da Universidade de Cambridge

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